As intempéries da nossa incúria
Enquanto o País se desfaz com a intempérie que soterra pessoas e haveres na enxurrada que derruba pontes e alui estradas, esquecem-se os fogos que tragaram gente e florestas, e deixaram substâncias que vão agora, nas escorrências, envenenar os lençóis freáticos.
Nos incêndios,
no elevador da Glória e agora nas chuvas, há sempre gente que morre, já são três
as vítimas mortais deste mau tempo, património ambiental que se perde, flora e
fauna que não recupera, e os terrenos aráveis minguam, a poluição aumenta e o
combate à emergência climática é abandonado, em Portugal e no resto da Europa.
Enquanto se
opta pelo gás de xisto, o mais maléfico para o ambiente e o mais caro, para que
os EUA continuem a vender armas à UE e a impor-nos tarifas mais gravosas do que
ao Reino Unido, descuram-se prioridades e compromete-se o futuro.
O Governo
português, que não pagou ainda as indemnizações a que se comprometeu nos
incêndios, já promete outras para as inundações cujos prejuízos estão por
avaliar.
O País está
abúlico, aturdido com as desgraças, espantado com os atropelos da Justiça. Um
PM demitiu-se, vítima da trama urdida em Belém pela PGR, o presidente de um Governo
Regional está arguido a integrar o Conselho de Estado, um juiz foi perseguido e
vê negado acesso ao processo que mandado destruir à sorrelfa e a que um Procurador
procura esconder agora várias páginas. Ninguém é julgado. E ninguém se indigna!
O caos atinge
a Saúde enquanto os hospitais privados florescem; substituem-se gestores por amigos;
distribuem-se os excedentes e cativações do anterior Governo por dezanove
careiras da função pública e criam-se novas desigualdades; atribuem-se suplementos
de pensões em vésperas de eleições; atacam-se direitos dos trabalhadores e
desmantela-se o que resta do Estado social. E a apatia do país continua, perante
o povo anestesiado pela propaganda e assustado com burcas e imigrantes.
André
Ventura insulta os PALOP, ameaça a democracia, perturba a convivência pacífica e
apela subliminarmente à reversão da independência dos Países do “nosso Ultramar
infelizmente perdido”, desejoso de ordenar aos soldados, “para Angola
rapidamente e em força”, sem um sobressalto cívico contra a sua demência
ruidosa e provocatória.
Talvez tudo
isto explique que um compromisso assumido pelo ministro das Finanças, o aval de
2.500 milhões de euros a um empréstimo assente em ativos russos congelados, a
favor da Ucrânia, tenha sido assumido “genericamente” por Miranda Sarmento em Conselho
de ministros das Finanças da UE, sem que pareça preocupar os portugueses.
E se, por acaso da sorte, a guerra na Ucrânia não nos favorecer ou os Tribunais vierem a considerar confisco de bens o criativo e generoso ato, os portugueses, agora ignorados, estarão dispostos a pagar o ónus da decisão tomada à sua revelia?

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