O PR e a Constituição
Esperava-se do PR uma defesa intransigente da Constituição, que jurou cumprir e fazer cumprir, e do constitucionalista Marcelo Rebelo de Sousa a capacidade de interpretar os atropelos a que a luta partidária pode conduzir.
Não fora o respeito devido ao PR, o mínimo que podia dizer-se
da sua decisão era que a leviandade e o populismo o tinham reduzido a catavento
de afetos, indiferente à CRP e à estabilidade orçamental, sendo esta
salvaguardada pela lei-travão que impede a AR de aumentar a despesa
pública durante a execução do OE.
Embora lamentável, porque desprezou a CRP, a coligação
negativa de todos os partidos aprovou os apoios sociais que aumentavam despesas
e abriam um grave precedente na previsibilidade e risco de segurança para o
atual e futuros Orçamentos de Estado. Nem o respeito pela “separação de
poderes” os coibiu, nomeadamente ao PSD, que ambiciona um dia voltar ao poder,
de votarem uma lei tão claramente inconstitucional.
Quando se esperava o veto do PR ou, na dúvida, que suscitasse
a apreciação preventiva da constitucionalidade, cumprida que estava a
propaganda partidária na concessão de apoios sociais, resolveu promulgá-la.
Foi sem surpresa que, por unanimidade, o acórdão do Tribunal
Constitucional deu razão ao Governo, que viu invadida a esfera das suas
competências, impondo uma derrota aos partidos que legislaram o que não podiam,
uma monumental derrota política ao PR e um dano irreparável na credibilidade
académica do constitucionalista Marcelo Rebelo de Sousa, pela promulgação de um
diploma que violava grosseiramente a CRP.
Em vez do pedido de desculpas e do ato de contrição perante
a gravidade do precedente que abriria, saiu-se o PR com esta frase insólita: «Fico
muito feliz: porque se cumpriu a Constituição, porque o Governo foi forçado a
legislar sobre os apoios e estes vão continuar em vigor» [sic].
Dito por outras palavras, fáceis de perceber: “Fico muito
feliz porque, depois da minha violação, graças ao TC, cumpriu-se a Constituição
e porque a violação ainda permitiu que os apoios sociais [que me deixam bem
visto] fossem concedidos.
E no futuro? Continuará a violar a CRP ao sabor dos seus
interesses?
Quando um cristão não honra um juramento laico, pode obter
indulgências no Olimpo do seu narcisismo, mas abre a porta do Inferno para
novas e reiteradas violações.
E haverá partidos, que reiteradamente dizem defender a CRP,
que continuem a criticar o envio de diplomas para o Tribunal Constitucional,
confiando na cumplicidade do PR, ou a CRP só interessa quando não põe em risco
o seu plano de propaganda?
Apoiar esta decisão do PR é deixar a interpretação da
Constituição ao seu arbítrio.
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