Natal (Escrito em 2006)
Há meio século o Natal era pretexto para a reunião das famílias. Os ausentes voltavam todos os anos, à aldeia de origem, nas carruagens de 3.ª classe de comboios apinhados de pessoas e cabazes, com odores a que se resignavam as pituitárias de então. Através do vidro partido, ou da janela avariada, o ar gélido entrava nas carruagens e nos corpos. Os passageiros partilhavam a vida e as merendas durante a penosa e longa viagem de pára-arranca. Os Senhores Passageiros precisavam de embarcar, ou de desembarcar, e a máquina a vapor de abastecer de lenha a fornalha e de água a caldeira. Às vezes o comboio parava nas subidas para que a caldeira ganhasse pressão e pudesse rebocar o peso acrescido que deslocava. Entre Lisboa e a Guarda era normal um atraso de duas ou três horas, pela Beira Alta, e ainda mais pela Beira Baixa. Nas estações e apeadeiros esperavam bestas e pessoas impacientes e enregeladas. À chegada do comboio havia abraços, ternos e demorados, e lágrimas de alegria. Do comboio ac...