A vida partidária e os afetos
Compreendo que a vida partidária, que desconheço, seja um alfobre de afetos e ódios de estimação que fazem perder a serenidade e, sobretudo, a racionalidade.
Há umas semanas li um artigo no Observador, jornal virtual da direita dura, cujo autor é meu amigo, militante do PS e personalidade de mérito, com provas dadas na cultura e na cidadania. O facto de ser, então, facilmente identificado levou-me a aguardar algum tempo para escrever o texto que aqui fica e que irá ler.
Posso perder o amigo, mas ele não me perde. Quem se expõe publicamente sofre todas as consequências da exposição, ele e eu, ele com mais evidência mediática e obrigações partidárias de contenção.
Não me move denegrir o amigo, mas mostrar como um homem inteligente, culto e bem informado, pode ser tão perturbado no discernimento pelos afetos.
O artigo, impecável na forma, é uma desforra intrapartidária em que recordava a vitória autárquica de António José Seguro e referia a «traição» de António Costa. O azedume é notório e o termo ‘traição’ a deformação afetiva de quem não compreendeu a vitória de António Costa, a vitória da social-democracia contra o liberalismo, o regresso à matriz do PS contra a deriva liberal do partido. Esta é a síntese do extenso artigo.
A substância da catilinária é medíocre, é a miopia de grupo ou o afrontamento de quem não digere a derrota merecida, a condescendência do partido social-democrata com uma tendência organizada designada por ‘socialismo liberal’, uma espécie de vegetarianismo do apreciador de leitão à Bairrada, aliás, com um medíocre líder.
Entendamo-nos, a democracia liberal, que ambos defendemos, como a única que exige o sufrágio universal e secreto, a que legitima o Estado de direito democrático, pode ser também responsável pelo liberalismo, socialismo ou fascismo. O que não consente é um partido único, a afronta às minorias, o sufrágio de direitos individuais e o desrespeito pelos Direitos Humanos.
Não me incomodam ideias opostas às minhas nem me sinto detentor de verdades únicas. Já reconheci várias vezes os erros sem ficar abalado nas fortes convicções que perfilho.
O que me surpreende é o sectarismo de quem milita num partido social-democrata, até designado socialista, sem conseguir enxergar os desvios direitistas do liberalismo e, por razões afetivas, não acredito noutras, ter uma cegueira ideológica que o confunde com a direita sem se preocupar em deixar o seu partido refém de uma direita que se outorga o direito de decidir quais os partidos que podem fazer parte do arco da governação.
A razão que me levou a escrever este texto é o receio de que, por razões ideológicas ou afetivas, os militantes do PS o voltem a enfiar no buraco do liberalismo económico e ser coveiros de um partido social-democrata, essencial para a democracia e para o governo.
A distorção da realidade por motivos afetivos é um fenómeno catatímico que a fábula da coruja e da cegonha ilustra, e o adágio “quem o feio ama, bonito lhe parece” sintetiza.
Apostila – O silêncio e ausência mediática de António José Seguro são um caso raro de dignidade e postura ética que merece o respeito e a admiração dos democratas.
Há umas semanas li um artigo no Observador, jornal virtual da direita dura, cujo autor é meu amigo, militante do PS e personalidade de mérito, com provas dadas na cultura e na cidadania. O facto de ser, então, facilmente identificado levou-me a aguardar algum tempo para escrever o texto que aqui fica e que irá ler.
Posso perder o amigo, mas ele não me perde. Quem se expõe publicamente sofre todas as consequências da exposição, ele e eu, ele com mais evidência mediática e obrigações partidárias de contenção.
Não me move denegrir o amigo, mas mostrar como um homem inteligente, culto e bem informado, pode ser tão perturbado no discernimento pelos afetos.
O artigo, impecável na forma, é uma desforra intrapartidária em que recordava a vitória autárquica de António José Seguro e referia a «traição» de António Costa. O azedume é notório e o termo ‘traição’ a deformação afetiva de quem não compreendeu a vitória de António Costa, a vitória da social-democracia contra o liberalismo, o regresso à matriz do PS contra a deriva liberal do partido. Esta é a síntese do extenso artigo.
