Saí de casa…, por ti, João
Interrompi a reclusão de várias semanas e saí de carro, com a máscara que se recomenda e as luvas que se presumem úteis, para a homenagem sentida. Foi a primeira e a última em 47 anos de amizade e companheirismo.
Julguei estar quase só, e encontrei à tua espera uma pequena multidão espalhada, rostos ocultos e barbas desalinhadas a saírem das máscaras, a transgredir a interpretação mais severa das medidas de emergência sanitária.
Não bastaram o ar fúnebre da despedida, a comoção de ver os teus três filhos e a Sofia, os amigos comuns afastados, como avisam as autoridades sanitárias, e a perda irreparável do amigo que ontem, às 12H30, entrou no crematório de Taveiro. Tivemos de suportar a separação dos amigos de longa data, como leprosos na Idade Média, receosos do perigo que cada um podia transportar.
A chuva miudinha eram lágrimas tímidas pelo Homem que se finou, pelo espírito que se extinguiu, enquanto recordávamos a tua imensa tolerância, afabilidade e fino humor que fruímos em momentos de inesquecível alegria.
Bastariam as consultas pro bono para não caberem no espaço em frente ao crematório os que fruíram a tua generosidade; bastariam os teus numerosos amigos para provocarem um engarrafamento; não haveria lugar para todos os que, durante a vida, te viram como eras, um sedutor, e um intelectual que pensava o mundo e discorria sobre as ameaças que nos cercam.
Nunca tinha visto uma corografia fúnebre tão anómala, uma contenção tão exacerbada, um adeus tão pungente e desolado. Foi a última cena na derradeira peça da tua vida em palco nunca visto, com atores que ignorávamos o papel de um funeral em período de medo e incerteza.
Foi amargo este mês de Abril. A tua perda levou um pouco de cada um de nós e deixou o vazio que nos acompanha. Foste um cravo que murchou no jardim de Abril, a voz que se calou no coro da liberdade, o militante de uma sociedade mais justa e fraterna que se perdeu.
Mas não estiveste só quando já não podias ver-nos. Estivemos ali alguns dos muitos que hão de chorar-te enquanto não formos como tu, cinza e saudade.
Fazes aqui muita falta no Ponte Europa, e-pá.
Julguei estar quase só, e encontrei à tua espera uma pequena multidão espalhada, rostos ocultos e barbas desalinhadas a saírem das máscaras, a transgredir a interpretação mais severa das medidas de emergência sanitária.
Não bastaram o ar fúnebre da despedida, a comoção de ver os teus três filhos e a Sofia, os amigos comuns afastados, como avisam as autoridades sanitárias, e a perda irreparável do amigo que ontem, às 12H30, entrou no crematório de Taveiro. Tivemos de suportar a separação dos amigos de longa data, como leprosos na Idade Média, receosos do perigo que cada um podia transportar.
A chuva miudinha eram lágrimas tímidas pelo Homem que se finou, pelo espírito que se extinguiu, enquanto recordávamos a tua imensa tolerância, afabilidade e fino humor que fruímos em momentos de inesquecível alegria.
Bastariam as consultas pro bono para não caberem no espaço em frente ao crematório os que fruíram a tua generosidade; bastariam os teus numerosos amigos para provocarem um engarrafamento; não haveria lugar para todos os que, durante a vida, te viram como eras, um sedutor, e um intelectual que pensava o mundo e discorria sobre as ameaças que nos cercam.
Nunca tinha visto uma corografia fúnebre tão anómala, uma contenção tão exacerbada, um adeus tão pungente e desolado. Foi a última cena na derradeira peça da tua vida em palco nunca visto, com atores que ignorávamos o papel de um funeral em período de medo e incerteza.
Foi amargo este mês de Abril. A tua perda levou um pouco de cada um de nós e deixou o vazio que nos acompanha. Foste um cravo que murchou no jardim de Abril, a voz que se calou no coro da liberdade, o militante de uma sociedade mais justa e fraterna que se perdeu.
Mas não estiveste só quando já não podias ver-nos. Estivemos ali alguns dos muitos que hão de chorar-te enquanto não formos como tu, cinza e saudade.
Fazes aqui muita falta no Ponte Europa, e-pá.
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