A LIBERDADE QUE ABRIL NOS DEU

O Gil e a “Derrapagem”




Por Onofre Varela

A Expo’98 (Exposição Internacional de Lisboa) teve como tema “Os Oceanos: um Património para o Futuro”. Realizada em Lisboa para comemorar os 500 anos dos Descobrimentos Portugueses, foi inaugurada a 22 de Maio de 1998 pelo presidente Jorge Sampaio, tendo encerrado quatro meses depois, em Setembro… data estabelecida para o final do seu “prazo de validade”.

Foi considerada a maior exposição cultural e temática realizada em Portugal, cujo evento ficou a dever-se à ideia de dois ilustres Portugueses: o jornalista e escritor António Mega Ferreira, e o escritor, tradutor e político Vasco Graça Moura (ambos já falecidos).

Na oportunidade foi lançado um concurso público para a criação de um mascote que simbolizasse a Expo’98, e de entre os vários projectos que concorreram ganhou o “mascote Gil”, cujo nome foi sugerido por um aluno de um dos seus criadores, referindo Gil Eanes. Os seus autores são dois: o escultor Artur Moreira e o pintor António Modesto (meu amigo de longa data. Colaboramos num jornal satírico onde desenhávamos, ainda ele era estudante na Escola de Belas Artes do Porto, e depois de licenciado seguiu a carreira de professor na mesma Faculdade. Hoje já está reformado há imenso tempo… estou a ficar velho, porra!…).

Todo este introito me serviu para referir um artigo de opinião do advogado portuense Manuel Coelho dos Santos – colaborador habitual do Jornal de Notícias – publicado na edição do dia 19 de Janeiro de 1997 (cerca de ano e meio antes da inauguração da Expo’98).

Nesse artigo o seu autor referia uma notícia “saída de dentro do Governo”, segundo a qual tinha havido uma “derrapagem” no orçamento da Expo’98, acrescentando as despesas em cerca de “trinta e tal milhões de contos”! E Manuel Coelho dos Santos dizia não perceber porque é que o comissário da Expo (Cardoso e Cunha) “possa receber do erário público um ordenado que é superior à soma dos ordenados dos três ministros que o tutelam, que é, por mês, superior ao que cada deputado ganha durante um ano”.

Eu tinha que fazer uma ilustração para o artigo em questão. Depois de o ler, a ideia que me surgiu foi a de um Gil que não brilharia pela sua honestidade e “abotoou-se” a um saco de dinheiro. Para sublinhar que aquele dinheiro poderia não ser fruto de actos honestos, coloquei na cara do mascote Gil uma mascarilha à semelhança dos “Irmãos Metralha” das bandas desenhadas de Walt Disney.

No dia da publicação do artigo, abro o jornal e vejo que o meu desenho foi manipulado: retiraram-lhe a mascarilha! Falei com os camaradas paginadores e fiquei a saber que foi o chefe da Redacção quem mandou mutilar o desenho.

Fiquei com a ideia de que, para aquele chefe, “desviar, fanar, gamar ou gastar à fartazana dinheiro que não é seu” não é prova de desonestidade nem é condenável… tudo está bem, legal, honesto e sem pinta de mácula, se for feito sem máscara!… Ilustrar as “derrapagens” com o raio da mascarilha… é que é uma chatice!…



O desenho original e a reprodução no jornal”




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