O FASCISMO É JÁ UM FENÓMENO GLOBAL

Ontem assisti, em direto, à horda fascista que atacou o coração da democracia no Brasil. Eram sonâmbulos embrutecidos, largados de camionetes alugadas, para assaltarem os símbolos do poder, em Brasília.

Vi o ódio que lhes injetaram, a mão que os empurrou, a repetição do ataque ao Capitólio nos EUA, o horror daqueles símios à democracia, a violência dos néscios a obedecerem às ordens de quem os impeliu e escondeu a mão.

Eram a mesma canalha que em Portugal esteve 48 anos no poder, os pulhas que já se exibem com um ex-vereador de Loures a bolçar infâmias contra o PR brasileiro eleito. Eram os ‘jornalistas’ que ontem, na SIC-N, criticaram Lula por afirmar a necessidade de não deixar impunes os criminosos que roubaram armas, processos do Supremo Tribunal Federal e obras de arte do Palácio Planalto. Eram os fascistas que, ao perderem, querem diálogo e, quando ganham, exigem a execução dos adversários.

Houve facínoras que insinuaram aqui, em Portugal, longe do perigo, que Lula poderia estar por trás do golpe para tirar dividendos, invertebrados que se vendem, sabujos que obedecem à voz do dono, lacraus que precisam de expelir o veneno. Vivem da intriga e da calúnia sob o pseudónimo de comentadores e são arautos do regresso à ditadura.

Hoje, 110 anos depois do primeiro Governo presidido por Afonso Costa, efeméride que gostaria de comemorar, a digerir o horror e a raiva que o regresso do fascismo provoca, a ver os órgãos de comunicação social portugueses na desvairada campanha contra o Governo legítimo, sinto que não escreveria diferente sobre os terroristas brasileiros do que, há quatro anos, sobre o chefe de jagunços que o idolatram e ontem aterrorizaram o Brasil e as democracias.  

Aqui fica o texto de há quatro anos:

«Bolsonaro e a inteligência

Quando Bolsonaro, cuja cultura não ultrapassa a de um almocreve e a sensibilidade a de uma lagosta, descobrir que as obras emblemáticas de Brasília se devem ao empedernido comunista Oscar Niemeyer, vai certamente explodir de raiva.

Quando souber que o Palácio do Planalto, a Catedral, o Palácio da Alvorada, o Museu Nacional Honestino Guimarães, o Supremo Tribunal Federal, o Palácio Itamaraty e o Teatro Nacional são obras de um dos maiores expoentes da arquitetura mundial, e que o criador era um comunista da linha mais ortodoxa, há de pensar que a arquitetura é uma subversão e que as formas afrontam a fé, são um hino aos Direitos Humanos e o convite à emancipação do povo brasileiro.

Trágico, pode ser o humor do capitão abrutalhado, PR inepto e evangélico que crê que o mundo foi feito em 6 dias e que o Brasil é um país para arruinar em dois mandatos.

Num misto de fé e de raiva, pode destruir à bomba edifícios que lembram a convivência democrática de ideologias diversas e o benefício que brasileiros ilustres levaram ao país, e seguir o exemplo dos talibãs que destruíram os Budas de Bamiyan, do Vale do Bamiyan, no Afeganistão.

Nunca se sabe o que pode fazer um troglodita assim, quando ouve falar de arte ou de cultura, talvez puxar da pistola como desejava o general Millán-Astray e gritar "Viva a Morte!».

Bolsonaro não gastou tempo a ler Jorge Amado, Machado de Assis, Erico Veríssimo ou Paulo Coelho, e muito menos poetas, Carlos Drummond de Andrade, Vinícius de Moraes ou Manuel Bandeira, ele sabe lá o que é um poeta!

Talvez por isso, o brasileiro culto esteja a sonhar com o poema de Manuel Bandeira:

«Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz

Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconsequente

Que Joana a Louca de Espanha

Rainha e falsa demente

Vem a ser contraparente

Da nora que nunca tive

E como farei ginástica

Andarei de bicicleta

Montarei em burro bravo

Subirei no pau-de-sebo

Tomarei banhos de mar!

E quando estiver cansado

Deito na beira do rio

Mando chamar a mãe-d’água

Pra me contar as histórias

Que no tempo de eu menino

Rosa vinha me contar

Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo

É outra civilização

Tem um processo seguro

De impedir a conceção

Tem telefone automático

Tem alcaloide à vontade

Tem prostitutas bonitas

Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito

Quando de noite me der

Vontade de me matar

— Lá sou amigo do rei —

Terei a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada.»


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