O 'ajustamento' democrático (em curso) …
Mais cedo do que se julgava veio à tona a verdadeira razão pela qual o PSD denodadamente se bateu contra a ‘TSU dos patrões’ link.
Queria matar 2 coelhos com a mesma cajadada: fazer chicana ao Governo PS e (também) ‘encanzinar’ o aumento do salário mínimo nacional.
A posição do BE e PCP contra as alterações na TSU era desde há muito conhecida e revelou-se uma opção extremamente realista. Estes partidos não aceitam que o aumento do salário mínimo nacional possa estar (ficar) ligado a benefícios patronais quanto mais não seja porque a programação escalonada desse aumento até 2019, como está no programa de Governo, colocaria o Executivo de joelhos perante as corporações patronais.
Agora, em Arouca, em plena campanha autárquica, o dirigente do PSD revela explicitamente a posição do seu partido. Está contra o aumento do salário mínimo, isto é, pretende condicionar a devolução de rendimentos aos trabalhadores à evolução do crescimento da economia e à competitividade.
Finalmente, pôs o seu discurso em consonância com os interesses que a Direita que representa, isto é, à apropriação intensiva das mais-valias do trabalho pelo capital.
O mecanismo é conhecido. A evolução dos salários sofreu desde 2009 tratos de polé que englobam congelamentos, destruição de carreiras e alterações da lei laboral (fim das negociações coletivas, aumento do horário de trabalho semanal, diminuição dos dias de férias anuais, extinção de feriados, etc.).
A Direita considera estes mecanismos uma ‘conquista’ que, pela calada pretende irreversível, embora continue a vociferar em público (para incautos) que é contra uma economia tributário de baixos salários.
A devolução dos rendimentos às forças de trabalho que sofreram na pele as consequências mais duras da crise financeira – bandeira do atual governo e que congrega toda a Esquerda – incomoda seriamente a Direita. Pretende, para já, condicioná-la ao crescimento económico e a ganhos na competitividade, enquanto sonha, nos ‘seus’ planos futuros, a sua reversão.
A evolução da economia depende de múltiplos fatores desde o celebre ‘empreendedorismo’, aos custos do financiamento (sempre o sector financeiro na berlinda), à evolução do crescimento global, à carga fiscal, à celeridade da justiça, etc.. Um conjunto de situações, muitas delas exógenas ao ‘mundo do trabalho’, e que escapam ao seu controlo e, portanto, à responsabilidade das forças do trabalho, e estão dependentes da ideológica relação capital/trabalho ao que, neste momento, devemos acrescentar a componente tecnológica.
Embora uma enorme parte desses fatores sejam ‘importados’ (exógenos) a Direita acha que, de qualquer maneira, os trabalhadores devem continuar a ser penalizados.
Por outro lado, a competitividade (empresarial entenda-se), é uma autêntica torre de Babel. Serve para ‘justificar’ tudo. Os fatores de competitividade são, como sabemos, múltiplos, entre os quais emerge a necessidade de um mercado concorrencial, necessariamente regulado, para não ‘descambar’. Este pormenor da regulação faz a diferença entre uma economia saudável, com justiça distributiva, e a selva que o neoliberalismo adotou e quer impor.
A competitividade é sempre a premissa prévia das famosas ‘reestruturações’ empresariais que contemplam sistematicamente impiedosos despedimentos em massa e redução de salários.
Passos Coelho não compreende que as reivindicações dos trabalhadores sejam satisfeitas porque, de facto, ‘acredita’ que a economia renasce do empobrecimento das pessoas através da desvalorização dos salários e na introdução de ritmos infernais de trabalho. Essa foi a sua estratégia durante o seu mandato.
Os múltiplos fatores de competitividade englobam também a relação preço/qualidade da mão-de-obra mas a Direita tende a agigantar os custos do fator trabalho (imputando-lhe um peso excessivo) para manter os exorbitantes custos de contexto (energia, transportes, administrativos, etc.), isto é, protegendo as rendas e transformando os trabalhadores num ‘bombo da festa’.
O líder do PSD alimenta, para consumo dos seus correligionários, neste terreno do SMN, uma gigantesca fraude. Pretende fazer um reset aos 7 longos anos de ‘sacrifícios’ (só em 2009 se verificou um aumento real), que mais não foram que uma avultada perda de capacidade financeira (poder de compra) das pessoas e das famílias.
E intencionalmente confunde a restituição de rendimentos que foram espoliados ao longo da última crise como uma outra que será a evolução futura dos salários.
Hoje, com a volatilidade dos ditos ‘mercados’ é difícil indexar o ajustamento de salários a outras variáveis como seja, por exemplo, a taxa de inflação. Sem soberania monetária (delegada ao BCE) todos estes ajustes são muito mais complexos porque um dos primordiais fatores de compensação (a valorização ou desvalorização da moeda) escapa-nos.
Finalmente, fora destas considerações, resta afirmar que é uma pretensão justa dos trabalhadores a melhoria dos salários. Há que perder a vergonha de afirmar isso. A cantilena do País 'pobrezinho', mal amanhado e vítima das dificuldades ancestrais, é uma visão parcial e disforme da realidade e não deve tolher a reivindicação de uma vida melhor.
Esse será o passo seguinte que deverá começar quando se apagarem as iniquidades do ‘período excepcional’ (designação da Direita para a intervenção externa). Efectuadas as reposições (processo ainda em curso) deverá haver tempo e espaço político para aumentar os rendimentos dos trabalhadores.
Este o novo ‘ajustamento’, eminentemente democrático que, Passos Coelho e a camarilha da Direita, não querem ouvir falar.
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