TARRAFAL – o Campo da Morte Lenta (87.º aniversário) – Texto atualizado
Há 87 anos, 29 de outubro de 1936, degredados, chegaram ao Campo de Concentração do Tarrafal 152 presos políticos. Nesse dia, para os primeiros prisioneiros, começou a funcionar o presídio onde seria mais doce a morte do que o Inferno da vida que lhes reservaram os torturadores.
Tinham sido 11 dias de viagem, de Lisboa ao Tarrafal, para a
primeira leva de vítimas, grevistas do 18 de janeiro de 1934, na Marinha
Grande, e alguns dos marinheiros que participaram na Revolta dos Marinheiros de
8 de setembro desse ano.
O Tarrafal foi excessivamente grande na afronta e no sadismo
para caber num museu. Salazar teve aí, no degredo da ilha de Santiago, Cabo
Verde, o seu Auschwitz, à sua dimensão paroquial, ao seu jeito de tartufo e
fascista.
Ali morreram 37 presos políticos desterrados, na
«frigideira» ou privados de assistência médica, água, alimentos, e elementares
direitos humanos, alvos de sevícias, exumados e trasladados depois do 25 de
Abril.
Recordar esta data de ignomínia é execrar o facínora que o
quis, o regime que o instituiu e os cúmplices que apoiaram.
Edmundo Pedro, o último sobrevivente, chegou ali, com 17
anos, na companhia do pai, para o indizível suplício de 9 anos. Como foi
possível tamanho sofrimento no silêncio imposto pela ditadura?
E como é possível o esquecimento em democracia? Dói muito,
dói pelo sofrimento dos que lutaram contra o fascismo e pelo esquecimento a que
os votam os que receberam a democracia numa madrugada de abril, com cravos
floridos nas espingardas do MFA.
Neste dia recordo o saudoso amigo Edmundo Pedro, o último a
falecer, e não deixo de pensar que Adriano Moreira, recente e definitivamente
morto, reabriria em 14 de abril de 1961 o Tarrafal (Portaria n.º 18539), e o
presídio de Missombo (Portaria n.º 18702), em Angola, então destinados à
violência contra membros da Frelimo, PAIGC e MPLA).
Com o cadáver insepulto de Adriano Moreira, que sempre
considerou Salazar como o maior estadista português, calei a revolta aos
louvores de que foi alvo, e homenageei Luandino Vieira, membro do MPLA, longos
anos encarcerado no Tarrafal que Adriano Moreira reabriu.
Na AR o voto de pesar branqueou o homem que não abandonou o
CDS quando o PPE o excluiu, por ser de extrema-direita. O salazarista não
deixou de o ser e foi mais um que o Parlamento elevou a democrata, comum voto
de pesar que há de ter doído às vítimas.
Por todo o mundo estão a chegar ao poder os que não hesitam
em criar novos campos de tortura para os adversários. Aguardo com ansiedade os
resultados das eleições do Brasil, amanhã, sem ainda ter digerido a vitória do
fascismo em Itália.
É da amnésia coletiva e da reabilitação dos fascistas que surge o húmus que ressuscita o fascismo.
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