13 de setembro de 2022
A vida continua, enquanto os jornalistas das televisões portuguesas, destacados como agentes funerários, vestidos de luto, percorrem o Reino Unido para animar os ecrãs com o funeral itinerante de uma morta de longa duração, que obrigou o filho primogénito a esperar 73 anos pelo primeiro emprego.
Faz mais falta e teve pensamento próprio o cineasta mais criativo da “Nouvelle Vague”, Jean-Luc Godard, crítico de cinema (Cahiers du Cinéma) ator, escritor e ensaísta de mérito, falecido hoje. Foi um dos mais influentes realizadores cinematográficos do seu (nosso) tempo, legando uma nova estética com que desafiou as convenções tradicionais de Hollywood.
Foi o talento e não a via uterina que fez dele uma referência para os amantes do cinema.
Evocada a cultura, a pretexto do óbito do grande cineasta, urge recordar o aniversário de dois grandes escritores portugueses, nascidos em 13 de setembro:
1 – Nasceu Aquilino Ribeiro, há 137 anos, o mais fecundo
escritor da primeira metade do século XX. Mestre Aquilino legou-nos uma prosa singular,
uma linguagem e uma estética que urge revisitar. É uma referência literária, um
exemplo de participação cívica e um escritor a que é obrigatório voltar sempre.
Deixou um banquete literário à espera de quem ama a língua portuguesa.
Quando os lobos uivam, por toda a Europa e, um pouco por todo o mundo, recordar o carbonário é um ato gratidão republicana e democrática.
2 – Há 99 anos nasceu Natália Correia, notável intelectual, escritora, jornalista, política e cidadã. Deixou a marca de uma personalidade ímpar e do seu espírito independente.
Porque o humor é uma forma de pedagogia, em vez de um poema, dos muitos com que enriqueceu a literatura, deixo os versos escritos na Assembleia da República, logo que o deputado João Morgado, do CDS, produziu no hemiciclo esta frase lapidar:
«O ato sexual só é legítimo para ter filhos».
Depois desta síntese do pensamento democrata-cristão, que nenhum deputado do CDS repudiou publicamente, Natália escreveu e passou aos colegas este poema:
Já que o coito – diz Morgado –
Tem como fim cristalino
Preciso e imaculado
Fazer menina ou menino;
E cada vez que o Varão
Sexual petisco manduca,
Temos na procriação
Prova de que houve, truca-truca.
Sendo pai de um só rebento,
Lógica é a conclusão
De que o viril instrumento
Só usou – parca ração! –
Uma vez. E se a função
Faz o órgão – diz o ditado –,
Consumada essa exceção,
Ficou capado, o Morgado!
NATÁLIA CORREIA
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