As eleições nos EUA

A maior conclusão que podemos tirar dos resultados é que a democracia é mal-amada, não apenas nos EUA, mas em todo o mundo. Parece que os eleitores estão dispostos a aplaudir quem os liberte do incómodo das escolhas, dessa chatice das eleições.

Trump e Elon Musk asseguraram a vitória da extrema-direita contra a democracia, da xenofobia contra o multiculturalismo, da misoginia contra a igualdade de género, da homofobia contra a autodeterminação sexual, da boçalidade contra a urbanidade.

Trump não deixou de ser mitómano, psicopata e boçal, mas ganhou legitimidade com a democracia, o único sistema que permite hoje ao fascismo atingir o poder sem golpes de Estado. Não deixou de ser um marginal condenado, mas agora sufragado pelo voto.

Ele não ganhou só a Casa Branca, ganhou a carta branca no Senado, no Congresso e no Supremo Tribunal. Já pode voltar a contratar o sinistro Steve Banon, que indultou, para o devolver à Europa a promover o fascismo e para ser seu conselheiro na governação.

Não foram os russos que lhe entregaram o poder absoluto, foram os americanos que lho levaram na onda de entusiasmo que derrubou a decência, a humanidade e a tolerância.

A grande derrotada foi a União Europeia, um reduto da civilização onde a herança do Renascimento, do Iluminismo e da Revolução Francesa está em risco.

Os líderes da Nato e da Comissão Europeia, respetivamente Mark Rutte e Ursula von der Leyen, juntaram-se a Macron e Olaf Scholz na subserviência à administração Biden sem equacionarem uma vitória de Trump. À afirmação da UE como potência autónoma, entre a hegemonia americana e chinesa (BRICs), preferiram a vocação de satélite.

Foi assim que, até à contagem dos votos, deixaram que Viktor Orbán, o PM húngaro de extrema-direita, se tornasse o interlocutor privilegiado da nova administração americana e o único que pôde cantar vitória enquanto todos os outros parecem agora baratas tontas.

A guerra da Ucrânia, independentemente da bondade da causa, criou uma monumental dívida à UE que desviou recursos da resolução de problemas sociais e tem feito crescer os movimentos de extrema-direita que a contestam. E, perante Israel, em vez de afirmar os seus valores no genocídio em curso na Faixa de Gaza preferiu o silêncio cúmplice.

Agora, debilitada financeira e moralmente, aguarda que um condenado que promoveu o assalto ao Capitólio, para subverter os votos eleitorais, tome posse como presidente para lhe obedecer.

A imprevisibilidade de Trump é a única esperança da UE para que não aconteça o pior, mas as taxas alfandegárias e a política externa de quem no passado mudou a embaixada de Telavive para Jerusalém e reconheceu a soberania de Israel sobre os Montes Golã, ao arrepio do direito internacional, não augura nada de bom.

É um negacionista das vacinas e do aquecimento global que vai dar ordens.

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