Passos Coelho, a “regra de ouro” ou uma “snappy story”



O primeiro-ministro anunciou hoje que quer vai propor ao Parlamento que a "regra de ouro" europeia sobre limites ao défice e à dívida tenha "força constitucional" em Portugal, mesmo que seja inscrita na Lei de Enquadramento Orçamental. link
"O PS é um partido defensor da permanência de Portugal na zona euro e nesse sentido considera que deve acolher em legislação nacional a regra de ouro [limites ao défice e dívida], mas entende que essa regra deve ser inscrita numa lei de valor reforçado. Todos os orçamentos do Estado devem obediência à lei de enquadramento orçamental e nesse sentido é uma lei que exige uma maioria absoluta de votos", sustentou o líder dos socialistas. link

Um problema para o “bom aluno” , ou melhor, para o “fiel discípulo” da Srª. Merkel que - no Conselho Europeu de 30 de Janeiro 2012 - subscreveu a dita “regra de ouro” link, sem previamente negociar os termos de tal acordo com o maior partido da oposição (necessário para a tal “força constitucional” ou “para-constitucional”).

No entendimento do Conselho Europeu essa disposição deverá ter as seguintes características: “A chamada "regra de ouro", que os países devem inscrever "preferencialmente" na Constituição, embora o texto final agora aprovado admita a possibilidade de ficar consagrada de uma outra forma desde que com valor vinculativo e permanente, obriga cada Estado-membro subscritor do pacto a não ultrapassar um défice estrutural de 0,5 por cento e a ter uma dívida pública sempre abaixo dos 60 por cento do Produto Interno Bruto (PIB).link

Independentemente dos objectivos nacionais sobre controlo orçamental e a redução da dívida externa, que o MEMORANDUM OF UNDERSTANDING ON SPECIFIC ECONOMIC POLICY CONDITIONALITY consagra para o nosso País, durante o seu período de vigência (2011-14) a instituição da chamada “regra de ouro” tem pretensões muito mais latas do que o prevenir crises económico-financeiras futuras. Acaba por condicionar (para além do espartilho da moeda comum) questões muito mais importantes e que dizem respeito ao melindroso terreno da soberania e da autonomia política. Esta foi, essencialmente, razão de fundo pela qual a Grã-Bretanha e a República Checa se afastaram das decisões do Conselho Europeu de Janeiro de 2012.

Ora, se é verdade que o equilíbrio orçamental e o controlo da dívida são faces da mesma moeda, esta poderá ter diversas cercaduras em conformidade com os estadios económicos, com os diferentes períodos históricos e, inclusive, adaptadas aos ciclos políticos (na UE isto será premente). Frequentemente as chamadas “regras de ouro” são “Leis do Triunfo” e outras vezes “snappy stories” A dificuldade de escolha entre estes dois pólos é diminuta, mas a “pressão” da Srª. Merkel aproxima-se deste último.

Os problemas de Passos Coelho surgem e agudizam-se por uma razão simples: Quem “explodiu” com as circunstâncias que rodearam o PEC IV não podia ter assinado a “regra de ouro” nas condições em que o fez, independentemente da sua vontade de “agradar” (lá fora).

A imagem que Portugal pretende fazer passar para o exterior, fundamentalmente para os mercados financeiros “sentirem” que existe um amplo consenso nacional sobre a execução inerente ao quadro de ajuda externa é ilusória. O que existe é a noção de que vivemos uma profunda crise que nos afecta diversos âmbitos e sectores (social, económico e financeiro) e, a assumpção da estrita necessidade de honrar os nossos compromissos (pagar a dívida externa), enquanto País que busca um futuro.
Sobre o modo de como chegar lá, existem cada vez mais divergências, nomeadamente, sobre o “peso” da austeridade e sobre o “timing” e modelo da recuperação económica. Cada vez mais o País mostrar-se avesso à falácia de: "não existirem alternativas". O exemplo da Espanha em relação ao defice orçamental deste ano é muito significativo, mesmo sabendo que a Espanha não está sob um "plano de resgate", mas trata-se de um grande País em dificuldades que precisa de ir frequentemente financiar-se aos melindrosos mercados ...

É absolutamente abstruso o desejo do eixo franco-alemão de criar vínculos permanentes (esta é a pretensão). Porque esta “manobra” não visa somente a rápida resolução do problema da dívida e pretende, simultaneamente, consagrar nos diferentes Países da UE uma “servidão” aos conceitos e à “doutrina” ultraconservadora que têm como ambição “esvaziar” o Estado enquanto órgão prestador, financiador e regulador de serviços à sociedade em obediência ao conceito de "mercado livre". A crise pode encerrar muitas oportunidades (como a Direita gosta de enfatizar) mas há uma em que é evidente um oculto “aproveitamento”: cercear a concepção socialista e/ou social-democrática de Estado. Por muitos anos e, como sugere a "regra de ouro", de maneira irreversível. Encerrando, deste modo, a construção de um modelo social europeu que presidiu à concepção da CEE e da actual UE. Uma subtil perversão pretensamente vestida de “vontades” democráticas que mais não será do que o subreptício "esquema" encontrado para subjugar o futuro de alguns Países actualmente em dificuldades.
Assim, NÃO!

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