As Misericórdias e “pré-conceitos ideológicos”…
No X Congresso Nacional das Misericórdias Portuguesas link recentemente realizado assistiu-se a um indisfarçável forcing (lobbyng?) dirigido aos poderes públicos no sentido dessas instituições passarem a ter um maior protagonismo na área de prestação de cuidados de saúde.O cooperação do sector social (as IPSS’s) já representa, no âmbito do SNS, uma parcela importante das prestações complementares externas, nomeadamente, na rede de cuidados continuados, onde o objectivo confesso é atingir uma posição hegemónica da ordem dos 80% link. Esta estratégia faz com que um importante sector de cuidados de convalescença, recuperação e reintegração de doentes crónicos e ainda de pessoas em situação de dependência, esteja fora da alçada directa do SNS, já que as Misericórdias reivindicam uma larga autonomia assente sobre a sua “particular natureza e especificidade” que se baseia em "direitos adquiridos", i. e., no longo trajecto histórico (500 anos). Por outro lado, a omnipresença das Misericórdias num vasto sector de apoio social (as chamadas “respostas sociais”) como são as creches, os lares, os centros de dia, o apoio domiciliário, os centros de tempos livres, os centros de convívio, etc., acabam por colocar sectores estratégicos da política social do Estado extremamente dependentes de um - cada vez mais poderoso e abrangente - prestador externo (ao SNS e à Segurança Social).
O protocolo assinado em 2010 entre o Ministério da Saúde (MS) e a União das Misericórdias Portuguesas (UMP) link é bem claro e explícito sobre as pretensões deste sector social quanto ao futuro. Reza o artº. 5º do citado acordo : “As santas casas de misericórdia desenvolvem a sua actividade em todos os sectores da prestação de cuidados de saúde”…
Todavia, o actual objectivo é, no concreto, rentabilizar a rede hospitalar das Misericórdias. Já o acordo entre o MS e a UMP no Porto link é extremamente abrangente e alargado (100 mil consultas e 20 mil cirurgias) e envolve 12 hospitais das Misericórdias.
Portugal não pode ignorar o papel desempenhado na área da Saúde (primordialmente até 1974) pelas Misericórdias. Todavia, a “nova fase” deste sector social, liderado pela UMP, não pode ser baseada em regimes de excepção. A sua longa caminhada não lhe outorga algum direito a esse tipo de "favores"...que não são concebíveis em quaisquer circunstâncias.
Os portugueses conhecem bem o SNS. Sabem que este tem uma resposta insuficiente no sentido de fornecer aos seus utentes uma cobertura universal e atempada (ver Relatório de Primavera 2011 da OPSS) link, como determina o artº 64º - 3, alínea b, da Constituição da República Portuguesa. Essas insuficiências de cobertura assistencial têm originado (e devem continuar) o recurso a meios externos ao SNS (como é o caso das Misericórdias). A criação ou o desenvolvimento - neste quadro de complementaridade - de estatutos e/ou prerrogativas especiais e particulares, como a UMP solicita, tem uma consequência directa e indesejável: privilégios contratuais.
Quando (e sempre que) os serviços públicos de Saúde tiverem de recorrer a subcontratações de serviços (outsourcing) devem fazê-los por concurso público, salvaguardadas (e apuradas) questões relativas à qualidade da resposta e às boas práticas. Este é o modelo democrático e republicano que deve informar qualquer Governo.
A coligação de Direita (PSD/CDS) que vai governar o País tem repetido incessantemente que vivemos uma situação excepcional querendo sugerir estar disposta a recorrer a todos os meios para enfrentá-la. Contudo, a Constituição da República impõe-lhe limites.
As declarações do presidente da União das Misericórdias no encerramento do X Congresso não podem deixar de ser interpretadas à luz da actual conjuntura política. link. Mas ao contrário que é sugerido neste veemente apelo ao futuro Governo, no sentido de serem privilegiadas as capacidades instaladas das Misericórdias, ao arrepio do texto constitucional (que não é propriamente um arrazoado de preconceitos ideológicos), são denunciadoras de um enviesado (e abusivo) conceito de colaboração com um serviço público.
As situações referidas pelo responsável das Misericórdias (menores custos e mesma qualidade) são publicamente apresentadas como um dado adquirido, antes de passar pelo crivo de uma avaliação externa objectiva, independente e sem preconceitos (ideológicos ou outros) e não verificações por comissões paritárias como a UMP tem inscrito (com a aceitação dos poderes públicos) nos mais recentes protocolos.
Quando (e sempre que) os serviços públicos de Saúde tiverem de recorrer a subcontratações de serviços (outsourcing) devem fazê-los por concurso público, salvaguardadas (e apuradas) questões relativas à qualidade da resposta e às boas práticas. Este é o modelo democrático e republicano que deve informar qualquer Governo.
A coligação de Direita (PSD/CDS) que vai governar o País tem repetido incessantemente que vivemos uma situação excepcional querendo sugerir estar disposta a recorrer a todos os meios para enfrentá-la. Contudo, a Constituição da República impõe-lhe limites.
As declarações do presidente da União das Misericórdias no encerramento do X Congresso não podem deixar de ser interpretadas à luz da actual conjuntura política. link. Mas ao contrário que é sugerido neste veemente apelo ao futuro Governo, no sentido de serem privilegiadas as capacidades instaladas das Misericórdias, ao arrepio do texto constitucional (que não é propriamente um arrazoado de preconceitos ideológicos), são denunciadoras de um enviesado (e abusivo) conceito de colaboração com um serviço público.
As situações referidas pelo responsável das Misericórdias (menores custos e mesma qualidade) são publicamente apresentadas como um dado adquirido, antes de passar pelo crivo de uma avaliação externa objectiva, independente e sem preconceitos (ideológicos ou outros) e não verificações por comissões paritárias como a UMP tem inscrito (com a aceitação dos poderes públicos) nos mais recentes protocolos.
Na verdade, o sector social já revelou onde tiveram lugar auditorias (p. exº: o acordo entre o MS e o Hospital da Cruz Vermelha, em 1998) algumas inconformidades e surpreendentes fragilidades que “foram lesivas para o Estado”. link
Finalmente, afirmações como : “é absolutamente inaceitável" que o Estado opte por financiar o sector público quando sabe que o sector social faz mais barato”… link, são no mínimo extemporâneas e apressadas. De facto, o Estado não tem de optar. Por enquanto, é obrigado a investir no sector público.
Finalmente, afirmações como : “é absolutamente inaceitável" que o Estado opte por financiar o sector público quando sabe que o sector social faz mais barato”… link, são no mínimo extemporâneas e apressadas. De facto, o Estado não tem de optar. Por enquanto, é obrigado a investir no sector público.
O que são inaceitáveis são os apelos no sentido de perverter o Estado de Direito para mergulhar o País no Estado da Direita…
Comentários
forte trunfo mas mãos da Igreja Católica que manipula milhares de milhões de euros ou outra qualquer moeda,e devido à Concordata,está isenta de prestar contas ao Fisco.
A palavra misericórdia devia desaparecer tal como as palavras miséria,mísero,miserável que com ela estão relacionadas.Em vez de misericórdia e caridade,termos caros à Igreja,devia de haver Justiça Social.Mas nêste Portugal biblico-judaico-cristão desde há séculos,não é fácil tarefa tirar das mãos da Igreja êste trunfo poderoso que é a Santa Casa da Misericórdia,pois a Opus Dei e o Jesuitismo ainda téem uma enorme fôrça e a maioria do Povo é crente
e ajoelha pedindo misericórdia.