As eleições gregas e a arrumação eleitoral
Kyriakos Mitsotakis, da velha Nova Democracia, depois da indiscutível vitória eleitoral, tomou posse com o aparato litúrgico, interrompido durante os governos do Syrisa, onde a Igreja Ortodoxa pontificou. Eram previsíveis o regresso do incenso e da água benta e a vitória da Nova Democracia, apesar de a sua última maioria absoluta ter levado a Grécia à bancarrota e ao maior colapso económico da História moderna, com a crise financeira de 2008, que abalou o capitalismo mundial e em Portugal ainda se atribui ao governo de então.
Nos países de religião Cristã Ortodoxa a fraqueza dos Estados deve-se em larga medida à influência clerical da mais política das religiões cristãs. As Igrejas protestantes e a católica, influenciadas pelo direito romano, são civilistas, as Ortodoxas, russa e grega, são tributárias de um direito político, como a muçulmana o é do direito teocrático.
O Syrisa chegou ao Governo depois do colapso do sistema financeiro mundial e cansaço da sucessão dinástica das duas famílias políticas que, fora das ditaduras dos coronéis, se alternavam no poder, no Pasok e Nova Democracia. Esta regressou agora e não lhe falta o pedigree familiar e a bênção do clero que eram também apanágio do Pasok.
Houve duas surpresas, a primeira, como referi na análise sem a contabilidade eleitoral fechada, foi a recuperação do Syrisa da pesada derrota das eleições europeias com a sua institucionalização como o partido da oposição, apesar de ter frustrado as promessas eleitorais e se tornar um partido social-democrata, ou talvez por isso; a segunda foi o regresso do ex-ministro das Finanças ao Parlamento, após a cisão que o fez demitir-se do Governo e do partido, arrastando numerosos intelectuais e quadros que se tornaram politicamente irrelevantes.
São ainda relevantes a ausência parlamentar do partido neofascista Aurora Dourada e a parca expressão eleitoral do partido de extrema-direita, Solução Grega (10 deputados), a que não será alheia a inclusão de Adonis Georgiadis, como vice-presidente na Nova Democracia, do ex-partido LAOS, conhecido pelo seu antissemitismo.
O Syrisa saiu das eleições em boas condições para regressar ao poder, depois de ter sido vítima da humilhação e crueldade do FMI e da UE, com o vergonhoso apoio do governo Passos/Portas, de ter gerido a crise sem precedentes e assinado um acordo sobre o nome de Macedónia do Norte, pragmatismo que acordou rancores nacionalistas. A atribuição de 50 deputados ao partido mais votado, que já favoreceu o Syrisa, esconde a verdadeira geometria eleitoral de um sistema que parece caminhar para o bipartidarismo.
Aqui ficam os resultados eleitorais para que cada leitor possa tirar as suas conclusões:
Comunistas – 15; MeRA25 (Varoufakis) – 9; Syrisa – 86; KINAL (Movimento para a Mudança, novo partido saído das cinzas do derrotado PASOK) – 22; Nova Democracia – 158 (bónus de 50 deputados); Solução Grega (extrema-direita) – 10.
Finalmente, regista-se a natural urbanidade democrática de Alexis Tsipras que felicitou e recebeu o sucessor Kyriakos Mitsotakis no Palácio do Governo, apertando-lhe a mão, antes de sair, ao contrário do que lhe fez o seu antecessor, Antonis Samaras, também da Nova Democracia, de quem o novo PM foi ministro, que não só não o recebeu, como o seu staff levou canetas, blocos, sabonetes e até o código do WiFi da residência oficial.
Nos países de religião Cristã Ortodoxa a fraqueza dos Estados deve-se em larga medida à influência clerical da mais política das religiões cristãs. As Igrejas protestantes e a católica, influenciadas pelo direito romano, são civilistas, as Ortodoxas, russa e grega, são tributárias de um direito político, como a muçulmana o é do direito teocrático.
O Syrisa chegou ao Governo depois do colapso do sistema financeiro mundial e cansaço da sucessão dinástica das duas famílias políticas que, fora das ditaduras dos coronéis, se alternavam no poder, no Pasok e Nova Democracia. Esta regressou agora e não lhe falta o pedigree familiar e a bênção do clero que eram também apanágio do Pasok.
Houve duas surpresas, a primeira, como referi na análise sem a contabilidade eleitoral fechada, foi a recuperação do Syrisa da pesada derrota das eleições europeias com a sua institucionalização como o partido da oposição, apesar de ter frustrado as promessas eleitorais e se tornar um partido social-democrata, ou talvez por isso; a segunda foi o regresso do ex-ministro das Finanças ao Parlamento, após a cisão que o fez demitir-se do Governo e do partido, arrastando numerosos intelectuais e quadros que se tornaram politicamente irrelevantes.
São ainda relevantes a ausência parlamentar do partido neofascista Aurora Dourada e a parca expressão eleitoral do partido de extrema-direita, Solução Grega (10 deputados), a que não será alheia a inclusão de Adonis Georgiadis, como vice-presidente na Nova Democracia, do ex-partido LAOS, conhecido pelo seu antissemitismo.
O Syrisa saiu das eleições em boas condições para regressar ao poder, depois de ter sido vítima da humilhação e crueldade do FMI e da UE, com o vergonhoso apoio do governo Passos/Portas, de ter gerido a crise sem precedentes e assinado um acordo sobre o nome de Macedónia do Norte, pragmatismo que acordou rancores nacionalistas. A atribuição de 50 deputados ao partido mais votado, que já favoreceu o Syrisa, esconde a verdadeira geometria eleitoral de um sistema que parece caminhar para o bipartidarismo.
Aqui ficam os resultados eleitorais para que cada leitor possa tirar as suas conclusões:
Comunistas – 15; MeRA25 (Varoufakis) – 9; Syrisa – 86; KINAL (Movimento para a Mudança, novo partido saído das cinzas do derrotado PASOK) – 22; Nova Democracia – 158 (bónus de 50 deputados); Solução Grega (extrema-direita) – 10.
Finalmente, regista-se a natural urbanidade democrática de Alexis Tsipras que felicitou e recebeu o sucessor Kyriakos Mitsotakis no Palácio do Governo, apertando-lhe a mão, antes de sair, ao contrário do que lhe fez o seu antecessor, Antonis Samaras, também da Nova Democracia, de quem o novo PM foi ministro, que não só não o recebeu, como o seu staff levou canetas, blocos, sabonetes e até o código do WiFi da residência oficial.
Ponte Europa / Sorumbático
Comentários
Trata-se de sobrepor um vago conceito de estabilidade, aparentemente o alfa e o ómega da eficácia governativa, em detrimento da distribuição dos votos expressos que liminarmente traduz a vontade popular. Interessaria saber o que é mais transparente e democrático, se esta tortuosa e enviesada fórmula, se a necessidade de obter - face aos resultados e aos programas apresentados - acordos ou coligações.
Na realidade, nestas eleições, a Nova Democracia obteve (sem considerar o 'bónus') cerca de 1/3 dos assentos parlamentares - 108 em 300 deputados - mas o artificio constitucional permite-lhe governar com maioria absoluta.
Em termos de democracia representativa parece haver qualquer coisa de errado nesta fórmula. Certo que será muito difícil alterá-la - todos almejam vir a beneficiar dela - mas a pergunta que impõe é se considerado o espectro político grego - decorrente do regime instituído em 1974 após o derrube da ditadura militar - esta serve os interesses nacionais ou é uma prosaica partilha entre Direita ou a Esquerda, isto é, uma sequela tardia da ditadura dos coronéis (1967-74) que a III República admitiu para estabilizar o regime.