Bancos, ATM, saques e taxas a granel…

Vários banqueiros retiraram do bolso, nos últimos dias, a hipótese de criar mais uma taxa link . Desta vez o ‘apetite bancário’ que constantemente é exibido à volta de comissões incidindo sobre os depositantes, pretende atingir as operações das caixas multibancos (ATM).
 
Os banqueiros que gerem instituições financeiras - muitas delas intervencionadas pelo Estado durante a última crise financeira -  esgrimiram vários argumentos, entre eles, o estatuto do utilizador-pagador e uma enviesada análise de custos onde, por exemplo, não incluem a poupança de recursos humanos e redução de balcões de atendimento (uma ‘pedra de toque’ de toda e qualquer ‘reestruturação’ dos bancos).  
 
Trata-se - como foi denunciado por várias entidades - de um conjunto de manobras lobísticas para alterar o quadro legal que proíbe especificamente essa taxação e que está explicitamente definido em decreto-lei link. Não interessa aqui repetir as razões de indignação que começam por membros do governo e acabam em associações de defesa do consumidor. Existe uma multitude de argumentos que denunciam a senda de apetites mórbidos dos bancos pela extorsão dos clientes.
 
É muito interessante a evocação pelos administradores das instituições bancárias do instituto de ‘utilizador-pagador’. Seria importante neste item inquirir quem é o utilizador e para quem se pretende endossar o papel de pagador. E esta inquirição nunca poderá esquecer quem é o ‘dono’ do dinheiro embora confiado à guarda de outrem e com que critérios os bancos os movimentam. Estamos fartos de 'liberalidades' e de situações 'mal paradas'.
E como o movimentam (aplicam), p. exemplo, em operações especulativas iludindo os mecanismos de supervisão – os recentes casos de créditos mal parados na banca nacional assim o demonstram - e, por outro lado, quando colhem chorudos lucros os mesmos são distribuídos em dividendos pela estrutura societária das instituições bancárias (sempre muito complexa), excluindo dessa repartição, quaisquer benefícios aos depositantes (os donos do dinheiro).
Aliás, os depositantes só serão chamados à colação em circunstâncias muito adversas, isto é, quando os bancos entram em insolvência e, então, parte dos depósitos (acima dos 100.000 € na UE) vão à vida ou, uma outra opção, a 'proteção dos mercados financeiros' determina a sua ‘salvação’ com capitais públicos (sejam desastrosas nacionalizações apressadas e transitórias, sejam ‘fundos de resolução’) onde os contribuintes acabam por ser esbulhados.
 
Uma outra argumentação diz respeito ao acertar do passo com o que se passa na Europa. Uma falácia total quando não se consegue avançar para uma União Monetária concreta, eficaz e igualitária e quando se sabe que as condições concretas de acesso aos serviços bancários (quaisquer que sejam) são muito diferentes nos países que integram a ‘Zona Euro’ (para circunscrever o âmbito da comparação).
Mais, o nivelamento com a UE só seria compreensível se existisse uma política fiscal comum, o que está longe de ser verdade. Finalmente, os rendimentos dos cidadãos europeus são também distintos para os diferentes povos e, portanto, estas ‘uniformizações à europeia’ só serão aceitáveis quando a Europa atingir um grau de coesão social e económica percetível e visível.
 
Assim sendo a proposta de alteração legislativa com o intuito de taxar as movimentações de dinheiro através dos multibancos é verdadeiramente despudorada e politicamente intolerável.
 
O sector bancário deveria ter algum pudor já que lhe falta tudo o resto. Depois do que aconteceu com a última crise financeira em todo o Mundo, mas particularmente, nos países do Sul da Europa (de que fazemos parte) seria de esperar propostas que configurassem rigor, transparência e equidade no sector. E não a prossecução do esbulho dos depositantes aparentemente justificada por medidas de gestão.
É caso para perguntar se o que se passou desde 2007 até ao presente não é suficiente para refrear ânimos ou se a senda persecutória dos contribuintes (neste caso depositantes) forçadamente transformados em mecenas da banca é para continuar.

Comentários

Manuel Galvão disse…
O consumidor anónimo como eu, só pode fazer sua a indignação do autor deste texto.
Porém, cavando um pouco mais fundo na sua consciência, não deixa de se perguntar como é possível um banco viver pagando dinheiro (a sua matéria-prima) a 0,5% de juro ao ano... (alguém põe dinheiro nos bancos por este rendimento?).
À primeira vista isso só é possível porque o dinheiro deixou de existir, tendo sido substituído pelo crédito. Os bancos abandonaram o negócio de comprar e vender dinheiro, para passarem ao negócio de pedir empréstimos a outros bancos para depois os transmitirem a outras entidades, fracionando o crédito que obtiveram. Passaram a ser intermediários de crédito, isto é, retalhistas do crédito.
Não havendo dinheiro, tudo se resume a transações eletrónicas de crédito e respetiva contrapartida - pagamento de crédito, isto é anulação de crédito -, daí a tentação dos bancos de procurarem outras fontes de receita como por exemplo taxar a "movimentação de dinheiro" feita pelo consumidor final - multibanco -, como negócio adicional.
Os únicos beneficiários do custo zero de transições multibanco são o Fisco e a Polícia, pois é muito importante para eles que haja cada vez menos dinheiro físico a circular.
Se as taxas de multibanco vierem a ser diferentes de zero é lógico que sejam essas duas entidades a suportar esses valores.
De resto a Sibs devia ser uma empresa pública...
e-pá! disse…
Manuel Galvão:

Tem absoluta razão no seu comentário quando questiona o 'circuito do dinheiro' nos dias que correm.

A SIBS (plataforma que gere os pagamentos em multibancos) não é pública por várias razões mas uma, aparentemente, muito simples:
Cada vez mais os bancos aparecem por esse Mundo fora como agências ou entrepostos de 'lavagem de dinheiro' e, para este 'desempenho' cada vez mais visível, necessitam de múltiplos instrumentos de controlo do tráfico ao longo de todo o transito dos valores monetários desde a origem ao consumidor final.
A chave da compreensão de muitas questões monetárias e escândalos financeiros pode ser decalcada dos romances policiais: 'seguir o dinheiro'...

Mensagens populares deste blogue

Divagando sobre barretes e 'experiências'…

26 de agosto – efemérides