Opus Dei, poder e ideologia
A notícia mais importante sobre a Igreja católica não é sobre as traquinices sexuais de alguns padres e os eventuais encobrimentos de alguns bispos, quando os desmandos do foro criminal foram de participação obrigatória à Justiça. A notícia que marcará a Igreja católica e o futuro da sua mais nebulosa organização religiosa é a corajosa reforma do Papa Francisco que implica a redução da independência da Opus Dei.
É interessante ver agora o Papa a vergar a prelatura de João
Paulo II com uma brandura que não foi usada para os jesuítas que, aliás, sempre
lhe obedeceram enquanto a Obra se há de ter obstinado em minar o poder papal.
João Paulo II terminou com a tradicional eleição do padre-geral da Companhia
pelos padres da Ordem.
Apesar da falta de transparência, sabe-se que a Opus Dei,
tem um exército de mais de 90 mil membros leigos, em mais de 60 países, especialmente
na Europa e na América Latina, incluindo sobretudo destacadas figuras políticas
e empresariais, e mais de dois mil sacerdotes. A apetência pela indústria, em
geral, a bancária, em particular, fez da instituição que funcionou ao arrepio
dos bispos das dioceses, uma força particularmente poderosa e politicamente
influente.
O santo fundador, mal entrou em defunção, logo obrou
milagres e cedo foi criado santo pelo Papa João Paulo II que lhe devia a
eleição, as contribuições financeiras para as suas ações políticas, propaganda
mediática pessoal e promoção obsessiva do culto mariano.
Santo Escrivá, diretor espiritual de Franco, cúmplice e esteio
da ditadura e do fascismo, criou um exército de prosélitos e promoveu a
formação de quadros para os partidos de direita e extrema-direita. A oração e o
cilício eram para as horas vagas, para os negócios e para a intervenção
política todas as horas eram boas.
Os principais quadros do VOX, partido fascista espanhol, são
oriundos dos colégios da prelatura e da Universidade de Navarra. As mais
reacionárias leis de família, da Europa e da América latina, têm a mãozinha da
Opus Dei.
Da Espanha de Franco ao Chile de Pinochet, este amigo do
peito e da hóstia de S. João Paulo II colocou, sempre que pôde, os seus membros
nos ministérios das Finanças dos Governos e nas administrações dos Bancos,
incluindo em Portugal onde a Obra esteve presente na luta do PPI/BCP e nos
governos de Cavaco e Passos Coelho. Em Espanha chegou a ter metade das pastas ministeriais
dos governos de Franco e esteve implicada nos casos de corrupção e falência
fraudulenta dos impérios Matesa e Rumasa e, mais tarde, na falência do poderoso
Banco Ambrosiano, em Itália.
A decisão do Papa Francisco é um rude golpe na obscura e
poderosa organização que atuava sem qualquer controlo alheio à sua hierarquia, ignorando-se
se os Papas faziam o que mandava a Obra ou esta era o seu instrumento nos pontificados
anteriores.
No futuro a Opus Dei terá de ser mais prudente nas
conspirações contra as democracias.
O Papa Francisco herdou uma hierarquia lastimável, mas recuperou
o respeito e está em vias de ressuscitar a confiança no Vaticano. Deseja-se-lhe
saúde e que lhe deem tempo.
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