A Turquia e os direitos das mulheres

A Turquia abandonou ontem a Convenção de Istambul, um tratado pan-europeu para prevenir a violência contra as mulheres, assinado por 45 países há dez anos. Foi a mais cruel notícia contra as mulheres turcas, e ter-se-á esgotado nos noticiários do dia.

A saída, anunciada no jornal oficial do Estado, foi tomada por decreto do PR Erdogan, que assinou o mesmo tratado enquanto primeiro-ministro, em 2011.

Fora dos EUA, as Forças Armadas são as mais numerosas dos países da Nato, e as mais poderosas, depois do RU. São o instrumento das ambições do proto califa, nostálgico de seis séculos do Império Otomano. O ditador já encarcerou ou fez desaparecer os oficiais defensores da laicidade, após um suspeito golpe de Estado cuja repressão foi fulminante contra militares e… juízes.

A Turquia estava entre o grupo de 14 Estados pioneiros, que assinaram a Convenção do Conselho da Europa sobre a prevenção e combate à violência contra as mulheres e à violência doméstica, ironicamente em Istambul, em maio de 2011. O país eurasiático, nunca pôs em prática a convenção, e foi o primeiro Estado a abandoná-la, depois de ter sido o primeiro a ratificá-la.

Erdogan declarou em agosto de 2020 que se retiraria do acordo “se o povo o quisesse” e anunciou a intenção de criar um tratado próprio, o que provocou protestos em massa em várias cidades de todo o país no ano passado, certamente com desgosto de Maomé.

Grupos islâmicos conservadores pressionaram o AKP para a retirada, considerando que alguns artigos têm um impacto negativo “na estrutura familiar” e vão contra os “valores nacionais” (leia-se, “patologia corânica”).

Alegam que promove a homossexualidade, utilizando o termo “orientação sexual”, e ataca os valores familiares, descrevendo as relações de “pessoas que vivem juntas” sem especificar se são casadas. Para o Islão os direitos individuais não existem, são atributo do que o fascismo islâmico designa por decadência ocidental. A Turquia registou 284 assassinatos sexistas de mulheres em 2020, segundo estimativa de Bianet, a ONG que há uma década, na ausência de números oficiais, tem vindo a compilar estes casos.

É irrelevante que no próprio AKP, o partido islâmico criado por Erdogan em 2000, haja vozes discordantes. O Islão não é uma religião, é uma patologia. Nutre o nacionalismo turco que sonha com o regresso ao domínio do sudeste europeu, da Ásia Ocidental e do Norte de África, que vigorou de finais do séc. XIII até ao fim da I Grande Guerra.

Erdogan é um ditador islâmico a quem as democracias passaram alvará de democrata e permitiram a ambição que o levou ao envolvimento político no Médio Oriente, Norte de África, Cáucaso do Sul, Balcãs e, num desafio à Grécia, ao Mediterrâneo. É o prenúncio do expansionismo que devora o déspota, impelido pelo Corão, depois de exterminar os curdos e despertar a unificação do Islão num califado sob a sua égide.

Entre a demência da fé, que discrimina as mulheres e as torna objeto e propriedade dos homens, deve impor-se o humanismo, o respeito pela igualdade dos sexos e a defesa dos direitos humanos.

Não me exijam respeito pelos absurdos de uma religião que envenena os crentes e quer obrigar o mundo a ajoelhar-se virado para Meca. Qualquer ideologia política, religiosa ou filosófica que considere a mulher inferior ao homem, é uma ideologia perversa que urge reprimir, enquanto houver tempo.




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