Texto de há 3 anos
Era ministra Marta Temido. Hoje não sinto o mesmo otimismo.
«Que belo país o meu!
Quem, como eu, pensava, com algum humor e maior apreensão,
que o coronavírus fora desenhado para matar a partir dos 66 anos e 4 meses, a
idade em vigor para as reformas, assistiu atónito à opção de salvar os mais
velhos em detrimento da segurança social e da produtividade.
Ao ver contrariada a lógica do lucro, a ilusão do
crescimento perpétuo do PIB, a ideia de que a felicidade e a riqueza são
sinónimas, sinto-me grato a um Estado que ainda me quer vivo aos 78 anos.
Até a Europa de que sou orgulhoso cidadão, a Europa laica e
republicana, a herdeira do Renascimento, do Iluminismo e da Revolução Francesa,
deu o exemplo de solidariedade na compra comum de vacinas e no esforço coletivo
de impedir o colapso das economias mais débeis.
Sabendo que Portugal vacinou ainda poucos jovens adultos,
mas raros países vacinaram tanto os mais velhos, sinto redobrado orgulho, não
pelo benefício próprio, pelo exemplo que constitui.
Um país mais próximo de Marrocos do que da França, que em 4
décadas passou de 4 anos de escolaridade obrigatória para 12, que criou o SNS,
cuja qualidade não teme confronto com o dos países mais avançados, que deixou
de ser só de emigrantes para se tornar um país de acolhimento, que integrou 1
milhão de retornados e terminou a guerra colonial, que já leva em democracia
quase tantos anos como os que sofreu de ditadura, penso que é um país onde vale
a pena viver, e merece ser defendido de quem o denigre.
Num país sem censura, sem polícia política ou presos
políticos, sem tortura, é possível combater quem nos governa sem medo de que
nos prendam, torturem ou ostracizem.
Podem os nostálgicos e herdeiros do fascismo sentir comichão
e azia, podem até ser os agentes do regresso, mas o exemplo do Portugal
democrático há de perdurar, e os anos de democracia serão sempre o fermento
para novas madrugadas.
Que belo país o meu!» 6 de agosto de 2021
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