A substância da catilinária é medíocre, é a miopia de grupo ou o afrontamento de quem não digere a derrota merecida, a condescendência do partido social-democrata com uma tendência organizada designada por ‘socialismo liberal’, uma espécie de vegetarianismo do apreciador de leitão à Bairrada, aliás, com um medíocre líder.
Entendamo-nos, a democracia liberal, que ambos defendemos, como a única que exige o sufrágio universal e secreto, a que legitima o Estado de direito democrático, pode ser também responsável pelo liberalismo, socialismo ou fascismo. O que não consente é um partido único, a afronta às minorias, o sufrágio de direitos individuais e o desrespeito pelos Direitos Humanos.
Não me incomodam ideias opostas às minhas nem me sinto detentor de verdades únicas. Já reconheci várias vezes os erros sem ficar abalado nas fortes convicções que perfilho.
O que me surpreende é o sectarismo de quem milita num partido social-democrata, até designado socialista, sem conseguir enxergar os desvios direitistas do liberalismo e, por razões afetivas, não acredito noutras, ter uma cegueira ideológica que o confunde com a direita sem se preocupar em deixar o seu partido refém de uma direita que se outorga o direito de decidir quais os partidos que podem fazer parte do arco da governação.
A razão que me levou a escrever este texto é o receio de que, por razões ideológicas ou afetivas, os militantes do PS o voltem a enfiar no buraco do liberalismo económico e ser coveiros de um partido social-democrata, essencial para a democracia e para o governo.
A distorção da realidade por motivos afetivos é um fenómeno catatímico que a fábula da coruja e da cegonha ilustra, e o adágio “quem o feio ama, bonito lhe parece” sintetiza.
Apostila – O silêncio e ausência mediática de António José Seguro são um caso raro de dignidade e postura ética que merece o respeito e a admiração dos democratas.
Comentários
Portugal precisaria em 2016 da flexibilidade orçamental de que só dispõe agora, fruto da pandemia, muito embora, convenhamos, o trabalho de Centeno deu margem ao País para poder voltar a aumentar a sua dívida pública.
A Geringonça deriva antes de tudo da abertura do PCP ao apoio ao governo do PS, secundado pelo BE (sem mácula, note-se, tirando talvez a tentativa de entalar o PS com a contagem integral do tempo de carreira dos professores, que custou a eleição a Rio, alimentou a implosão do CDS de Cristas e guindou a IL e o Chega à AR). Dizer que se tratou de um Governo com um programa de Esquerda é manifestamente exagerado.
Por uma vez na História, o PCP aceitou apoiar o seu adversário natural e um programa de Governo com que não concordava, para afastar o espectro da PàF II, que atacava a base sindical deste Partido. Não se pode dizer que os comunistas tenham sido exactamente recompensados nas urnas, seja a nível autárquico, seja nas legislativas. Como o exemplo francês mostrou, o Partido maior acabava sempre a absorver o eleitorado do menor...
O problema da era Seguro era simplesmente que não se vislumbrava que programa o PS tivesse que não fosse a vontade de colaborar com a Direita. Acabaria pasokizado em pouco tempo, e o PCP e o BE nada ganhariam com isso...
Por isso, não concordo consigo. A questão não era a de uma divergência entre liberalismo e social-democracia. Era, pelo lado de Seguro, a da total falta de um programa consistente e de uma equipa de de pessoas que inspirassem confiança.
Seguro até pode ser uma pessoa estimável, mas seria o coveiro do PS... Só posso especular que esse seu amigo decidiu fazer, por despeito, o mesmo que Seguro fez na campanha das primárias de 2014, uma invenção esdrúxula sua, que só beneficiou Costa (tivesse Seguro convocado um congresso, poderia ter ganho), que foi acusar Costa de ligações ao mundo dos negócios, a mesma táctica agora ensaiada por alguma Direita, que dá vontade de rir só pela hipocrisia, dado que eles são o mundo dos negócios...