O PR e os caminhos de Portugal
Por
Jorge Carvalheira *
Não teria sido nada mau para Portugal, se o senhor Presidente tivesse apontado os caminhos adequados, na década em que chefiou o governo.
Era o tempo em que começou a enxurrada dos fundos, e em que deviam tomar-se as decisões que haveriam de iniciar a modernização do país.
Mas trocaram-se os prazos da agricultura por dinheiro, condenando-a à inexistência; sacrificaram-se as pescas no altar da ganância; pendurou-se na forca a pouca indústria.
A incompetência dos governos cavaquistas fez de Portugal um país rico, com uma varinha de condão. Era o tempo do oásis, e do país do sucesso, em que se sabotou a ferrovia em favor da camionagem privada, e de tudo o que fosse betão e auto-estrada.
Inchou o clube dos gestores que levaram muitas empresas à ruína, e se transformaram em barões que governaram a vidinha.
Os portugueses em geral encheram o peito com os ares do tempo, deixaram-se convencer pelo milagre, acreditaram na fábula do pelotão da frente, e dispuseram-se a ser depenados pela usura dos senhores da finança.
Nada que mereça nota, e que era fundamental, se realizou na educação, nem na justiça, nem na economia, nem na cultura, nem na mentalidade indígena. Às pechas tradicionais juntaram-se vaidades, negociatas e oportunismos novos.
Quando o reinado cavaquista acabou, o país estava sufocado, como ainda se lembra quem não perdeu a memória. E o próprio presidente do conselho se deu conta de que estava rodeado dum partido de alimárias, de oportunistas e de figurões pouco sérios. Por isso os sujeitou a um tabu que durou um ano. No fim tirou-lhes o tapete, e deixou o partido numa orfandade de que ainda não saiu, para nossa actual desgraça. Resta dele um concílio de barões pouco recomendáveis, e uma clique de esquerdistas reciclados, que deixaram de mijar na cama quando aprenderam a ler as citações do Mao.
Guterres veio a seguir, inevitavelmente, porque o país estava cheio das competências do professor Cavaco. E sendo embora o governante mais bem formado, mais culto, mais humanista, mais sério e mais cosmopolita que Portugal já teve, Guterres só demonstrou que isso não chega para ser um bom governante, e evitar erros crassos, como a barragem do Côa, as portagens da CREL, e sobretudo o regabofe dos caciquismos locais, e dos homens das rotundas, e outros megalómanos que nunca faltaram na paisagem portuguesa.
As más opções anteriores e os interesses instalados já tinham a via aberta, e Guterres não quis, ou não soube, ou não pôde fazer alterações à rota. Quando viu que o saco tinha fundo, fez o que faz qualquer tipo decente e renunciou ao poder.
O rústico democrata algarvio entretanto mudou de ares, e deixou poisar a poeirada. E volta agora, do poleiro doirado e inócuo de Belém, a soltar lamentações de crocodilo, e a lançar tiradas sobre as gerações dos nossos filhos, que o deixam muito preocupado. É um bom seringador, o nosso Presidente. O que não faz de nós todos, é claro, coisas muito melhores do que ele! Mas isso já é outra questão.
* Escritor, democrata e anti-fascista
Jorge Carvalheira *
Não teria sido nada mau para Portugal, se o senhor Presidente tivesse apontado os caminhos adequados, na década em que chefiou o governo.
Era o tempo em que começou a enxurrada dos fundos, e em que deviam tomar-se as decisões que haveriam de iniciar a modernização do país.
Mas trocaram-se os prazos da agricultura por dinheiro, condenando-a à inexistência; sacrificaram-se as pescas no altar da ganância; pendurou-se na forca a pouca indústria.
A incompetência dos governos cavaquistas fez de Portugal um país rico, com uma varinha de condão. Era o tempo do oásis, e do país do sucesso, em que se sabotou a ferrovia em favor da camionagem privada, e de tudo o que fosse betão e auto-estrada.
Inchou o clube dos gestores que levaram muitas empresas à ruína, e se transformaram em barões que governaram a vidinha.
