Inquietantes ventos de Washington…

A mega-manifestação promovida pelo Tea Party, ontem, em Washington – no mesmo local onde Martin Luther King proferiu a histórica frase “I have a dream” – não deve ser desvalorizada.
Ela representa uma organizada tentativa de fazer emergir uma América inquietante, defensora do status quo político, económico e social, enfim, o renascimento de uma América reaccionária, intolerante e mística.

O Tea-Party reage – na proximidade do meio do mandato de Obama e antecipando as eleições intercalares de Novembro próximo – a tudo o que Barack Obama tem de inovador para a política e de motivador para um Mundo em grave crise.
Invoca, para esse fim, valores vagos [fé, esperança, caridade, etc.] que julgam estar no inconsciente colectivo dos norte-americanos e poderem ser o fermento mobilizador para uma cruzada anti-Obama, pior, anti-modernidade.

O comício de Washington, mais pareceu um auto de fé contra Obama [sem nunca explicitamente citar o seu nome] do que uma manifestação política. Por detrás está emboscada a direita ultraconservadora [os citados neocons que tão desastrosamente influenciaram a Administração GWBush].
O retrato desta manifestação pode ser sintetizado numa declaração de um dos seus organizadores e principal orador, Glenn Beck, comentador da Fox News, conhecido pelas suas posições ultra-conservadoras, que afirmou:
"Hoje é o dia em que a América regressa a Deus"…!

De facto, os EUA mostram sérias dificuldades em ultrapassar a crise financeira, económica e social que Wall Street fez explodir na América e cujas ondas de choque atingiram diferentes Nações, por todo o Mundo.
Estas dificuldades internas geram mau-estar social, inconformismos, sentimentos de revolta, a procura de um responsável próximo.
Glenn Beck [o cérebro desta manif] tem razão no êxodo que prevê. Só que a América não regressa a Deus, mas tão somente recolhe-se ao seu ambiente doméstico [ao lar], incapaz de controlar os boys e os boss da Wall Street, humilhada nas aventuras no Iraque, exangue no atoleiro do Afeganistão.
Nenhum destes problemas foi criado pelo actual presidente Barack Obama. Mas os "tea-partys" contam com a má memoria dos americanos e, oportunistas, exploram o imediatismo emocional e os medos que parasitam a actual crise americana e mundial.

A manifestação de ontem pretendeu ser um comício “apolítico” para motivar incautos mas, na realidade, o que conseguiu foi transformar-se numa “celebração apostólica” [...de tanto implorar a protecção divina].

Fica no ar a pergunta levantada por um americano [no Washigton Post] que comemorava [ao lado desta inquietante manifestação] o histórico aniversário do discurso de Martin Luther King [efeméride ignobilmente apropriada pelos neocons...], um histórico lutador pelos direitos cívicos na América:
- "Se não tivessem eleito um presidente negro, acha que estavam a fazer isto hoje?"

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