BARCELONA: Manuel Valls ou o anúncio de uma candidatura camaleónica…

Valls e Rivera encabeçando uma manifestação unionista em Barcelona

Em Espanha – ou na Europa? - a Direita joga duro contra a movimentação independentista catalã. O plano PP desenhado pelo governo de Mariano Rajoy que - apesar das mudanças dos últimos meses – ainda permanece em curso e tem uma finalidade explícita: decapitar a liderança independentista e lançar a divisão nessas hostes.
Para isso mantem Carles Puigdemont líder do PDeCAT exilado na Bélgica (Bruxelas) e Oriol Junqueras presidente da Esquerda Republicana Catalã (ERC) na prisão de Estremera (Madrid) dificultando qualquer tipo de eventual entendimento com vista à criação de uma frente independentista para concorrer às decisivas eleições municipais de Barcelona.

Perante este impasse surge da cartola um ‘artista’ – neste momento deputado no Parlamento francês – a tentar concertar uma ‘candidatura transversal’ visando introduzir-se como um cavalo de Tróia nas pretensões independentistas. É o conhecido compincha Manuel Valls.

Trata-se de um ‘velho artista’ com um arrepiante percurso nos últimos tempos. É difícil definir o perfil ideológico do personagem. Começou na política como um ‘rocardiano’ ala que, nos tempos de Mitterrand, liderava o sector direitista do Partido Socialista Francês (PSF).
O seu grande modelo político foi, na altura, a ‘via blairista’ (3º. via de Tony Blair), isto é, alinha-se por uma posição social-liberal que foi responsável por uma das grandes machadadas na social-democracia.
Tenta renegar formalmente o socialismo – já o tinha feito na prática - e propõe a rejeição pelo PSF do conceito e da ideologia socialista e consequentemente pretende alterar as históricas posições da Esquerda na redistribuição da riqueza produzida invocando um instrumento usual da Direita – o volúvel pragmatismo.

Em Julho 2009 Martine Aubry publica uma carta aberta link onde convida Manuel Valls a abandonar o PSF. Nessa carta a respeitada e histórica dirigente do PSF escreveu: «…On ne peut utiliser un Parti pour obtenir des mandats et des succès, en s'appuyant sur la force et la légitimité d'une organisation collective, et s'en affranchir pour exister dans les médias à des fins de promotion personnelle… » e convidava-o, formalmente, a abandonar o PSF.
 
Apesar deste grave incidente permanece no PSF onde desempenha cargos na comunicação, acaba por conquistar um cargo no poder local (mairie de Evry) e faz um longo mandato como deputado na Assembleia Nacional (2002-2012), eleito pelo Departamento de Essonne. Em 2011 concorre às primárias do PSF como candidato socialista para a eleição presidencial de 2012.
No escrutínio tem menos de 6% dos votos e desiste em favor de François Hollande que acabaria por ser eleito Presidente da República 
Na presidência de Hollande ocupa o lugar de ministro do Interior onde começa por desenvolver polémicas directivas sobre imigração, lida com dificuldades com os problemas religiosos e da laicidade, titubeia sobre questões energéticas, etc., e mesmo assim, em 2014, assume o cargo de primeiro-ministro após a renúncia de Ayrault já numa fase de absoluta decadência e desmoronamento da presidência de Hollande.
 
Perante o descalabro que se verificou na presidência de Hollande distancia-se do ocupante do palácio do Eliseu, inviabiliza a sua recandidatura e arrisca correr na sua própria pista. Esta estratégia não lhe correu bem e mais uma vez perde (para Benoît Hamon) novamente as primárias no PSF com vista à sua candidatura às presidenciais.
 
Não se conformou com a derrota interna e abandona com estrondo o PSF, enceta ligações políticas comprometedoras e dúbias com Emmanuelle Macron, um 'liberal para todo o serviço' que também tinha integrado a presidência de Holland e acaba por se oferecer às hostes do 'movimento macronista' para ocupar um cargo de deputado.
Não é aceite pela formação política que apoiou Macron nas presidenciais e concorre às legislativas ligado ao LeREM (Grupo da República em Marcha) tendo sido eleito pelo circulo de Essonne (onde tinha exercido funções autárquicas) .
Torna-se num deputado absentista que raramente é visto na assembleia Nacional e perde toda a influência política em França.
 
Agora, desolado, recalcado e descredibilizado, vira-se para a Catalunha e deseja ser o alcaide de Barcelona link.  Para já Manuel Valls tem um projeto ambíguo, muito colado à Direita que pretensiosamente sonha unir as hostes unionistas através da conquista do Municipio de Barcelona.
 
Durante os recentes desenvolvimentos da crise catalã apressou-se a desfilar nas ruas de Barcelona ao lado dos Ciudadanos e de braço dado com Albert Rivera numa ‘manifestação unionista’ (foto). 
Apresenta-se agora com a pretensão de liderar uma candidatura transversal (anti independentista) englobando PP, Ciudadanos e Partido Socialista Catalão (PSC). Trata-se de uma jactancia e um percurso muito sobreponível ao que estamos a verificar na ‘Aliança’ de Pedro Santana Lopes pelo menos nas consequências adotadas após fracasso eleições primárias (internas).
 
Para já, o outro lado da barricada - o bloco independentista - também luta com dificuldades, não tem candidato unitário, nem se vislumbra se será fácil consegui-lo uma vez que o PDeCAT, a ERC e Candidatura de Unidade Popular (as 3 organizações partidárias mais ativas pela causa independentista) têm posições ideológicas e programáticas muito diferentes e de difícil conciliação. Neste campo, de procura de uma candidatura unitária, as associações cívicas e culturais independentistas como a Omnia Cultural e a Assembleia Nacional Catalã (ANC) poderão ter um importante papel a desempenhar.
 
Entretanto, Manuel Valls, já coleciona a primeira nega – a do PSC. Certo e seguro parece ser o apoio de Albert Rivera e da formação Ciudadanos. Mais um palmarés para um ‘inveterado social-liberal deambulante por múltiplos espectros partidários’. Triste sorte se adivinha: acabará como concorrente ao Município de Barcelona por um partido neo-franquista (que em vez da 'cara ao sol' dos falangistas quer mostrar-se com uma sombria silhueta indefinida).
 
O povo catalão - politizado como está - não deverá acolher este 'trajeto camaleónico' de braços abertos. A ver vamos.

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