Eanes e o Opus Dei – janeiro de 2002
Só o facto de o General Ramalho Eanes não pertencer, nem ter pertencido, nunca, ao Opus Dei – como alega – o podem ter conduzido ao panegírico que fez de Josemaria Escrivá de Balaguer em artigo do Expresso de 5 de janeiro.
Carece o general da leitura urgente, entre outros, de dois
livros – “O Mundo Secreto do Opus Dei”, de Robert Hutchison e “Uma Vida na Opus
Dei”, vivida “do lado de dentro” pela autora, Maria del Carmen Tapia, que
trabalhou diretamente com Escrivá.
O artigo referido não tranquiliza quem quer que seja
relativamente à “associação secreta” que atua “ocultamente, com um máximo de
opacidade nos seus assuntos”, como reconheceu o Tribunal Federal Suíço, com
sede em Lausanne.
Escrivá foi elevado a beato graças à cura miraculosa de
cancro da freira Concepcion Boullón Rubio, prima de um ministro de Franco
ligado ao Opus Dei, e cuja doença era desconhecida (!) da madre superiora do
convento. O processo de canonização foi aprovado em 20 de dezembro de 2001
graças à intercessão num milagre na área da dermatologia. A cura do médico
Mário Nevado Rey, que sofria de radiodermite, confirmou a preferência que
Monsenhor Escrivá, já em vida, nutria pelas classes mais favorecidas.
O Senhor General não refere, seguramente por
desconhecimento, o número de ministros do Opus Dei que serviram o ditador
Franco, nem de que lado se colocou o taumaturgo na guerra civil que dilacerou
Espanha, antecedentes pouco compatíveis com a “democracia de Escrivá, mais
atual que nunca”, que lhe atribui. E talvez nunca tenha ouvido falar dos
escândalos financeiros Rumasa, Matesa e Banco Ambrosiano.
A interferência em acontecimentos da Sérvia, Bósnia e
Eslovénia, alguns recentes, bem como as ligações à CIA, o papel desempenhado na
Polónia e, muito provavelmente, na eleição de João Paulo II, não são de molde a
tranquilizar-nos. Mesmo alegando-se que o Papa João Paulo I terá morrido de
morte natural, a existência da seita ultraconservadora Opus Dei é deveras
inquietante.
Janeiro de 2002 (Carta publicada no Expresso em resposta a um artigo laudatório de Ramalho Ranes)
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