Mutilação genital feminina


No Público de ontem, a jornalista Aline Flor refere a uma mulher acusada de submeter a filha de dois anos a mutilação genital feminina. O que surpreende e aumenta a repulsa é o facto de ser “a primeira acusação por mutilação genital feminina” no país segundo confirmou a PGR.

Diz a jornalista que, em Portugal, em 2019, houve sete processos abertos pelo MP por mutilação genital feminina, de acordo com informação enviada ao PÚBLICO pela PGR: cinco inquéritos foram arquivados e outro ainda se encontra em investigação.

 “O estudo mais recente sobre mutilação genital feminina em Portugal, publicado pelo Observatório Nacional de Violência e Género em 2015, estima que residam em Portugal mais de 6500 mulheres com 15 ou mais anos que já tenham sido vítimas de mutilação genital, e cerca de 1830 meninas com menos de 15 anos já teriam sido submetidas a esta prática ou estariam em risco de o ser.” – lê-se no artigo.
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Em nome da tradição tanto se pode defender a morte do touro em Barrancos como a lapidação de uma mulher por adultério. Não há selvajaria, malvadez ou crueldade que não tenha na tradição argumentos de peso e trogloditas defensores.

As mulheres foram sempre as vítimas prediletas do pecado original e da selvajaria dos homens ou de outras mulheres, queimadas por bruxaria, vergastadas ou lapidadaspor adultério, repudiadas pelos maridos, casadas por imposição dos pais e exoneradas dos direitos cívicos e humanos pela legislação sexista. O martírio, a desonra e a humilhação foram o ónus do género que as religiões acolheram e as tradições consagraram.

Das as tradições mais abjetas conta-se a mutilação genital feminina, com a excisão do clítoris, a forma de impedir à mulher o prazer sexual, de lhe causar sofrimento atroz e de lhe provocar, com frequência, a morte.

Dir-se-á que esta selvajaria não é, tal como outras, imposição religiosa. É verdade, mas não deixa de estar associada a costumes onde há sempre uma forte implantação do Islão. E, naturalmente, a componente mercantilista de um próspero negócio.

Não há grande diferença entre o facínora que se aluga para disparar um tiro de escopeta num inimigo a abater e a mulher que se contrata para fazer a excisão genital numa menina. Há nesta selvagem crueldade o peso de séculos e na condescendência ou cumplicidade uma cobardia que envergonha o género humano.

O horror nunca deixa de surpreender e agrava-se quando a superstição, o tribalismo, a fé e a tradição se conjugam.

Malditas tradições, maldita gente que respeita um negócio destes.

Apostila – Vários parágrafos foram recuperados de um texto de 6-2-2008.

Comentários

joão pedro disse…

Felicito-o pelo excelente texto.4

João Pedro
É uma denúncia obrigatória, João Pedro.

Obrigado.

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