Associação 25 de Abril - 25 de Novembro, 44 anos depois

Car@(s) Associad@(s)

A pedido do próprio, divulgamos um texto pessoal de Vasco Lourenço.

A Direcção
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Muitos falam, poucos acertam!
Lembro-me desta frase, quando assisto às várias afirmações que se proferem sobre o 25 de Novembro de 1975, passados que são 44 anos após essa data da História de Portugal que, na sequência do 25 de Abril de 1974, recolocou o comboio da revolução nos carris democráticos e ajudou (muito) à consumação do D de Democratizar do Programa do MFA.

Efectivamente, o 25 de Novembro permitiu a concretização dos resultados das eleições de 25 de Abril de 1975 para a Assembleia Constituinte, pois se esta não aprovasse livremente uma Constituição da República de nada teriam válido as eleições mais livres e participadas que, até hoje, se realizaram em Portugal!

Como um dos principais responsáveis pelas forças vencedoras desse já longínquo "combate", não me arrependi das atitudes então assumidas, continuo a ter muito orgulho nelas, rio-me muito - apesar de, dada a enorme importância do assunto, haver razão para se chorar - com as diversas declarações que se seguiram à nada surpreendente (face à natureza do proponente) proposta de comemoração solene da data pela Assembleia da República.

Estou mesmo a ver o proponente reunir um grupo de militares para comemorar um acontecimento em que, contrariamente ao que teimam em fazer crer, foram vencidos e não vencedores.

É que, apontar Jaime Neves como vencedor, pese embora o papel relevante que então desempenhou, constitui autêntica anedota! Não tenhamos dúvidas, Jaime Neves e a facção de que ele era a figura mais visível, não atingiram os objectivos que pretendiam! E isso ficou bem visível na sua intervenção, na reunião que se fez no Regimento de Comandos, no dia 27 de Novembro, quando se dirigiu ao Presidente da República Costa Gomes, afirmando que ele e os seus homens não estavam satisfeitos, queriam mais! Intervenção que eu fiz terminar, ao mandá-lo calar, "porque já disseste asneiras a mais!".

Não, Jaime Neves não conseguiu que se concretizasse a assunção da tomada do poder pela direita, que de democrata só tinha o nome.

E, por mais que isso possa parecer presunçoso, considero-me como o principal responsável por termos evitado isso! Certamente, e não o esqueço nem omito, coadjuvado por outros militares de Abril, onde o Ramalho Eanes ocupou lugar importante!...
 
Querem continuar a assumir o equívoco que desde esse tempo inventaram? Se assim se realizam, continuem!...
Mas há mais...

Será que o PCP continua a manter a versão, por si difundida na passagem dos 40 anos do 25 de Novembro (agora recordada pelo jornal i), onde defende que "o 25 de Novembro foi um golpe efectuado pelos Nove, o PS, a extrema direita e o Otelo"?

Penso ser tempo de mudar de posição, pois hoje é sobejamente sabido (ainda que não publicamente) que foi precisamente ele, PCP, que instrumentalizou os sargentos paraquedistas para fazerem a ocupação das bases aéreas. Aproveitando, é certo, a situação criada pelas inqualificáveis atitudes do CEMFA, Morais Silva, que excedeu largamente a natureza das posições que a generalidade dos militares de Abril assumiram ao longo de todo o processo revolucionário. É que, mesmo na guerra, nem tudo é permitido, nem sempre os fins justificam todos os meios!...

O PCP tem a seu favor o facto de Álvaro Cunhal, pressionado por Costas Gomes com o espectro da guerra civil, ter decidido recuar. Mantém a coerência da luta pelo seu modelo de sociedade, o que o levou, nestes últimos 4 anos, a apoiar uma solução governativa que pôs termo a um estado de coisas que iria lançar Portugal numa situação altamente preocupante e iniciou a recuperação para uma sociedade própria de Abril. Mas, convenhamos, é tempo de abandonar certas "verdades" que, por mais que sejam apregoadas, estão claramente desmentidas pelos factos...

No entanto, o que mais me indignou no artigo do i que me levou a escrever este texto foram as declarações que o Otelo proferiu e aí são difundidas.

Pessoalmente, tenho obrigação de já me não surpreender com nada que venha desse meu amigo e camarada de armas e de Abril. Sim, tenho essa obrigação mas o facto é que, de vez em quando, continuo a surpreender-me com algumas das suas afirmações! Confio que, desta vez, o jornalista não seja obrigado a divulgar uma gravação dessas afirmações, face a um desmentido do Otelo em que afirme que não fez as declarações que lhe são atribuídas! Não seria a primeira vez...

Ler Otelo a afirmar que "eu, hoje, tenho a certeza absoluta de que quem desencadeou a operação dos paraquedistas e a ocupação das bases aéreas foi o PCP", escamoteando que essa operação só foi desencadeada depois de ele próprio ter mandado telefonar ao comandante dos páras, coronel Mascarenhas Pessoa, para "dar luz verde aos páras para irem às bases aéreas fazer sessões de esclarecimento", roça o cúmulo do cinismo (ou da ingenuidade, sei lá...). Tudo no entanto agravado por uma afirmação que tive de ler mais que uma vez, para me convencer que o Otelo a proferiu! Com que então, "o Melo Antunes combinou com o Álvaro Cunhal uma acção militar para dar ao Grupo dos Nove o pretexto para desencadear uma operação militar de ataque imediato a militares que estivessem no terreno!?" Ou, dito de outra maneira, "... o 25 de Novembro pode ter sido provocado pelo Grupo dos Nove, em conluio com o PCP"!

Repito, por mais habituado que esteja às diatribes do Otelo, ele ainda tem o condão de me surpreender!... E, daqui aconselho o Otelo a, de uma vez por todas, assumir que se deixou cair numa armadilha, onde foi usado.

Em relação às posições do meu amigo e camarada de armas e de Abril Mário Tomé, louvo a sua coerência de posições, pois continua a defender as mesmas posições de então, relativamente ao tipo de Forças Armadas necessárias para se obter a sociedade que ele defendia e defende. Teimosamente, no que respeita ao 25 de Novembro, continua a não perceber a "armadilha" em que ele e os seus camaradas esquerdistas caíram, mesmo que o tempo e a evolução dos acontecimentos lhes provem que não tinham nem têm razão! Também, de uma vez por todas, é tempo de compreender que a utopia se não alcança com voluntarismos...

Como se pode ver, quer pelas posições tornadas públicas quer pelas que aqui defendo, o 25 de Novembro continua a dividir os portugueses! Mesmo os que, passados os tempos mais tumultuosos, esquecendo o que os divide, se voltaram a reunir, à volta do que os une, isto é, os genuínos valores de Abril!

Por isso, porque considero que os acontecimentos e as datas que unem devem ser comemorados, caso do 25 de Abril, e os acontecimentos e as datas que dividem não o devem ser, mas apenas recordados para com eles aprendermos, sou adepto da comemoração do 25 de Abril e sou contra a comemoração do 25 de Novembro!

Lisboa, 21 de Novembro de 2019

Vasco Lourenço 

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