SIM à Constituição Europeia
A vitória do NÃO francês, que se desenha no próximo referendo, não será a tragédia que alguns profetizam mas é uma forte decepção para os que acreditam na Europa e desejam a vitória do projecto europeu.
Vários factores se conjugam para o resultado cujas consequências são imprevisíveis: a irritação do eleitorado com o Governo, a insatisfação social, a insuficiente laicidade do texto constitucional, a objecção à entrada da Turquia e a hostilidade ao presidente da Comissão Europeia, tolerado pela França e Alemanha, com a bênção da Inglaterra e um currículo onde apenas se destaca o apoio à invasão do Iraque.
Não é verdade que o tratado da Constituição Europeia tenha sido pouco debatido nem que o desconhecimento do seu conteúdo seja geral. Penso que foi menos discutida a Constituição Portuguesa e é bem mais ignorada pelo comum dos cidadãos. Todavia o NÃO parece ser sempre mais apetecível do que o SIM numa vertigem suicida que pode conduzir a Europa à desintegração. Mesmo no aspecto social, que justamente se exige, o texto é bem mais avançado do que o da grande maioria das constituições nacionais.
A paz e prosperidade que a Europa conheceu depois da guerra de 1939/45 pode estar ameaçada por agressivos nacionalismos que a construção da União Europeia foi contendo. As forças adormecidas pelo bem-estar económico e relativa paz social podem ser despertadas para o desvario tribal que não é apanágio exclusivo da região balcânica.
Quando a política externa e a defesa comum deviam estar já a dar passos decisivos, corremos o risco de um retrocesso com danos irreparáveis, arrisca-se o colapso das pequenas economias e o desespero de enormes camadas da população disponíveis para aventuras populistas ou projectos totalitários.
A França sabe que sem ela e a Alemanha não há projecto Europeu viável. Os franceses têm o direito de decidir livremente mas, da sua opção, depende o futuro de um espaço civilizado e culto, depositário dos ideais humanistas e dos princípios democráticos onde milhões de homens e mulheres gozam o privilégio de viver num Estado de direito.
O fracasso do desígnio europeu é a renúncia a um projecto de equilíbrio com a crescente hegemonia americana e a desistência de, num clima de colaboração harmoniosa, conter os aspectos agressivos da política unilateral dos EUA onde se misturam a arrogância e o belicismo com laivos de proselitismo evangélico.
Eu digo SIM à Europa. Estou habituado a perder mas, desta vez, perdemos todos.
Carlos Esperança
Comentários
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Em Coimbra houve magníficos debates com o Vital Moreira, José Reis e Joaquim Canotilho, por exemplo.
A comunicação social tem debatido os temas.
O que é preciso fazer mais?