O desembargador Joaquim e a Justiça
O venerando desembargador Neto Moura, Joaquim, resolveu processar «todos os que o criticaram», segundo se lê hoje na pág. 18 do Expresso, que lhe é inteiramente dedicada.
Não censuro o juiz por querer restaurar a honra que julga perdida pelos comentários que as suas considerações em doutos acórdãos mereceram da opinião pública, sobretudo se a desonra se refere à virgindade ou castidade sexual, o que surpreenderia em quem parece ter tal entendimento apenas referente às mulheres, honra que soía recuperar-se, à revelia da anatomia, com um casamento canónico. Compreendia a suscetibilidade se a sua vida sexual fosse objeto de especulação pública, e não foi. Assim, não terá perdido a honra, apenas a sensatez e, mesmo essa, salvo o devido respeito.
Mas seja a honra o que o juiz entender, nos seus múltiplos significados, o que está em causa é o direito de os cidadãos discutirem a jurisprudência, o que é um dever.
Não é preciso ser jurista para saber que o adultério deixou de ser crime há muitos anos e que confundir pecado e crime, habitual num catequista, é inadmissível num juiz, para legitimar a redução da pena a dois celeradas que sequestraram, humilharam e agrediram uma mulher, com a maior selvajaria.
Surpreendente é sentir que a sua honra foi atingida ao ser qualificado como machista e misógino, duas designações para as quais, na minha opinião, apresentou sólidas razões. E não julgo que seja crime ser-se machista e misógino, embora não seja recomendável.
O que é inaceitável é a mordaça que pretende impor aos portugueses, cerceando-lhes um direito, que não se confunde com a linguagem reles e abjeta que escorre nos esgotos das redes sociais.
Os considerandos dos acórdãos do venerando desembargador Joaquim Neto Moura, que a comunicação social largamente referiu, são inaceitáveis num Estado republicano, laico e democrático. Duvido que alguém seja condenado a reparar-lhe a honra, em euros, por lhe chamar misógino e machista, mas a imprudência em processar figuras públicas, pela justa indignação, não o prestigia. Corre o risco de pôr o país a rir.
Era preferível que substituísse a leitura da Bíblia, onde já é especialista, pela leitura dos 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
O juiz que escreve numa sentença que “o adultério da mulher é um gravíssimo atentado à honra e dignidade do homem” e que “sociedades existem em que a mulher adúltera é alvo de lapidação até à morte”, não merece o respeito que o múnus exige, é ele próprio que atenta contra a honra pessoal e profissional.
Apostila – Lamentável foi o manifesto de um grupo de juízes, na maioria jubilados, a atacarem a condenação generalizada ao exótico acórdão, com o argumento de que as sentenças não podem ser criticadas sob pena de violação do princípio da independência dos juízes. Talvez gostassem de extinguir o direito de recurso, que implica uma crítica à sentença recorrida.
Não censuro o juiz por querer restaurar a honra que julga perdida pelos comentários que as suas considerações em doutos acórdãos mereceram da opinião pública, sobretudo se a desonra se refere à virgindade ou castidade sexual, o que surpreenderia em quem parece ter tal entendimento apenas referente às mulheres, honra que soía recuperar-se, à revelia da anatomia, com um casamento canónico. Compreendia a suscetibilidade se a sua vida sexual fosse objeto de especulação pública, e não foi. Assim, não terá perdido a honra, apenas a sensatez e, mesmo essa, salvo o devido respeito.
Mas seja a honra o que o juiz entender, nos seus múltiplos significados, o que está em causa é o direito de os cidadãos discutirem a jurisprudência, o que é um dever.
Não é preciso ser jurista para saber que o adultério deixou de ser crime há muitos anos e que confundir pecado e crime, habitual num catequista, é inadmissível num juiz, para legitimar a redução da pena a dois celeradas que sequestraram, humilharam e agrediram uma mulher, com a maior selvajaria.
Surpreendente é sentir que a sua honra foi atingida ao ser qualificado como machista e misógino, duas designações para as quais, na minha opinião, apresentou sólidas razões. E não julgo que seja crime ser-se machista e misógino, embora não seja recomendável.
O que é inaceitável é a mordaça que pretende impor aos portugueses, cerceando-lhes um direito, que não se confunde com a linguagem reles e abjeta que escorre nos esgotos das redes sociais.
Os considerandos dos acórdãos do venerando desembargador Joaquim Neto Moura, que a comunicação social largamente referiu, são inaceitáveis num Estado republicano, laico e democrático. Duvido que alguém seja condenado a reparar-lhe a honra, em euros, por lhe chamar misógino e machista, mas a imprudência em processar figuras públicas, pela justa indignação, não o prestigia. Corre o risco de pôr o país a rir.
Era preferível que substituísse a leitura da Bíblia, onde já é especialista, pela leitura dos 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
O juiz que escreve numa sentença que “o adultério da mulher é um gravíssimo atentado à honra e dignidade do homem” e que “sociedades existem em que a mulher adúltera é alvo de lapidação até à morte”, não merece o respeito que o múnus exige, é ele próprio que atenta contra a honra pessoal e profissional.
Apostila – Lamentável foi o manifesto de um grupo de juízes, na maioria jubilados, a atacarem a condenação generalizada ao exótico acórdão, com o argumento de que as sentenças não podem ser criticadas sob pena de violação do princípio da independência dos juízes. Talvez gostassem de extinguir o direito de recurso, que implica uma crítica à sentença recorrida.
Comentários
Colocam-se à parte da vigilância crítica que os sistemas políticos livres foram criando e suportam mal toda e qualquer observação aos seus juízos refugiando-se num conceito de independência que esse poder (judicial)reclama - e bem - mas que não lhes pode conferir particularidades e excecionalidades.
No caso dos titulares do poder judicial mais do que os aspetos curriculares, de trajecto profissional, de carreira o importante é conhecer o conceito humanista que estes magistrados têm acerca do que é - em direitos e em deveres - a(o) cidadã(o).
Esta percepção não pode ser apanágio dos Conselhos Superiores das Magistraturas.
Na verdade, um magistrado que reivindica (e bem) o direito de recorrer das decisões desses Conselhos para os Tribunais superiores, não pode abespinhar-se com o exercício da cidadania dos outros, mesmo nos casos em que possam existir opiniões cáusticas e/ou certos comentários revestirem-se de alguns excessos verbais (fruto de uma aprendizagem democrática em desenvolvimento) e, muito menos, investir contra o humor que algumas situações suscitam.
Seria bom que o Juiz Neto Moura não se confinasse à 'verdade bíblica'. Como afirmava Schopenhauer: "A honra não se ganha, só se perde". E receio bem que...