O acordo PSD/CDS…

O acordo político firmado ontem entre o PSD e o CDS é um documento vago e indefinido como convém a ambas as partes link. Mais parece um menu de uma casa de pasto. Recitar [ou elencar] problemas há muito diagnosticados sem especificar soluções é o mesmo que escrever em lousa numa porta debaixo do ramo de louro: “hoje há marisco”. Ficamos sem saber se são camarões, lagostas, percebes, … ou, as populares conquilhas.
Palavras como: empreendorismo, empregabilidade, sustentabilidade, mercados, mobilidade, contratação, livre escolha, trabalho, família, segurança, etc., são velhos bordões da Direita apresentados, neste documento, como “inovadores”. O concreto não está lá. É sistematicamente remetido para um posterior programa de governo.

O verdadeiro ou o sub-reptício acordo [conforme os destinatários] é inteiramente – e literalmente - subsidiário do Memorando de Entendimento com a troika: UE/BCE/FMI. Aliás, perpassa, ao longo de todo o texto, dois indisfarçáveis destinatários: primeiro, a “troika” que exigiu “este” acordo; segundo, o Presidente da República que adoptou a citada exigência.

Na verdade, o acordo é a prossecução de um estilo político que marcou a campanha eleitoral: informação difusa, nebulosa, genérica [nomeadamente quanto às medidas inscritas no memorando] e o sistemático contornar do concreto, da realidade. Quando se fala de tempos difíceis, de esforço, de contenção, de austeridade e de sacrifícios não se estabelecem etapas nem limites. Tudo fica no ar para o que der e vier…

Este acordo é, também, uma manobra de apropriação política (pela Direita) do voto popular. Na realidade, tenta-se contornar um dado essencial. A viragem do País à Direita – um facto incontornável - foi, acima de tudo, a (democrática) manifestação da insatisfação popular perante a governação socialista que, por motivos sobejamente discutidos, claudicou nas soluções (políticas, económicas e financeiras), facto que acabaria por determinar a solicitação de auxílio externo. Pretender – como vem fazendo a coligação de Direita - apropriar-se desta compreensível (e previsível) postura eleitoral tornando-a uma avalização popular de um conjunto de políticas neoliberais - a coluna vertebral dos dois partidos signatários – é tomar a nuvem por Juno.
O mandato popular subjacente ao presente acordo governamental não será tão claro e inequívoco como a Direita quer fazer crer e, muito embora esta seja uma coligação formalmente (democraticamente) legítima, não deixa de ser uma atitude política essencialmente reactiva (contra o status quo) e em menor grau afirmativa (um programa de governo destinado ao sucesso). É esta inversão de valores que a presente cooperação PSD/CDS, para governar Portugal em circunstâncias excepcionais (como Paulo Portas gosta de salientar), acoita no seu seio.

De resto, o País assistiu ontem a uma parada eminentemente mediática. Cenário que os protagonistas deste acordo afirmam pretender arredar da política [futura]. Na verdade, público e notório tem sido o esforço que os dois líderes signatários do acordo têm desenvolvido para afirmarem, no âmbito nacional, um projecto predestinado de salvação com cariz messiânico, sob o signo da “mudança”. De facto, todos sabemos que não vai haver uma era APC e outra DPC (Antes de Passos Coelho e Depois de Passos Coelho).

As considerações tecidas por Pedro Passos Coelho e Paulo Portas após a assinatura solene do acordo vieram confirmar aquilo que os portugueses receavam: o chorrilho de lugares comuns, a retórica vazia, as deambulações teóricas, a ligeireza de propósitos [a pretensão de regressar aos mercados antes de 2 anos é mais do que irrealista] … à volta de uma temática complexa, grave e difícil que ficou - neste muito publicitado acordo de colaboração governativa - submersa em estafados slogans, como se continuássemos em campanha eleitoral.
Para já foi o conhaque – falta agora o serviço!

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