Os portugueses em geral encheram o peito com os ares do tempo, deixaram-se convencer pelo milagre, acreditaram na fábula do pelotão da frente, e dispuseram-se a ser depenados pela usura dos senhores da finança.
Nada que mereça nota, e que era fundamental, se realizou na educação, nem na justiça, nem na economia, nem na cultura, nem na mentalidade indígena. Às pechas tradicionais juntaram-se vaidades, negociatas e oportunismos novos.
Quando o reinado cavaquista acabou, o país estava sufocado, como ainda se lembra quem não perdeu a memória. E o próprio presidente do conselho se deu conta de que estava rodeado dum partido de alimárias, de oportunistas e de figurões pouco sérios. Por isso os sujeitou a um tabu que durou um ano. No fim tirou-lhes o tapete, e deixou o partido numa orfandade de que ainda não saiu, para nossa actual desgraça. Resta dele um concílio de barões pouco recomendáveis, e uma clique de esquerdistas reciclados, que deixaram de mijar na cama quando aprenderam a ler as citações do Mao.
Guterres veio a seguir, inevitavelmente, porque o país estava cheio das competências do professor Cavaco. E sendo embora o governante mais bem formado, mais culto, mais humanista, mais sério e mais cosmopolita que Portugal já teve, Guterres só demonstrou que isso não chega para ser um bom governante, e evitar erros crassos, como a barragem do Côa, as portagens da CREL, e sobretudo o regabofe dos caciquismos locais, e dos homens das rotundas, e outros megalómanos que nunca faltaram na paisagem portuguesa.
As más opções anteriores e os interesses instalados já tinham a via aberta, e Guterres não quis, ou não soube, ou não pôde fazer alterações à rota. Quando viu que o saco tinha fundo, fez o que faz qualquer tipo decente e renunciou ao poder.
O rústico democrata algarvio entretanto mudou de ares, e deixou poisar a poeirada. E volta agora, do poleiro doirado e inócuo de Belém, a soltar lamentações de crocodilo, e a lançar tiradas sobre as gerações dos nossos filhos, que o deixam muito preocupado. É um bom seringador, o nosso Presidente. O que não faz de nós todos, é claro, coisas muito melhores do que ele! Mas isso já é outra questão.
* Escritor, democrata e anti-fascista
Comentários
Como saberá, uma coisa são os sonhos e outra as realidades.
A interrupção da barragem do Côa, que estava meia feita, custou ao erário 20 milhões dos antigos.
E deixou escalavrada uma paisagem que o não merecia, e não abona muito em favor do ambiente. Lá está, para quem a queira ver.
A interrupção dessa barragem conduziu à alternativa do Sabor, que já está em marcha acelerada. E aí sim, há conteúdos ambientais únicos na Europa que se afogam definitivamente, sem salvaguarda possível.
A interrupção dessa barragem levará em breve à construção do Tua, riscando do mapa uma linha férrea de montanha que é belíssima, que é património histórico, paisagístico, técnico, cultural, turístico, e que nenhum espírito lúcido e civilizado aceitaria sacrificar.
É claro que nisto tudo há compromissos, entre a indispensável energia limpa e o património a preservar.
No caso do Côa o compromisso era possível. Não era forçoso deixar os cavalinhos a afogar-se. Bastava retirar as pedras em que se inscrevem, deslocalizá-los, mudá-los de lameiro. Por exemplo, instalá-los no museu que lá construiram no cimo duma colina, parece de longe um palácio de sultão, um dia, quando abrir, havemos de ver o que se guarda lá dentro. Claro que se perdia aos cavalinhos o contexto, arqueológico, paisagístico, e outras metafísicas. Mas era possível salvar os cavalinhos, que tiveram, em 2007, 14 mil visitantes, bastante menos que os 200 mil previstos por visionários.
Passe por Foz-Côa, André, e metade dos habitantes dir-lhe-ão que, não tarda, fazem o resto da barragem.
Dizem eles e eu não tenho dúvidas, é uma questão de tempo. Porque (já o outro dizia) o que tem que ser, tem muita força!