A guerra na Ucrânia e a União Europeia, hoje em Kiev

«Ser inimigo dos EUA é perigoso, mas ser amigo é fatal» (Henry Kissinger)

Mark Rutte, comissário político de Biden e sec.-geral da Nato, não se demitiu por não perceber que é dispensável na comissão liquidatária e inútil na sua reconfiguração. E a UE precisa de preparar a sua sobrevivência e evitar o risco de implosão.

Estão todos tão embevecidos a ser vassalos dos EUA que não avaliam os estragos da sua nova administração, tão tóxica como a anterior, mas alheia ao direito internacional, às alianças, à preservação do ambiente e ao futuro da humanidade.

Nunca questionaram a influência da violação dos acordos de Minsk e do avanço da Nato para leste na explosão do nacionalismo russo, e a pulsão da guerra foi tal que ninguém se lembrou de um plano de paz. A russofobia de Kaja Kallas contagiou tanto a UE que lhe retirou capacidade de mediação do conflito.

A UE deixou de comprar gás à Rússia por ser uma ditadura, e continuou a comprá-lo às teocracias árabes ou através da Turquia, e acrescentou o gás de xisto dos EUA!

A UE, Alemanha incluída, silenciou a sabotagem do gasoduto Nord Stream 2 e atribuiu-a à Rússia, cuja implosão económica desejava. O ato de vassalagem provocou o colapso da economia da UE ao serviço dos interesses americanos. Pedem agora 5% do PIB para a Defesa da UE e continuação da vassalagem aos EUA! Ainda contra a Rússia?

A UE construiu uma narrativa onde a verdade é única e não raro falsa. A censura, sob o apodo de putinista a quem a contrariasse, virou-se contra os censores, e o regresso de Trump, muito mais experiente a mentir, destruiu o discurso feito para agradar a Biden.

Trump, Ellon Musk e outros próceres fascistas usam uma linguagem, contra Zelensky e a Ucrânia, tão grosseira, intimidante e de tal humilhação, que devia revoltar os vassalos, mas, como cinicamente previu Putin, abanam a cauda.

Zelensky, seja qual for o destino da Ucrânia, está politicamente morto, e a UE, vencida, comporta-se como se a guerra fosse sua, mas não consegue falar a uma só voz nem tem meios para inverter a sorte da guerra.

Enquanto a China beneficiou sem gastar um euro ou um homem, à UE restará lamber as feridas e procurar novas alianças. A Ucrânia jamais regressará às fronteiras anteriores e a Rússia não recuperará desta guerra durante a vida de Putin.  

Trump não tardará a soçobrar, mas a UE, desavinda e exausta, insistiu hoje em Kiev no prolongamento da guerra que fez crescer a extrema-direita e as divisões no seu interior.

Com os EUA como inimigo, se não houver petróleo em Bruxelas e soldados dispostos a marchar para a Ucrânia, é a UE que ameaça desintegrar-se.

Comentários

JA disse…
Talvez seja preciso que esta UE se desintegre, pois nos moldes actuais os seus dirigentes há muito que se distanciaram dos povos que deveriam representar adequadamente. Não há eleitos na sua cúpula, nem democracia no seu funcionamento. Apenas burocratas que fizeram um caminho político nos seus países com o sentido único de se guindarem aos lugares bem remunerados que os esperavam: vide o caso português de Durão Barroso e, agora, de António Costa.
Antes a desintegração do que o envio dos filhos do povo para o cemitério certo.
JA disse…
Acrescento este magnífico vídeo de um senhor americano: https://www.youtube.com/watch?v=U8VKVRiZTNI
Carlos Antunes disse…
Carlos Esperança
Com extrema acuidade este seu artigo sobre “A guerra na Ucrânia e a União Europeia, hoje em Kiev”.
Tenho algumas dúvidas é que a desintegração da UE tenha a ver simplesmente com a guerra da Ucrânia e com a deriva em crescendo de Trump que pretende transformar a Europa numa impotente espectadora do seu próprio destino.
Julgo que a desintegração/fragmentação da UE esteve desde sempre associada ao seu acto criador, que podem ser simplificadamente agrupadas, do ponto de vista teórico, nas visões de Jean Monnet (não federalista e de uma simples integração económica) e a de Altiero Spinelli (assumida e explicitamente federalista), com a dicotomia “Estado federal” (uma Europa política com o objectivo de acabar com os estados nacionais) versus manter os Estados europeus como democracias, Estados de Direito e Estados-providência viáveis, embora com alguma perda de soberania nomeadamente no domínio económico que influenciaram, de forma palpável, várias soluções do Tratado de Maastricht (em particular a criação do €uro), ou dos ideais federalistas que claramente, no interior das instituições europeias, nomeadamente nas de perfil supranacional, como a Comissão, o Parlamento e o Tribunal de Justiça (impregnado de um federalismo jurídico do primado do direito da União sobre os direitos nacionais).
Ou seja, no meu modesto entender, a desintegração da UE, principalmente com os sucessivos alargamentos, sempre esteve subjacente a este permanente conflito Estado federal/Estados nacionais, pelo que podendo vir a ocorrer, e assumir muitas formas, desde a separação (como o Brexit), até à dissolução por morte lenta de muitos anos, precedida de inúmeras remissões, dando a sensação, a cada passo, de que o pior foi evitado, como é timbre das decisões tomadas pelas diversas instâncias da UE.
Mas julgo que uma eventual fragmentação da UE e da sua perda de influência global, não decorrerá por implosão do pós-guerra da Ucrânia, tornando-se refém da política de Trump quanto ao conflito.
Acrescentaria mesmo que, sem perder de vista as diferentes perspectivas de governos nacionais europeus, a tendência agora é para UE se unir tanto diante da Rússia quanto dos EUA sob Donald Trump.
Cordiais saudações

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