Memórias da co-incineração
Com o título em epígrafe, numa excelente reflexão e com a independência a que nos habituou Paulo Marques, jornalista do «Diário as Beiras», terminou a sua crónica de hoje, com esta frase: «E continuou por resolver o grave problema dos resíduos industriais perigosos».
Em 9 de Junho de 2000 escrevi um texto que seria publicado alguns dias depois em vários órgão da comunicação social, a quem o remeti, nomeadamente no Diário as Beiras.
Aqui fica:
Somos um país com precários hábitos de higiene, heróicas tradições de resistência ao banho e uma irreprimível saudade do gosto ancestral de cuspir no chão.
Quem não guarda a memória do aconchego que o estrume do rés do chão, habitado pelos animais, trazia à casa da sua aldeia, nas noites frias de inverno?
Compreende-se, pois, a relação afectiva com os lixos em geral e os resíduos tóxicos em particular.
Os lixos que ornamentam a orla das estradas, os resíduos que pontuam os cursos de água, os odores que orientam os invisuais pelos difíceis caminhos das raras florestas que ainda resistem, têm encontrado sempre defensores. Desde a mais vetusta universidade à mais remota aldeia, do mais ilustre catedrático ao mais ignaro analfabeto, do mais progressista ao mais reaccionário.
Os lixos são parte integrante do ecossistema nacional. Mimetizados com a paisagem, têm um carácter estruturante do nosso habitat. Fazem parte do nosso património cultural e idiossincrásico. São, em suma, uma referência colectiva e patrimonial.
Sem eles como poderiam proliferar os insectos e roedores que enriquecem a biodiversidade?
Graças à vigilância e defesa permanente deste património em franco desenvolvimento, podemos acalentar o legítimo anseio de nos transformarmos num santuário mundial para algumas espécies de moscas raríssimas e interessantes roedores que correriam o risco de extinção, bem como de novas espécies geneticamente apuradas por virtude dos resíduos tóxicos.
A co-incineração seria aceitável se se destinasse a corrigir erros, a castigar hereges relapsos ou a defender verdades da fé. Aproveitá-la para eliminar resíduos tóxicos, com o risco acrescido de gerar mais valias para as cimenteiras, nunca.
Bem – hajam os que se opõem com a força da sua fé às razões da ciência, com a fúria da sua cólera à sensata explicação dos benefícios, com a estridência dos seus gritos à serena reflexão .
Os lixos do nosso contentamento podem ficar tranquilos. Os seus defensores não dormem. São prosélitos que lhes asseguram a proliferação, lhes garantem a tranquilidade e os defendem de qualquer insidioso ataque.
Os ambientes sépticos são óptimos para fazerem a selecção natural dos mais fortes.
Mal tem andado o Governo que, em vez de distribuir subsídios para a conservação dos lixos, negoceia apoios para a sua eliminação.
Daqui a 10 ou 15 legislaturas, 20 ou 30 Governos, 40 ou 50 comissões científicas independentes, podemos ter a certeza que os únicos resíduos serão os nossos netos, com órgãos respiratórios adaptados a consumir os gases exóticos que vierem a compor a atmosfera.
Post scriptum - Com o actual Governo regressou a esperança, no que diz respeito à resolução do problema dos lixos e R.I.P..
Comentários
Há realmente uma enorme dose de irracionalidade na forma como se abordam estas questões.
Um abraço,
... na realidade os Portugueses são entre os europeus os que mais tomam banho, aliás quando se diz a um estrangeiro que no verão se chega a tomar três banhos muitos destes, nomeadamente os nórdicos ficam espantados, para eles o banho não é uma coisa diária como para os Portugueses.
Quanto às casas que tinham no R/C os animais, esta contrução servia para aquecimento, mas em muitos países, nomeadamente os nórdicos as pessoas viviam no por cima, mas COM OS animais.
as ruas portuguesas estão relativamente limpas para um país que não tem multas, passeie por Roma e veja a porcaria no seu explendor ou vá a casa de um Belga e veja o acumular de pó.
É inacreditável que se possa dizer dos portugueses, herdeiros de, não uma, mas de duas culturas de banhos (romanos e árabes), descobridores e exploradores da Ásia (mais uma região onde a higiene pessoal é altamente valorizada) sejamos os não higiénicos da Europa o que não é verdade, na verdade somos os mais higiénicos e os que mais cuidamos da higiene pessoal.
Viaje e aprenda, veja para além das catedrais que visita, veja tb os sítios não turisticos, ...
Já cheira mal, isto de estarem sempre a chamarem-nos feios, porcos e maus...
Não percebo porque Lisboa não fica com mais este símbolo da modernidade e do progresso...
2 - É uma delícia ver a incapacidade de tantos para apreciar a metáfora e compreender um texto;
3 - Se é verdade que se incinera, de novo, lixo hospitalar nos HUC é altura de todos nos unirmos contra isso. Fico surpreendido, pois foi Sócrates ministro que mandou fechar essa poluidora incineradora e enviar os lixos para Lisboa.
4 - Vá lá que já se toma banho com regularidade. O humor continua por baixo.
Já a teve, ganhou as eleições!!!
QUEREM MAIS
Volta Machado que estás perdoado, mas não tragas os cromos tipo Cidade, Vilar e outros do mesmo tipo
Deus queira que o teu amigo sócrates e apaniguados te ponham a merda a queimar à porta !
Há alternativas economicamente viáveis que são melhores para o ambiente e a saúde pública.
A insistência na co-incineração, seja em Coimbra seja em qualquer outro local do País, é um "bug" do programa do governo, que pode e deve ser corrigido.