Urbano Tavares Rodrigues – 100.º aniversário do nascimento de um homem bom – 6 de dezembro de 2023

Urbano Tavares Rodrigues, grande escritor e resistente antifascista, era o homem generoso a quem muitos recorriam para lhes apresentar o livro que julgavam destinado ao sucesso. O escritor e jornalista era incapaz de recusar o pedido e procurava encontrar algum mérito na prosa que o obrigavam a ler.

Conseguia, quando o autor ajudava pouco, dizer palavras de estímulo perante os que tinham ido para ouvir o Urbano sem se importarem com quem tinha escrito o livro.

Conheci-o no início de 1970 no tumulto das manifestações contra a ditadura, através da palavra que nunca recusava, fosse na Cooperativa dos Pedreiros, em Vila Franca de Xira, na cooperativa Devir, em Lisboa, ou em qualquer outro local. Era fácil chegar ao Urbano, estabelecer com ele amizade, usar a sua disponibilidade para conversar.

Para além da imensa generosidade, de que muitos abusavam, era da sua natureza ser um homem bom. Recordo a paciência com que leu as redações e viu os desenhos dos meus alunos da escola primária, mérito da professora agregada que me entregou uma turma de eleição quando regressei da guerra colonial. Ficou maravilhado e pediu-me para lhos deixar publicar no Diário de Lisboa.

Objetei-lhe que eram crianças de 9 e 10 anos e que um dia podiam repudiar o que nessa idade escreveram e desenharam.

O Urbano disse: “tens razão, que pena!”. E ambos ficámos desconsolados. Os desenhos e os textos dessas crianças perderam-se numa qualquer limpeza aos arquivos da escola n.º 44, ao cimo da Rua da Beneficência. Que pena!

Tive o privilégio de ter sido seu amigo. Encontrei-me com ele várias vezes, deslocava-me onde ele ia fazer conferências. Ia aprender com o intelectual e gozar a companhia do amigo. Em 1973 aceitei ir trabalhar para Coimbra e ainda me encontrava com ele em alguns fins de semana na pastelaria Granfina, em frente ao Café Nova York, onde eu tinha a tertúlia habitual.

Depois veio o 25 de Abril e cada um rumou aos sítios onde julgou fazer falta e não mais o vi. Acompanhei-o através da televisão, dos jornais e de alguns livros. Há 10 anos partiu um homem bom.

Hoje, senti a sua falta. Faria 100 anos.


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