A democracia e a evolução semântica
Há quem se admire com a presença de 60 extremistas de direita no Parlamento português, 50 abertamente fascistas, 8 da IL e dois do CDS, ressuscitados pelo PSD para os retirar ao Chega, numa deriva reacionária a que não são alheios os partidos democráticos.
Há responsabilidades na falta de pedagogia democrática e na condescendência com a ditadura, inclusive no seu branqueamento.
Quando em 25 de Abril de 1974 foi derrubada a ditadura fascista os próceres do regime, após o susto inicial, fingiram-se democratas até verem chegado o momento da desforra.
Os Pides eram todos escriturários, os bufos extremosos pais que arredondavam o salário com informações sem importância e os juízes dos tribunais plenários excelentes juristas em comissão de serviço para uma promoção mais rápida.
Com o tempo o fascismo converteu-se em ditadura, depois em mero regime autoritário e, agora, perdida a vergonha e a memória, já regougam os crápulas que era apenas um regime diferente, o outro regime.
A guerra colonial passou a guerra do Ultramar e os soldados mortos, vítimas da guerra injusta e criminosa, a «Heróis do Ultramar». Os crimes cometidos contra as forças de libertação de Angola, Moçambique e Guiné são agora ações patrióticas de manutenção de paz, e atos de legítima defesa os assassínios e a tortura policial.
E, assim, numa lenta evolução semântica, o crime virou cumprimento do dever e os seus cúmplices heróis da Pátria.
Foi esta incúria que corroeu a honra, sepultou a memória e conduziu à absolvição dos crimes da mais longa ditadura europeia. Salazar é hoje um crápula de rosto humano, um verme exumado para vergonha de um país que não teve a coragem de o julgar.
Agora, quando morrem os últimos serventuários, a Pátria fica de luto e a honra vai de férias.
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