A demissão de Marta Temido e o SNS
Estão de parabéns os bastonários da saúde, os hospitais privados, o PR que, segundo a RTP, já tinha puxado as orelhas ao Governo, como se tivesse legitimidade para tal ou a função lhe permitisse a reincidente perturbação do Governo, e os partidos da oposição, os únicos com legitimidade política no combate partidário.
Feriram o Governo e derrubaram a talvez mais bem preparada
ministra que tutelou o SNS. Muitos hão de sentir remorsos de terem embarcado no
coro de críticas, mas será tarde.
Quem, como eu, foi funcionário público efetivo, com vínculo
definitivo, sem usufruir de qualquer apoio médico ou medicamentoso, e que hoje
recebe do SNS um serviço de excelência, com inexcedível dedicação, desde os
técnicos de análises, aos enfermeiros e médicos que o têm assistido, não pode
deixar de execrar os bastonários da Saúde e os comentadores ideologicamente
comprometidos na obstinação dos ataques e na procura de eventuais
insuficiências do SNS para o derrubar e a quem o tutela. Seja quem for!
Recordo, desde o tempo do salazarismo, quando a
insensibilidade perante a saúde dos portugueses era regra, os esforços de
Miller Guerra, Pinto Correia e outros médicos para dotar o País de carreiras
médicas que reduzissem drasticamente os níveis de mortalidade infantil, materno
fetal e de tuberculose, entre outras doenças que, com o analfabetismo,
colocavam Portugal ao nível do 3.º Mundo.
Assisti com apreensão aos debates que criaram o SNS, à força
com que se lhe opunham o PSD e o CDS, além dos tubarões da medicina que
incluíam muitos médicos do PS.
Hoje, com o êxito notável e a popularidade adquirida pelo
SNS, são os adversários de sempre que dizem defendê-lo e procuram boicotá-lo.
Esquecem-se, por exemplo, que os médicos são pagos na sua formação, durante
longos anos, sem que o Estado exija, como devia, igual número de anos de
dedicação exclusiva. É evidente que os profissionais de saúde devem ver
revalorizadas as suas carreiras, como Marta Temido procurava fazer.
O ministro António Arnaut, o Secretário de Estado Mário
Mendes e o chefe de gabinete do ministro, Manuel Sá Correia, médicos distintos
os dois últimos, ergueram, contra os interesses privados e os caritativos, os
partidos de direita e os médicos privilegiados, o SNS que agora, dizendo
defendê-lo, tentam aniquilar.
Quando as coisas correm mal aos doentes nos hospitais
privados são os públicos que os recebem e são estes que ficam habitualmente com
os tratamentos mais dispendiosos.
Há, na cidade onde ora me encontro, um hospital privado que,
há vários anos, exala um cheiro nauseabundo, insuportável para quem entra ou
sai, vindo dos esgotos, e que não resolveu. Se fosse público, abriria
telejornais, o/a ministro/a da Saúde seria perseguido por jornalistas
diariamente e os comentadores preencheriam os intervalos da guerra, da pandemia,
das declarações dos bastonários da Saúde e do PR português com o assunto.
Na saída de Marta Temido do Governo, deixo-lhe aqui o
testemunho da minha gratidão pela sua competência, dedicação e coragem com que
dirigiu o ministério. A resistência aos ataques, tantas vezes injustos e de
mera animosidade partidária, não apagam o seu apego ao serviço público e o que
lhe devemos na forma como enfrentou a pandemia e procurou servir todos os
portugueses.
Obrigado, Marta Temido.
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