Gouveia e Melo – Uma vitória anunciada

Jamais votaria no almirante Gouveia e Melo, exatamente pelas razões que levam muitos eleitores a contribuir para a sua vitória.

Não é, naturalmente, por ser militar, mas por ser militarista, como mostrou ao demitir pelas televisões o capelão dos fuzileiros que o contestou, em que foi obrigado a recuar, independentemente de eu não aceitar que, num país laico, haja capelães militares.

Não é por exercer a autoridade, mas por ser autoritário, como mostrou o castigo público televisionado, a marinheiros, independentemente de eu não concordar com a absolvição do que me pareceu uma insubordinação.

Não é por ter mudado de opinião quanto a si próprio para o cargo a que se propõe, mas porque a conduta que o trouxe aqui me parece de quem exibiu publicamente as decisões no frio calculismo que lhe permitiu a ambição. Pode ter sido tão pusilânime na conduta como o adversário que não viu incompatibilidade na pertença ao Conselho de Estado e o comentário político televisivo com que promoveu a candidatura.

Agora, com a caução de Rui Rio, este com inegável dimensão política para o cargo de PR, interrogo-me sobre o que faz de um político sem currículo um vencedor à primeira volta se o Chega não concorrer, o que poderia inviabilizar a sua vitória na segunda.

A entrevista à CNN foi uma boa entrevista quer da jornalista quer do candidato, mas é o candidato que interessa. Demasiado conservador, pró-vida e contra a eutanásia, agradou a muitos. Recusando extremismos considerou o aborto problema resolvido. Respeitador da CRP, não teria dissolvido a AR, quando havia uma maioria absoluta, o que a perfídia de Marcelo logrou. E não considera a não aprovação do OE motivo para dissolução, isto é, respeita a Constituição (CRP), o que o dissolvente não fez.

É um homem de direita e democrata. Já não é pouco, mas não é espaço onde me reveja. É um homem da Nato, defende o aumento de despesa, como é hábito, e abomina Trump como europeu decente, mas as razões de tão auspiciosos resultados eleitorais são fruto da geometria eleitoral e da adição de rancores e desejos recíprocos do eleitorado.

Os eleitores de esquerda, já tão poucos, veem nele o travão ao Chega e, na sua postura a
antítese do mitómano circense Ventura; o PS a desforra contra o usurpador Montenegro; a parte decente do PSD a vingança contra os que preferiram à ética e a Rui Rio homens de negócios conluiados e hábeis na guerrilha política; na extrema-direita alguém capaz de a representar sem ser ridículo; quem votou Marcelo, um do mesmo espaço que não conspire. Quem é contra os partidos, alguém que chega fora deles.

O messianismo aglutina aspirações antagónicas e ressentimentos recíprocos.

Dada a drástica redução da esquerda no seu conjunto, está aberta a autoestrada para o marinheiro navegar em terra e aportar no Palácio de Belém de onde, com ou sem a sua bênção, surgirá um novo partido da implosão do PS e PSD. Espero que haja quem esteja disposto a impedi-lo.

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