CHIPRE: breve e sucinta resenha do desastre anunciado…
Merkel e Anastasiades numa cimeira do PPE
A República do Chipre, isto é, a parte sul da ilha reconhecida internacionalmente como um Estado e membro da UE desde 1 de Maio de 2004 (cimeira de Dublin), acabaria por integrar o Eurogrupo em 1 de Janeiro de 2008, completando um conturbado e violento ciclo histórico.
Na altura da adesão o Chipre era apontado como um caso de sucesso a reboque de um crescimento económico ‘sustentado’, escondendo-se debaixo do tapete a alavanca deste êxito: o offshore (paraíso fiscal).
Na realidade, o ‘elogio’ era endereçado à ‘lavandaria mediterrânica da oligarquia russa’ que se dedicava a uma abundante e lucrativa especulação: imobiliária e da dívida grega.
Logo após a entrada de Chipre no Eurogrupo, em Fevereiro de 2008, foi eleito o presidente Dimitris Christófias, político de Esquerda, pertencente ao AKEL, o atípico partido comunista cipriota mas, na prática, um político tolerante com a 'economia de casino' que aí se tinha instalado.
Em 2011, o sector financeiro cipriota sofre um importante abalo resultante do ‘haircut’ da dívida grega, negociado entre os credores internacionais e a Grécia. O 'perdão da dívida grega' reflectiu-se profundamente neste mercado financeiro causando avultadas perdas aos bancos. Nessa altura, Chipre emite um pedido de ajuda à UE. A contabilidade da época – referente aos dois principais bancos - registava perdas estimadas em 4,5 mil milhões de euros.
A ajuda solicitada pelo Governo de Chipre à UE, pretendia que fosse activado pelo BCE o sistema de emergência de liquidez para os bancos cipriotas que tinham sido duramente atingidos (como sucedeu em relação a alguns bancos regionais alemães em risco de incumprimento) pelo perdão parcial da dívida grega, decisão estranha ao governo cipriota e da responsabilidade do Conselho Europeu (na altura da dupla 'Merkozy').
Na resposta, o resgate financeiro proposto pelo BCE ao Governo cipriota é complementado com um programa político e, para ‘salvar’ os bancos cipriotas, a proposta de apoio aparece supervisionada pela troika (União Europeia, Banco Central Europeu, Fundo Monetário Internacional) que esboçou um 'pacote de condições' a essa ‘ajuda’.
A 'receita' foi a do costume:
- redução de 15% nos salários dos funcionários públicos;
- redução de 10% nas prestações sociais;
- diminuição da ajuda à habitação e as subvenções indexadas à inflação;
- aumento do IVA;
- privatizações de empresas públicas.
O presidente cessante Chistófias não aceita estas condições na globalidade e, por exemplo, indigna-se com a exigência de privatizações das empresas públicas que apresentam saldos positivos. Resolve - face a esta situação - pedir um empréstimo à Rússia para permitir ao Chipre espaço e capacidade de negociação.
Entretanto, as negociações com a troika arrastam-se penosamente, desde Junho 2012, e só conheceram novos e súbitos desenvolvimentos quando ocorrem novas eleições em Chipre e o presidente cessante decide não se recandidatar para apoiar um candidato independente que é derrotado.
As eleições são ganhas pelo líder da Direita, Nicos Anastasiades, que de imediato (tomou posse a 1 de Março) se torna um interlocutor ‘credível’ para a troika, nomeadamente através dos ‘canais’ políticos do Partido Popular Europeu. A sua campanha baseou-se na necessidade de um bailout que estaria em boas condições para negociar…
Logo após a vitória eleitoral começa a falar de (conquistar) ‘credibilidade externa’ e (proceder a) ‘reformas estruturais’. Isto é, começou a desfiar a cartilha neoliberal. Uma situação que se tornou maçadora, por repetitiva (deixando de lado a constatação da sua ineficácia).
Depois, enfim, foi tudo aquilo a que assistimos na última semana e já foi sobejamente comentado.
Esta é uma curta resenha de mais uma história exemplar na trajectória de desmantelamento da UE. Aliás, mais do que uma história, é um exercício didáctico.
Ou, se calhar, mais uma historieta sobre o ‘desastre’ que espreita os incautos europeus …
Comentários