Portugal e a silly season


Este ano não há silly season em Portugal porque a silly já tomou conta do país há muito, é ininterrupta e veio para ficar.

Não significa que a anestesia coletiva esteja de passagem, que a angústia e o medo não permaneçam enquanto o País arde por incúria coletiva e nas estradas e praias se morre por vocação e hábito. Há, neste momento, uma tendência suicidária que só rivaliza com a passividade com que se vive a vergonha e o desespero do estado a que chegámos.

Um país esquecido de Fernando Lima, o homem forte do PR, que encomendou um caso de escutas que corresponde a um golpe de Estado através da calúnia e da intriga, com a conivência do diretor de um jornal; um país desinteressado do maior assalto a um banco – o BPN –, feito pela própria administração, de altos ex-dirigentes partidários; um país que deixa eliminar todos os direitos dos trabalhadores, sob o pretexto de criar postos de trabalho, enquanto caminha para o pleno desemprego; um país onde o principal ministro político é um intrujão que apronta um diploma na hora, de uma licenciatura inexistente na universidade que não frequentou, depois de ter sido deputado com moradas falsas e viagens imaginárias, para defraudar o Estado; um país onde o PR, outrora tão loquaz, se cala perante isso e as ameaças a uma jornalista pelo mesmo ministro e o PM lhe reitera a confiança; nesse país, que é o nosso, não se sabe quem pode ser alvo de chantagem do escândalo das escutas em que o ministro se envolveu nem o motivo do silêncio de quem não pode consentir um país e as instituições neste assustador e irregular funcionamento.

Quando o Tribunal Constitucional fez jurisprudência exemplar em relação ao esbulho dos subsídios dos funcionários públicos e pensionistas, depois da coação da ministra da Justiça, não param as críticas diárias nos órgãos de comunicação social. Um dia vem um merceeiro rico, no seguinte um banqueiro, no outro um comentador avençado e, sucessivamente, administradores de empresas públicas, candidatos a sinecuras e devedores de avenças. E tudo acontece enquanto se descobre um administrador com cargos em 73 empresas.

Este é o país onde se acoitam ministros-sombra que fazem privatizações e trabalham em empresas privadas, exonerando o pudor e a ética, com a cumplicidade do poder e onde os chineses descobrem o talento dos serventuários do mais reacionário dos governos do regime democrático, do mais impreparado e mais empenhado no ajuste de contas com a democracia, a Constituição e a Revolução de abril.

Impossibilitado de mudar de povo, incapaz de um módico de competência, obstinado a cumprir a agenda ultraliberal, este Governo teve a ideia peregrina de aconselhar, como único remédio, como desígnio nacional, como programa, a emigração dos portugueses, custe o que custar, desde que renunciem à zona de conforto destinada aos amigos.

Ponte Europa / Sorumbático

Comentários

e-pá! disse…
Afinal o 'turbo-empresário' além das 73 empresas em Portugal ainda gere ou administra mais algumas no estrangeiro, pelo que totalizará à volta de 100.
Trata-se - segundo o Diário Económico - de Miguel Pais do Amaral. A estes atributos acresce ainda a vertente nobiliárquica e a desportiva (automobilismo).

Ah valente! Um verdadeiro 'super-man'.
Vai ser difícil a Passos Coelho 'lançá-lo' no desemprego...
Chapeau, Barroco!
Fogo na escumalha, com este espírito atento e crítico!
É a única G3 que ainda funciona!
Apoiado, meu caro Esperança.
Um post certeiro, que põe o dedo na ferida, ou melhor, nas feridas, que as pústulas são muitas e mal-cheirosas!

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