ELEIÇÕES no BRASIL (II): Divagações em cima do acontecimento…
A República Federativa do Brasil vai hoje a eleições. Simultaneamente, ocorrem vários actos eleitorais (presidente e vice-presidente da Federação, câmara de deputados federais, renovação parcial o Senado, governadores dos Estados federados e assembleias legislativas estatais) que representam um largo âmbito de escrutínio popular, mas a eleição presidencial domina, absolutamente, este cenário.
Os resultados (ainda desconhecidos) devem confirmar aquilo que desde há muito está revelado: o Brasil deve manter-se ‘ingovernável’ e, sendo assim, vulnerável a todo o tipo de corrupções (desde as políticas às económico-financeiras).
Este caudal corruptivo é a moeda de troca para manter a funcionalidade do sistema. Na realidade, uma Federação que tem mais de 35 partidos políticos no terreno e muitos deles com representação nas câmaras de deputados (federais e estatais) coloca o presidente eleito nos braços de uma tácita ‘ingovernabilidade’ já que a sintonia e concertação de políticas e projetos entre os Poderes Executivo (liderado pelo Presidente) e o Legislativo (sediado no Congresso Nacional) é uma sinuosa e confusa barafunda política e ética.
Esta confusão é o terreno fértil onde prosperam os arrivistas, os especuladores, os golpistas e os corruptos.
Quando se observa o espectro partidário brasileiro e se usa como ferramenta de análise as clássicas balizas Esquerda, Centro e Direita (e pontualmente situações extremistas à Esquerda ou à Direita) verificamos a existência uma autentica ‘torre de Babel’ onde dificilmente o cidadão brasileiro conseguirá orientar-se ou encontrar um alinhamento naquilo que é fundamental – o posicionamento ideológico.
Assim o alinhamento ideológico no presente – visto grosso modo – mostra as seguintes matizes partidárias: Direita, 11 partidos (PP, DEM, PR, PSC, PRP, PHS, PTC, DC, PODE, PROS, NOVO); Centro, 9 partidos (MDB, PSDB, PTB, PRB, PV, PSD, AVANTE, PPL, REDE); Esquerda, 9 partidos (PT, PDT, PSB, PPS, PC do B, PMN, SD, PSOL, PMB); Extrema-Direita, 2 partidos (PATRI, PSL) e Extrema-Esquerda, 3 partidos (PSTU, PCB, PCO).
Esta plêiade partidária, donde emergem os 25 partidos representados na Câmara de Deputados, quer autonomamente quer associados em 2 blocos parlamentares, funciona como a base da democracia brasileira mas não deixa de ser a bagunça generalizada.
As candidaturas presidenciais de 2018 (de)correm um pouco à margem deste caótico quadro partidário. Desde o golpe do ‘impeachment’ de Dilma que a base partidária foi profundamente abalada quer pela corrupção generalizada - praticamente transversal a todos os partidos representados no Congresso - quer pelo descrédito popular daí advindo. Criaram-se condições objetivas – um pouco semelhantes às verificadas na Europa nos anos 30 e que desembocaram no fascismo - para aparecerem falsos caudilhos ou aprendizes de ditadores de que o candidato Jair Bolsonaro é um miserável exemplo e um acabado títere dos saudosistas da ditadura.
Por outro lado, o PT (Partido dos Trabalhadores) que desde 2003 até 2016 exerceu a presidência da União deixou-se enredar na opacas malhas de um inacreditável compadrio corruptivo e num insuportável laxismo de contemporização política com ‘liberalidades’ incompatíveis com a sua base ideológica, facto que perturbou (corroeu) a ligação aos pobres, oprimidos e deserdados, historicamente, o seu sustentáculo político-partidário.
Por outro lado, a elite económico-financeira atual aproveitou a oportunidade e para ajustar velhas contas para além do contexto partidário ou, se quisermos, ressuscitando o ancestral ‘partido do Patriarcado’ dos coronéis, jagunços e correlativos que vem dominando, direta ou indiretamente, a política brasileira desde a República Velha, salvaguardando os esconsos e velhos privilégios sociais e económicos dos 'proprietários' (do sistema).
E o meio encontrado foi exatamente um desconhecido parlamentar (até ao impeachment de Dilma), oriundo das casernas que sustentaram a ditadura militar (1964-85) mas, para além disso, conluiado com a corrente neoliberal afeita ao dito Patriarcado (económico-financeiro).
A Esquerda – particularmente o PT que a tem liderado desde o fim da ditadura militar – não teve força para impedir o golpe da destituição de Dilma e não recuperou desse desaire. A resposta da Esquerda não pode ser ‘mais do mesmo’, situação que a candidatura de Lula da Silva - representada por Fernando Haddad - parece estar comprometida. Lula contemporizou demasiado com a elite financeira, tentou gerir um ‘liberalismo económico populista’, com resultados imediatistas e esta clique elitista aproveitou a ‘golpada do impeachment’ para – de conluio com um poder judicial enfeudado e com agenda política - lhe enfiar a faca nas costas.
Segundo tudo indicia que – estamos no dia das eleições ainda sem resultados – os brasileiros vão ser chamados a uma 2ª. volta entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad.
Resta saber se face à eventualidade de um confronto deste tipo o Brasil tem vontade, capacidade ou clarividência para organizar uma ampla ‘frente antifascista’ que arrede os conservadores e extremistas de Direita e salve a conturbada democracia brasileira.
Essa movimentação antifascista não deverá ser a resultante de acordos interpartidários que agrupem a Esquerda e pelo menos o Centro (já que a Direita informalmente poderá estar comprometida com Bolsonaro) já que a fluidez ideológica é relevante e a teia de interesses particulares poderosíssima.
A resposta popular deverá movimentar a sociedade civil (deixando confinada aos quartéis a castrense) e passar pela criação, a todo o vapor, de uma frente democrática, politicamente diversificada e com um vasto denominador comum - antifascista.
Mas neste caso é necessário que o PT seja fiel ao seu passado, mostre que, no presente, aprendeu a lição e compreenda o vasto alcance dessa frente abdicando, para futuro, de atitudes facciosas ou arrufos hegemónicos e não soçobre perante questiúnculas como está a suceder aos ‘tucanos’ do PSDB que, evidenciam ter perdido grande parte da influência que tiveram, depois da ditadura, na política brasileira.
As tarefas que confrontam o Brasil são gigantes e não devem ser ‘concentradas’ num só homem: Para além da necessidade de salvar a democracia será premente reformar todo o sistema político e partidário e promover o desenvolvimento económico e social. O que não é pouco!
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