O papa, o mordomo, o informático e a fuga de documentos
Imaginem caros amigos que eu, ateu há mais de 50 anos, era o mordomo do Papa. Esqueçam que sou eu quem seleciona as companhias e que não privo com pessoas de passado duvidoso e comportamento estranho. Esqueçam que eu nunca trabalharia para a única teocracia europeia, um Estado criado por Mussolini e pelo papa de turno, e que, jamais, colaboraria na venda de água benta, indulgências e veneras.
Imaginem, pois, por mera abstração, que era eu o mordomo do papa B16, o papa que dirige uma campanha de branqueamento da cumplicidade da sua Igreja com os regimes nazis e, em especial, a reabilitação de Pio XII, depois de JP2 ter pedido perdão pelas perseguições aos judeus feitas ao longo da história devidas ao antissemitismo do Novo Testamento, uma publicação que justifica a cisão cristã dentro do judaísmo.
Ora, se eu fosse o mordomo, alegaria que tinha sido Deus, nauseado com a sua Igreja, que me tinha pedido para denunciar os crimes que o comprometem. Um Deus que se preze não enterrava numa basílica um padrinho da Máfia, não lavava dinheiro da droga e das armas num banco que tem o pitoresco nome de Instituto para as Obras Religiosas (IOR) e, provavelmente, nem teria um banco.
Num Estado onde não há divisão de poderes, onde o monarca absoluto se encontra vitaliciamente legitimado por vontade divina, onde a santidade é apanágio das funções e do estado civil, é fácil dizer que foi da vontade de Deus a denúncia de documentos que provam a falta de ética do pouco recomendável bairro.
E, dito isto, não sobraria aos juízes, impossibilitados de darem uma sentença antes de a submeterem à apreciação da Cúria, outra saída que não fosse conformarem-se com um milagre bem mais honesto e menos pueril do que os que o Vaticano diariamente inventa para canonizar defuntos de passado duvidoso que rendem avultados emolumentos.
A luta pelo poder, a que não é alheio o Opus Dei, transforma figuras menores, um mordomo e um informático, em bodes expiatórios de uma conspiração silenciosa pela eleição do próximo papa.
Comentários