"Até Sempre, Camaradas"

 UMA EXPLICAÇÃO

Publico em dois jornais regionais (Gazeta de Paços de Ferreira e Semanário Alto Minho, no primeiro há cerca de década e meia, e no segundo há dois anos) crónicas regulares em defesa do Ateísmo. Pareceu-me chegado o momento de encarar outros temas como motivação de escrita e decidi que este texto agora publicado, será o último dessas crónicas regulares sobre um tema específico. Voltarei a ele logo que sinta dever fazê-lo, mas, por agora, escreverei sobre a Liberdade que Abril nos deu.

"Até Sempre, Camaradas"

Por Onofre Varela

Comecei a publicar a minha opinião de ateu, regularmente, nas páginas do Semanário Alto Minho, em Março de 2022, totalizando 113 crónicas… juntando-lhe mais sete textos das memórias militares do tempo passado em Viana do Castelo e Deocriste em 1965na preparação militar para a Guerra do Ultramar, soma 120 textos.

Quem me lê, apenas, neste jornal, deve imaginar que eu não tenho nada mais com que me preocupar e que nem sei tocar outro instrumento que não seja a flauta da crítica religiosa. Na verdade, enquanto jornalista-cartunista, sou um crítico da sociedade e de atitudes de personalidades públicas. É esse o meu papel e tento desempenhá-lo do melhor modo que sei e posso.

Paralelamente à profissão, tenho o meu raciocínio de cidadão comum, o qual me levou, perante o sentimento religioso, a “interrogar” em vez de “crer”. A interrogação é inquietante porque nunca é eliminada… as respostas encontradas geram outras interrogações… ao passo que a crença sossega pela “certeza” encontrada nos seus conceitos! Ao contrário do Religioso que encontra em Deus a resposta que procura para satisfazer todas as suas interrogações e se consola nelas, o Ateu interroga-se constantemente… é um eterno desconsolado!

Ninguém nasce ateu ou religioso, tal como não se nasce a saber falar, escrever, ler e contar. A Língua aprende-se em família… e a fé religiosa, também. Habitualmente o religioso é-o por tradição familiar, como extensão cultural da sociedade onde vive e que o modela. E isto tem um peso enorme na formação de cada um. O que aprendemos em criança acompanha-nos por toda a vida, quer para o bem, quer para o mal.

No meu caso particular, sou filho de mãe católica (de apelido Pereira… logo, Cristã Nova) e de pai nascido em 1912, ateu desde jovem, crescido na Primeira República numa aldeia Beirã (Espariz, Tábua) e que “bebeu” a ideologia anti-clericalista de então, a qual, provavelmente, o seu pai abraçaria como operário da panificação que era; e como se sabe, é comum os filhos copiarem os pais. Foi exactamente o que me aconteceu… por isso cresci Republicano e Ateu como era o meu pai.

Os meus pais nunca me obrigaram a frequentar a Igreja e ensinaram-me a ética laica comportamental no respeito pelos outros e pela Natureza, libertando-me da taça religiosa que “santifica” as mentes… mas que também as “envenena”. Libertado do “veneno-de-Deus-e-do-Diabo”, cresci separado do sentimento religioso-deísta e só tive o primeiro “embate” com a Religião aos vinte anos, em Angola.

Aí, em ambiente de guerra, onde a morte rondava e podia calhar a qualquer um a todo o momento, admirei-me com a fé dos meus camaradas que rezavam para que não fossem atingidos pelas balas dos nacionalistas angolanos. De entre as minhas imensas dúvidas, havia esta certeza fatal: se uma bala viesse na minha direcção, não havia mão de Deus ou de santo que a pudesse desviar… e eu só viveria se não fosse atingido num órgão vital e se fosse socorrido a tempo. Parecia-me irreal qualquer outro pensamento distante deste.

Quando regressei da guerra obriguei-me a ler a Bíblia, o Corão, textos Budistas, História das Religiões, o Catecismo, Filósofos, Cientistas e Ensaístas, para satisfazer a minha curiosidade… e só 20 anos depois de encetar estas leituras, de falar com religiosos, ateus e agnósticos, e assistir a missas para perceber o que lá se passava, me considerei ateu… mas então já com a certeza de estar informado e de não me sentir um “ateu de aviário”.

Ao iniciar estas minhas crónicas no Alto Minho, em favor do Ateísmo, animava-me a vontade de mostrar aos religiosos outro modo de sentir e pensar a Religião. Não sei se consegui… mas penso que alertei consciências até então fechadas ao tema por “imperativo proibitório” da fé abraçada… mas isto é um pensamento meu… não tenho o retorno dos leitores e sei que os profundamente crentes não têm espaço mental para encararem opiniões diversas das suas. Dos textos publicados aqui (120… mais 213 na Gazeta de Paços de Ferreira, totalizando 333), é minha intenção fazer uma selecção e talvez publicar em livro.

A partir de agora vou encarar outras motivações para escrever no Alto Minho, baseando-me na Liberdade que os militares de Abril nos ofereceram há 50 anos (sem abandonar a defesa do Ateísmo, a cujo tema voltarei logo que sinta dever fazê-lo).

A quem é profundamente crente, quero dizer que continue a crerEncontrará na fé ânimo suficiente para encarar os momentos menos bons da vida. Não se deve abandonar a crença sem se ter a certeza absoluta de o querer fazer em consciência, pois pode perder a identidade étnica e social… o que não é bom!

Despeço-me até à próxima crónica. Abraço-vos.

(O autor não obedece ao último Acordo Ortográfico)

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