Recordações…
Há dias estive com o Dr. Guedes Pinto, um velho gastrenterologista a quem a solidão, a idade e a falta de saúde vão arruinando os dias. É uma excelente pessoa, que conheci no exercício da profissão e com quem fui estabelecendo laços de simpatia e estima, que me dói ver na decrepitude que o atinge. É a vida, a previsão do que me pode esperar.
Há cerca de 40 anos tive uma história que a vergonha me devia impedir de contar mas a catarse das cenas ridículas está feita, há muito, na sublimação permanente que aprendi, rindo-me de mim próprio.
Estávamos no velho Hospital da Universidade de Coimbra, à entrada do serviço onde ele prestava serviço. Era um ponto de conversa habitual e o Guedes Pinto um agradável interlocutor. Sob o claustro do antigo convento, não sei do que falámos antes e, a certa altura, já na presença de outro colega meu, o Beto Rebelo, o médico dispara-me:
- Ó Esperança!
- …
- Então no sábado!...
- Ah! – respondi, a ganhar tempo.
- Vai ser memorável…
- Pois…
- Não nos vamos esquecer…
- Não…
- Que jogo!...
- Sim. E respirei de alívio por ter descoberto que se tratava de um jogo. De futebol.
- Há muito que não vemos um jogo assim…
- Pois não…
- São duas grandes equipas.
- Sem dúvida…
- Vai ser um grade jogo.
- Se vai!
- Lá estaremos a ver…
- Claro. E, farto de responder com monólogos, olhando a chuva miudinha que caía no jardim interior do Hospital, resolvi antecipar-me: «O pior é se chove»!
E vi o ar de surpresa do Dr. Guedes Pinto onde transparecia a estupefação clara de quem julgava estar com uma pessoa normal e que – como via –, era um idiota. A cara do Beto, vizinho, colega e amigo, era de desolação. Há muito que ele queria que eu me calasse, conhecia bem a minha ignorância futebolística.
O Dr. Guedes Pinto foi chamado e levou para a enfermaria aquele ar de espanto por ter falado com um indivíduo que julgava normal e, afinal, não regulava bem.
Foi então que o Beto me esclareceu: já previa que metias o pé na poça, quem te manda a ti sapateiro tocar rabecão, não sabes que o jogo de sábado, entre (já não sei que clubes), é na televisão. Joga-se na Dinamarca.
Se contasse todas as cenas ridículas que vieram ter comigo ao longo da vida não parava mais. E ainda não aprendi a prudência que uns têm por virtude e eu por cálculo.
Há cerca de 40 anos tive uma história que a vergonha me devia impedir de contar mas a catarse das cenas ridículas está feita, há muito, na sublimação permanente que aprendi, rindo-me de mim próprio.
Estávamos no velho Hospital da Universidade de Coimbra, à entrada do serviço onde ele prestava serviço. Era um ponto de conversa habitual e o Guedes Pinto um agradável interlocutor. Sob o claustro do antigo convento, não sei do que falámos antes e, a certa altura, já na presença de outro colega meu, o Beto Rebelo, o médico dispara-me:
- Ó Esperança!
- …
- Então no sábado!...
- Ah! – respondi, a ganhar tempo.
- Vai ser memorável…
- Pois…
- Não nos vamos esquecer…
- Não…
- Que jogo!...
- Sim. E respirei de alívio por ter descoberto que se tratava de um jogo. De futebol.
- Há muito que não vemos um jogo assim…
- Pois não…
- São duas grandes equipas.
- Sem dúvida…
- Vai ser um grade jogo.
- Se vai!
- Lá estaremos a ver…
- Claro. E, farto de responder com monólogos, olhando a chuva miudinha que caía no jardim interior do Hospital, resolvi antecipar-me: «O pior é se chove»!
E vi o ar de surpresa do Dr. Guedes Pinto onde transparecia a estupefação clara de quem julgava estar com uma pessoa normal e que – como via –, era um idiota. A cara do Beto, vizinho, colega e amigo, era de desolação. Há muito que ele queria que eu me calasse, conhecia bem a minha ignorância futebolística.
O Dr. Guedes Pinto foi chamado e levou para a enfermaria aquele ar de espanto por ter falado com um indivíduo que julgava normal e, afinal, não regulava bem.
Foi então que o Beto me esclareceu: já previa que metias o pé na poça, quem te manda a ti sapateiro tocar rabecão, não sabes que o jogo de sábado, entre (já não sei que clubes), é na televisão. Joga-se na Dinamarca.
Se contasse todas as cenas ridículas que vieram ter comigo ao longo da vida não parava mais. E ainda não aprendi a prudência que uns têm por virtude e eu por cálculo.
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