Não havia necessidade

O Congresso de Mafra ficará na história do PSD pelo entusiasmo com que os antigos líderes foram aclamados, entusiasmo que só teve paralelo na pressa com que o partido, a seu tempo, os despediu.

Marcelo, Santana, Marques Mendes e Filipe Menezes fizeram discursos ao nível do que de melhor produziram nas suas carreiras políticas. Como espectador atento estive até ao último momento à espera de que Marcelo se candidatasse, tal eram a força das palavras, a coerência do pensamento e a qualidade do projecto.

Gorada a expectativa, assisti à dolorosa vassalagem a Alberto João Jardim, aos piedosos elogios a Manuela Ferreira Leite, que soaram ao elogio fúnebre de quem não teve um projecto, um discurso ou, sequer, uma ideia para ser alternativa ao actual Governo. Foi uma criação de Belém que se arrastou penosamente atrás da asfixia democrática e que deu o último suspiro próximo do Convento de Mafra.

Os 3 candidatos principais surpreenderam pela positiva, tratando-se de segundas linhas, enquanto outros aguardam que o eleito se queime na fogueira dos ódios em que o PSD vai ardendo, à espera de D. Sebastião, sem cuidar de um projecto e da ideologia.

Foi, no entanto, quando se discutiram os estatutos que o caricato aconteceu. Era já um exército desnorteado que, cansado, começou a disparar contra si próprio, num haraquiri digno de uma tragédia grega. A segunda volta para a eleição do líder – uma decisão que faz todo o sentido – não passou por falta de quórum. E, finalmente, o ressentimento de Santana com Cavaco fez aprovar o delito de opinião, impôs a lei da rolha aos militantes nos últimos 60 dias antes de qualquer acto eleitoral, levou para o PSD o centralismo democrático que sempre condenou no PCP.

Ignorando como serão contados os 60 dias, se os feriados e domingos estão abrangidos , se serão referidos ao começo das campanhas ou aos actos eleitorais, a verdade é que o estalinismo mais primário foi estatutariamente consagrado no PSD.

Manuela Ferreira Leite, impedida de votar, não deixou de se congratular com a decisão. Quem um dia declarou simpatia por seis meses de interrupção da democracia, quem fez uma campanha sobre a asfixia democrática, à boleia de uma cabala nascida em Belém, acabou por dar a bênção a uma decisão que envergonha o PSD e o País.

Triste epitáfio para uma liderança desastrada.

Não havia necessidade.

Comentários

andrepereira disse…
Havia, havia. Para que conste nos manuais das tristes horas da democracia. MAs não será a última notícia: ela terá a coragem de atar as mãos ao seu sucessor abençoando o PEC na véspera das eleições: uma vergonha!
Rui Pato disse…
Um partido que começa um congresso com 3 horas de atraso, que reedita a "lei da rolha" e que quando chega às votações do seu regulamento não tem quorum! Que confiança transmite aos portugueses como putativo partido governamental?
Rui Pato:

Bem-vindo a este espaço bem frequentado com um comentário pertinente.

Abraço.

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