Os portugueses revelam inquietação sobre o futuro da ‘ocidental praia lusitana’…

Portugueses querem acordo alargado para a reforma do Estado… link.

Este estudo da Eurosondagem para o semanário Expresso e para a SIC mostra, na verdade, como a sociedade portuguesa está inquieta e ansiosa e o edifício político democrático totalmente bloqueado. Na realidade, existe a consciência de será necessário reformar construindo consensos verdadeiros que salvaguardem o essencial do 'contrato social' mas, também e paralelamente, nasce a percepção de que a capacidade de pensar e agir está - no nosso País - em profunda hibernação.

Não é possível discutir, imiscuir ou elencar reformas ditas ‘estruturais’ debaixo do ameaçador tecto de poupanças cegas e cortes a eito. E é isso que a maioria governamental tem andado a fazer. Acordou, há tempos, num daqueles exames regulares com a troika, que tinha necessidade de cortar na despesa do Estado 4.000 M€. Como chegou a este montante nunca foi explicado, nem desmontado. Apareceu este quantitativo à cabeça, como sendo uma indicação divina, atropelando ab initio todo e qualquer tipo de processo democrático, participado. A existir a necessidade ou - como o Governo quer fazer passar - a imperiosidade, de proceder a cortes nas despesas do Estado o montante final apurado seria – como é de bom senso – uma das conclusões (não a única) decorrentes do processo de consulta política e de diálogo social, necessariamente, alargado. Mas ao contrário do que seria legítimo esperar, e ao arrepio de qualquer processo sólido e transparente, este Governo, à margem de considerações político-estratégicas sobre as funções do Estado, pretende começar a construir a casa pelo telhado.

É óbvio que a tentativa de diálogo que o Governo está a ensaiar é uma formalidade para apresentar à troika. Já não precisa de fazê-lo perante o presidente da República, instituição que – com o comportamento assumido por Cavaco Silva nas última comemorações do 25 de Abril - deixou de contar no panorama político nacional, como aliás a mesma sondagem mostra.

E, na ausência de qualquer tipo de consenso, tudo o que vier a ser eventualmente aprovado – e não é claro qual o entendimento sobre este assunto no seio da coligação – será sempre efémero e circunstancial. Qualquer maioria futura poderá – com legitimidade idêntica – reverter as resoluções que aparentemente estão na calha. É aqui que soçobra a ‘confiança’ que os portugueses – e provavelmente a troika - depositam neste Governo. Até aos cidadãos só chega a intolerável ‘arrogância’ de uma coligação governamental para quem só os números e uma inqualificável agenda neoliberal que busca afanosamente chegar ao 'Estado Mínimo', contam.

De facto, a troika que ‘exigiu’ medidas estáveis e duradouras não se contentará com resoluções decorrentes de situações avulsas sustentadas por maiorias ocasionais e, obviamente, efémeras. Ontem, na Assembleia da República, durante o debate com o Governo assistimos, por parte deste, a uma completa deriva sobre as medidas que pretende tomar no que diz respeito à dita ‘Reforma do Estado’. Sentiu-se que na prática o Governo manifesta importantes dificuldades na negociação do pacote de cortes nas despesas do Estado com a troika. O Governo perde em cada negociação autonomia e hipoteca, em cada exame ‘regular’, mais soberania. Não existe mais espaço para a alienação de mais fatias de soberania a não ser que seja em troca de políticas activas de solidariedade europeia, como a mutualização das dívidas soberanas para todos os países da UE. Esta será, por ventura, o consenso mínimo e a base de consolidação e da harmonização política e financeira da UE.

Na verdade, a ida aos mercados nesta semana mostrou como os credores – e não os portugueses - têm motivos para festejar. Inflectiu-se a marcha do ‘carrossel da dívida’. Foi aberto aos portugueses – através do BCE – a vereda difícil e íngreme para periodicamente irmos aos mercados endividar-nos, a juros altos, e resgatarmos os riscos financeiros externos, p. exemplo das instituições financeiras alemães que investiram largas somas em obrigações portuguesas, a troco de uma ‘política de merceeiro’, tão do agrado da dupla Merkel/Schroder, onde só pontificam 2 colunas: o Deve e o Haver. A UE, nos últimos anos de crise, ficou circunscrita a esta ‘pobreza’ de concepções e de perspectivas. Cá dentro a celebrada ida aos mercados não terá reflexos directos nem imediatos. Sempre que se discute o Estado Social, as prestações sociais ou os contornos e operacionalidade, funcionalidade e dimensão do aparelho de Estado é certo e sabido que o Governo, ou alguém por ele, aparece sistematicamente na praça pública a ameaçar de que não há dinheiro que garanta a sua sustentabilidade. Neste momento, estamos a (re)visitar os mercados para de imediato 'exportar' o dinheiro arrecadado em leilões de divída pública para instituições financeiras europeias e mundiais: os insaciáveis credores! Os mercados para Portugal são a placa giratória de transferências de capitais não sendo expectável que esses meios financeiros conseguidos sejam investidos cá dentro.

Tornou-se, deste modo, nítido que o Governo não consegue encontrar consensos no seu interior, o Presidente da República está fora da jogada e as Oposições, todas, em frontal rota de colisão com o projecto governamental de cortes na despesa do Estado Social e nas funções de soberania. Melhor imagem de um bloqueio institucional é difícil de conceber. Só falta tirar as conclusões óbvias: demitir o Governo e convocar eleições.

De resto, qualquer mudança, tanto aqui como na Europa, está condicionada a profundas mudanças políticas cujos contornos são ainda nebulosos mas sobre o qual existe uma certeza: o fim da hegemonia do PPE enquanto suporte político e ideológico da deriva neoliberal que começou a fustigar o velho Continente desde a queda do muro de Berlim e ameaça destruir globalmente, i. e. civilizacionalmente, o valioso acervo político, economico, social e cultural que se convencionou denominar por Ocidente.

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