Voando sobre um ninho de cucos_3
Ao começar mais um exórdio sobre a ornitologia política a que me propus no estudo de pássaros, passarinhos e passarões da política portuguesa, deixo um pássaro lento, mais parecido com a galinha, e avanço para uma ave de grande envergadura.
Marcelo, hipercinético, de incontrolável loquacidade e
ambição, anda, desde o início do segundo mandato, a tecer as malhas da ascensão
da direita ao poder, sob o seu comando, ajudado pelos media e a feliz circunstância
de ter sucedido a um pétreo salazarista.
As referências ao OE não são de agora, em pleno furacão das
negociações que o próprio se encarrega de dificultar. Ao repetir com
insistência, desde o início da legislatura, que não lhe passa pela cabeça, em
cada ano, que o OE não seja aprovado, sabe bem que tece a intriga que dificulta
as negociações. Não quer dramas, crises, indecisões ou guerrilhas – diz, e
estimula-as. Não se cala!
O avatar civilizado, culto e inteligente do antecessor é
mais sibilino na intriga e eficaz na cizânia que lança entre os partidos
esquerda. Foi a fraqueza da direita que o levou a precipitar-se na perturbação
do regular funcionamento das negociações interpartidárias.
A vitória de Moedas em Lisboa levou-o a verbalizar a euforia
e a assumir a predileção por Paulo Rangel enquanto tenta fazer a Rui Rio o que
vem fazendo a António Costa.
A peixeirada com a substituição do CEMA pelo almirante
Gouveia e Melo, decisão que a imprensa garantiu estar combinada entre PR, PM,
ministro da Defesa e os almirantes envolvidos, foi a versão palaciana da insidiosa
intriga das escutas urdida na Casa Civil de Cavaco, agora orquestrada na Casa
Militar do atual inquilino de Belém.
Convinha, por um módico de decência, que Marcelo explicasse
o lacónico comunicado em que “ficaram esclarecidos os equívocos”, sabendo que o
sentido de Estado do PM e do ministro da Defesa não lhes permite esclarecer o
que o PR deve.
Marcelo não tropeça na gramática, come bolo-rei com
elegância e beija a mão de uma senhora sem parecer antropófago, mas não basta
para ser um PR probo. A impaciência para levar a direita ao poder levou-o a
precipitar-se, podendo provocar as eleições que não estavam previstas na sua
agenda e, num descaramento próprio de um cabo eleitoral, já veio referir que
António Costa tem margem orçamental para satisfazer as exigências do PCP e BE, preparando
a culpabilização antecipada do PS pela eventual rutura.
Promove o aventureirismo orçamental, alheio à incerteza
sanitária, à agitação social e à subida dos combustíveis, para depois poder
culpar toda a esquerda pelos erros que ele próprio estimula sem que os media
o desmascarem.
Surpreende que os militantes do PS, talvez envergonhados do
voto presidencial, não lhe façam notar a permanente provocação ao PM cujo
sentido de Estado o impede de deixar o País à deriva.
A ameaça de que obrigará a eleições legislativas em caso de
um chumbo do OE/22 faz parte do folclore e do condicionamento da opinião
pública, porque a não aprovação do OE implica a demissão do Governo, sem que o
PR possa fingir que depende dele.
Um político com a dimensão de António Costa não merece ser assado
no lume atiçado pelo PR, e este deixou de merecer a complacência da esquerda.
Marcelo é um democrata da ala direita do PSD. Voltarei ao assunto
para depenar a ave que voa demasiado alto para o que merece e a CRP lhe concede.
É urgente aparar-lhe as asas.
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