A Galp, a ética e Luís Montenegro

A aceitação da viagem, em 2016, para um jogo de futebol da seleção nacional, foi uma imprudência de quem a aceitou, talvez ingenuidade política, mas não o foi certamente de quem a ofereceu.

A ética republicana é incompatível com a aceitação de almoços, e o ato de 3 secretários de Estado foi politicamente censurável como, aliás, de dirigentes políticos da oposição a que, então, não foi dado o mesmo relevo mediático. Foi pena que pessoas de excecional competência técnica não tivessem sensibilidade política equivalente.

Exonerados a seu pedido, coube aos Tribunais decidir se havia lugar a sanções penais, mas surpreendeu a investigação tardia de um ato público, amplamente divulgado, mais de um ano depois, e o conjunto de coincidências e paradoxos.

Surpreendeu, sobretudo, por não ter sido apurado o suborno provado pelas autoridades alemãs no caso dos submarinos e a falta de desmentido do desaparecimento dos papéis, bem como o desinteresse sobre 61 mil fotocópias que Paulo Portas levou do ministério da Defesa, quando cessou funções ministeriais. (Pagando-as, claro).

Surpreendeu o contraste entre a vigilância às viagens dos três secretários de Estado e a indiferença sobre a viagem familiar ao Brasil, em jato privado, para uma estadia numa ilha paradisíaca, de um primeiro-ministro a convite do amigo que tinha negócios com o Estado. E, surpresa maior, o generoso anfitrião protagonizaria, a seguir, o escândalo da compra da Quinta da Falagueira, que um partido da oposição denunciou, com o referido PM a referir-se ao amigo, que lhe hospedara a família e lhe proporcionara a viagem em jato privado, por «conhecido»: “É uma difamação estar a pretender que por ser meu conhecido, isso à partida envolve uma participação que não é correta” – disse Barroso.

Se a referida investigação judicial fosse mudança de paradigma, era bem-vinda, e se foi mera coincidência temporal com a campanha orquestrada pela direita salazarenta contra o primeiro Governo de Costa, foi um azar circunstancial.

Se o PR atual, cuja honradez jamais mereceu a mínima suspeita, tivesse comprado ações não cotadas em bolsa e as vendesse com pingues mais-valias, sem apuramento da sua licitude, seria motivo de suspeita.

Incomoda ver enlameadas na praça pública personalidades que se colocam ao serviço do país e raramente se conhecer o resultado dos processos em que foram arguidos.

A Justiça também está sob escrutínio e, agora, pelas elevadas funções que exercem Luís Montenegro e Hugo Soares, respetivamente presidente e secretário-geral do PSD, devia ser tornada pública a sua situação face à deslocação ao referido jogo da seleção nacional a convite da Galp. Basta a Luís Montenegro a ausência de programa, ideias ou projetos para o País, e precisar de apresentar a governação dos Açores como exemplar, para o destruir. Não é justo que uma imprudência menor sirva para o demolir.

Quando se enlameiam políticos com bagatelas penais, exige-se publicidade à decisão que os iliba. Não se pode permitir a judicialização da política do mesmo modo que seria intolerável a interferência do poder executivo nas decisões judiciais.

Basta a progressiva perda de qualidade dos líderes do PSD, que se agravou com o atual avatar de Passos Coelho.



Comentários

Mensagens populares deste blogue

Divagando sobre barretes e 'experiências'…

26 de agosto – efemérides