Incêndios florestais, debates, inquéritos e ‘ir buscar lã e vir tosquiado’…
Começa a ficar bem explícito o que a Direita quer conquistar ao agendar debates parlamentares sobre os denominados “incêndios de Pedrogão Grande”.
Trata-se, como é já bem evidente, de conseguir a cabeça da Ministra da Administração Interna (MAI). Com essa manobra pretende-se desestabilizar o Governo e, com esse passe de mágica, criar fissuras numa equipa que vem fazendo uma caminhada difícil mas conseguida. É - para o PSD e CDS - imperioso colocar grãos de areia na engrenagem governamental, isto é, tentar encravar a ‘geringonça’.
Constança Urbano de Sousa está no Governo por escolha pessoal do primeiro-ministro e trabalha num sector sensível na governação já que as questões de segurança [individual e coletiva] não são assuntos de somenos importância. Na verdade, o MAI numa situação desta amplitude e trágica dimensão estaria sempre – fosse qual fosse o Governo – debaixo de fogo. Se a Direita estivesse no Poder já sabemos qual seria a resposta às questões que a tragédia levanta: as ‘culpas’ seriam endossadas ao anterior executivo… que seria mecanicamente acusado de ter colocado o SIRESP á beira da indigência e a Proteção Civil na pré-falência e todo um rosário de desgraças (provocados pelos 'outros') para no momento aparecer como ‘salvador’.
A tirada de Nuno Magalhães no debate da AR apelando a que Constança Urbano de Sousa ‘seja ministra’ link revela liminarmente o que a Direita pretende do debate político.
Quando a deputada do PSD Teresa Morais revela a existência de graves insuficiências no apoio médico às vítimas do incêndio e num [suposto] alheamento do Governo no acompanhamento dos sinistrados hospitalizados exibe exatamente aquilo que não deve ser feito. Na presença de um disparar da procura de cuidados da ordem das várias centenas de feridos centra-se num caso isolado (…defender os bombeiros dá dividendos políticos) e, mesmo assim, socorre-se de um relato incompleto e impreciso link.
O drama inerente ao incêndio de Pedrogão Grande não pode ficar dependente de estratégias partidárias, nem de informações avulsas, nem de ‘petites histoires’.
O PSD deveria ter aprendido a lição dos suicídios imaginários e deixar de argumentar com base em especulações ou, o que será mais grave, na inconcebível divulgação de boatos.
É absolutamente pornográfico vir para a Assembleia da República especular sobre um eventual abandono dos feridos (que as informações do Secretário de Estado desmentiram categoricamente) quando o ‘chefe da oposição’ só se dignou visitar o teatro das operações 1 semana depois dos incêndios. A oposição fez-se representar no funeral do bombeiro de Castanheira de Pêra link ao lado da hierarquia institucional do Estado aconchegando-se para a fotografia mas, durante os dias críticos dos incontrolados fogos, esteve ausente e bem longe do teatro das operações.
Na verdade, é cada vez mais evidente que algo (de importante) falhou neste infernal incêndio de Pedrogão Grande. As circunstâncias meteorológicas terão contribuído para o agravamento da situação mas não justificam tudo.
É imperioso apurar – com rigor - o que falhou, quando, onde e porquê. O Estado tem esse dever perante os cidadãos. Todavia, antes de o fazer necessita de apurar as circunstâncias objetivas que terão condicionado o trágico desfecho sucedido.
Há, contudo, circunstâncias políticas que os portugueses não podem ignorar. Quando durante 4 anos e meio os portugueses ouviram o permanente ‘vomitar’ da máxima “Menos Estado, Melhor Estado” começa a fazer-se luz sobre o assunto.
Os cortes no aparelho de Estado (atingindo a sua dimensão e prontidão) diminuíram drasticamente os meios públicos disponíveis para fazer face ao dever de proteção dos cidadãos, mas não têm, necessariamente, um reflexo imediato.
Mais, mesmo que detectados e denunciados (que o foram) seria humanamente impossível, em ano e meio de governação, reverter os sistemáticos e profundos danos causados pela política neoliberal de emagrecimento do Estado, porfiada ao longo de uma legislatura.
Estamos, portanto, em presença de efeitos diferidos das políticas neoliberais aplicadas pelo governo de Passos Coelho.
Seria bom (e politicamente esclarecedor) se o Parlamento se debruçasse sobre as causas remotas, de índole política, dos trágicos acontecimentos ocorridos. Uma comissão de inquérito sobre isso – política de cortes no aparelho de Estado e deterioração das prestações e respostas públicas - talvez tivesse a virtude de elucidar os portugueses acerca de algumas das obscuridades que reinam acerca dos “incêndios de Pedrogão Grande”.
A chicana da bancada parlamentar protagonizada pelo PSD e CDS, na AR, para além de tentar ‘tapar o sol com uma peneira’ poderá acabar por tropeçar no ditado popular: “Ir buscar lã e vir tosquiado”…
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