Salazar e a cadeira da nossa esperança – Aconteceu há 56 anos (Homenagem anual)
Não falo das duas cadeiras que a oposição dizia faltarem-lhe, a elétrica e a que lhe devia ter rachado a cabeça, antes de mandar assassinar adversários políticos e dirigentes dos movimentos de libertação das colónias, que os nostálgicos ainda referem como ‘o nosso ultramar infelizmente perdido’.
Refiro-me à cadeira que o caruncho laboriosamente minou ao
longo dos anos, sem que a Pide suspeitasse, e que, na sua aparente robustez,
estava patrioticamente escavada pelo inseto que ofereceu ao país o dia que a
oposição falhou durante 4 décadas.
Foi há 56 anos. No dia 3 de agosto de 1968 o calista Augusto
Hilário preparava-se para tratar dos pés e cuidar das unhas do ditador, as
unhas perversas que cravou na liberdade do povo e na carne dos democratas.
O caruncho poupou ao calista o tratamento dos pés do ditador
porque, há muito, cuidava dos pés da cadeira com a eficiência da sua condição e
a devoção de um patriota, e assim continuou enquanto Hilário e D. Maria lhe
ergueram o corpo e a cabeça cuja dureza não fez mossa no chão. E nunca mais
deitou as unhas de fora.
O caruncho foi o herói anónimo que passou as malhas da Pide,
sem suspeitas da Legião Portuguesa ou a denúncia de qualquer esbirro, e
franqueou as portas do Forte de Santo António para ser conduzido dentro da
madeira para o terraço onde o seu labor de anos terminou em apoteose quando a
cadeira ruiu com o ditador dentro.
É por isso que ainda hoje, 56 anos depois, presto homenagem ao caruncho da nossa esperança.
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