CGD - 2

A nova Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à Caixa Geral de Depósitos (CGD) aproxima-se muito daquela conhecida expressão: ‘chover no molhado’ link.
 
Todos sabemos que a esta nova versão de CPI nunca apurará se existiu, ou não, influências políticas nas decisões das sucessivas Administrações que conduziram a empréstimos ruinosos, contra os pareceres das comissões de risco e muitas vezes concedidos sem as necessárias garantias. Vamos assistir ao desfile de personalidades do meio financeiro, como mais ou menos idoneidade, todos ‘veneráveis banqueiros’ que, para mal dos nossos pecados, não se lembrarão de nada. O espetáculo habitual nas comissões parlamentares.
 
Restará apurar os quantitativos que os cidadãos tiveram de suportar com as suas forçadas contribuições para ‘salvar’ a CGD. E resta a consolação – triste – de que, neste caso, foi para um banco público. Deste apuramento da situação deverão ser tiradas conclusões. É aqui que residirá o relativo interesse desta nova CPI. Relativo porque o papel que os bancos tiveram na crise que nos afetou estão mais de que apurados, diagnosticados, sem que se tirem as devidas consequências.
 
Mais importante do que a CPI será a investigação conduzida pelo Ministério Público já que, apesar (e para além) de todas as súbitas ‘amnésias’, está à mostra que sucessivas Administrações falsificaram os resultados do exercício financeiro da CGD, escondendo as ditas ‘imparidades’.
Este crime de falsificação salta à vista e não necessita de grandes esforços para encontrar (serão todas as Administrações até 2016) já que estão estampados na escrita oficial desta entidade bancária, publicitadas em relatórios assinados, com a agravante de ser um organismo público.
 
Há diversas questões que a situação vivida na CGD ao longo dos anos levanta e, reconheça-se, merece ser dissecada.
O primeiro deles é o âmbito e o valor do sigilo bancário que parece ser uma ‘vaca sagrada’ mas não o será (pelo menos nas atuais circunstâncias).
Outras questões haverá como a necessária regularidade (periodicidade) das auditorias externas, ou até mesmo das forenses, para estreitar a malha permissiva atrás da qual se têm acoitado os mediadores de negócios, os traficantes de influências e os falsificadores encartados.
 
Muito importante seria resolver (remover) as barreiras onde se emboscam os prevaricadores e os facilitadores para ficarem livres da devolução dos capitais saqueados. Na verdade, os saques efetuados ‘à tripa forra’, na prática, nunca são objeto de um ressarcimento, seja total ou parcial. Deste modo o ‘crime compensa’. E a promiscuidade esconde-se, sempre, sob o pretexto de exceções. No mundo empresarial ou existe um plano de incentivos ou comem todos pela mesma medida. No plano individual as excecionalidades são ainda mais aberrantes.
 
Julgo que o Banco de Portugal (BdP) tem uma ‘lista negra’ de incumpridores, onde não sabemos se estes figurões constam. Ao longo destes anos cinzentos de crise financeira tem havido demasiados buracos negros e múltiplas insuficiências do papel fiscalizador do BdP. Se um cidadão passar um cheque sem cobertura vai para aí (para o índex), mas estes prevaricadores, sejam individuais, sejam empresariais, muitas vezes relapsos, andam alegremente à solta.
Existirá qualquer a razão para tratar um ‘grande devedor’ de modo diferente do que um ‘pequeno’’?
 
Em resumo, do que já sabemos, e sem necessidade de recorre a qualquer CPI, existe um avultado número de questões a merecer regulamentação e muitas outras disposições que carecem de ser revistas e alteradas por manifesta ineficácia.
 
Não se percebe o ruído de fundo que a Direita faz à volta da CGD. Um das razões plausíveis será por se tratar de uma instituição pública. Receio bem que este barulho só termine quando a CGD deixar de existir, ou for privatizada (como a Direita sempre sonhou).

Comentários

Monteiro disse…
Assim se explica porque são os deputados da direita são os mais entusiastas em atacar a CGD acusando até Mário Centeno de não se preocupar muito com o assunto e tem razão o PCP que não apoia estas manobras. Uma coisa fica a pairar no ar e que é o sigilo bancário do qual o relatório foi expurgado. Sigilo Bancário? O que haverá mais que não querem que se saiba? Personalidades envolvidas que não querem que sejam conhecidas? Conversações em curso que poderiam ser perturbadas? Estranho.
e-pá! disse…
Após situações como, p. exº., os 'Panama Papers' o sigilo bancário deveria ter levado a comunidade internacional a discutir a sua pertinência e equacionar o seu âmbito, já que o desenvolvimento de novas tecnologias de comunicação e informáticas alteraram o contexto, digamos, 'tradicional'.

Mesmo países que foram - e em certa medida ainda são - baluartes do sigilo bancário, e alguns até mais além, praças de sigilo financeiro, como a Suíça, Hong-Kong, Singapura, certos Estados americanos (Delaware, Arizona, Nevada,...), entre outras, começam a surgir fendas nessa muralha defensiva criada pelos 'negócios' que serviu para esconder crimes hoje na 'crista da onda', como as fugas ao fisco, o branqueamento de capitais e, sejamos directos, os enriquecimentos ilícitos.

O conceito clássico de que 'o segredo é a alma do negócio' tem um trajecto muito sinuoso, permitiu discriminações, iniquidades mas, acima de tudo, perdeu eficácia.
Na verdade, o negócio há muito que perdeu a alma, ou se quisermos entrar na mística religiosa, vendeu-a ao diabo...

Sendo o sigilo bancário um assunto em aberto - por mais que queiram tirá-lo da praça pública - as tomadas de posição à volta do assunto tem pelo menos uma virtude: definem posições ideológicas dos participantes nos debates que timidamente vão surgindo e, mais, denunciam aqueles que se recusam terminantemente a fazê-lo em nome de 'valores', i. e., como porta-estandartes de um ultraconservadorismo, muito condicionado pelo dinheiro (e pelos interesses fiscais).

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