SEAE ou a necessidade de novo Tratado de Tordesilhas?

O Tratado de Lisboa estipula a criação do Serviço Europeu de Acção Exterior [SEAE].
Passados 8 meses da sua entrada em vigor os 27 ministros dos Negócios Estrangeiros da UE deram o seu aggrement sobre a organização e o funcionamento do SEAE.
A 27 de Julho, o Parlamento Europeu – também de acordo com o determinado no Tratado de Lisboa –, formalizou que, por ora, nada tinha a opôr.

O SEAE, será dirigido por Catherine Ashton [Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança] e deverá estar em pleno funcionamento no dia 1 de Janeiro de 2011.

Até lá começa a “dança dos cargos”, os “jogos de influências”, as “diplomáticas pressões ”, as “compensações enviesadas”, os “discretos favorecimentos”, etc.

Trata-se de um gigantesco Serviço. O SEAE terá um vastíssimo conjunto de funcionários diplomáticos [incluídas as delegações exteriores da UE] que englobará de 6 a 7 mil funcionários. Se juntarmos o pessoal actualmente adstrito às operações de manutenção de Paz [mais 8000 pessoas] e acrescentarmos os cerca de 40 000 militares e polícias, teremos uma incómoda noção de que a EU está a criar uma monstruosa Legião Estrangeira!

Catherine Asthon nomeará os futuros funcionários do SEAE. Um terço destes funcionários provirão dos serviços diplomáticos dos 27 países. Para os novos funcionários [cerca de 4000!] os critérios são vagos e imprecisos – o Parlamento Europeu tem nestas questões um papel consultivo – sendo, ressaltados nos meios europeus, dois equilíbrios: o geográfico e o de género.

As primeiras nomeações deverão ocorrer em Setembro/Outubro do corrente ano. Mas, no topo da hierarquia, já há intensas movimentações.
O indigitado secretário-geral do SEAE é o diplomata francês Pierre Vimont [compensação pela saída de Jean-Claude Trichet do BCE?].
Como adjuntos terá uma diplomata alemã [Helga Schmid] e um político polaco [Mikolaj Dowgielewicz, antigo membro da Comissão Europeia e actual secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros polaco]...
Mas as pré-nomeações não ficam por aqui. O próximo embaixador da UE em Pequim - um cargo do maior relevo em termos económicos – caberá a um político e/ou diplomata alemão…etc.

Bem, quanto a Portugal – no meio deste esquartejar do “monstro” - não sabemos se o nosso País terá alguma posição relevante no que diz respeito às relações da UE com África ou com a América do Sul, mas sabemos que concorrentes a estas posições não faltam.
A África, um dos nossos destinos históricos, será com certeza objecto de acessa disputa [ou repartição] entre a França [peso da África francófona] e a Inglaterra [sobrevivência da Commonwealth].

Mas a situação apresenta ainda outras nuances: A França, a Grã-Bretanha, a Itália, a Alemanha – para citar os países mais visíveis não vão – de imediato – extinguir a suas redes diplomáticas. Antes disso esperarão que a UE demonstre a sua capacidade na gestão dos negócios no exterior. E mesmo que a acção do SEAE venha a mostrar-se eficiente, países como a Alemanha não descuidarão as suas particulares relações com os Países de Leste, bem como a Inglaterra em relação aos EUA.

Mas o SEAE, apesar de uma pesada máquina montada, parte para uma aventura sem que a UE tenha previamente definido um modelo de governação económica e uma política monetária. Estes dois pressupostos definem, na prática, toda a actividade diplomática.
Mas, mais acutilante, é sabermos que toda a acção do SEAE nasce com um inultrapassável parti pris – não existe o mínimo consenso sobre uma política exterior [comum] europeia.

Os milhares de funcionários – sem uma rede consular de suporte no terreno e sem programa político comum – estarão, pontualmente e exclusivamente, nos destinos estratégicos, ao serviço das grandes empresas europeias, das holdings, dos cartéis, etc. A SEAE, enquanto braço diplomático da EU, nomeadamente, nos actuais tempos de crise, viverá sob o espectro de não criar conflitos entre os 27 estados membros. Desenvolverá um política de caldos de galinha e cautelas que pode, a breve trecho, conduzir a uma total inoperacionalidade.

A criação do SEAE não deveria ser uma simples emanação do Tratado de Lisboa, mas antes o prelúdio de um outro Tratado. Um Tratado de Tordesilhas do séc. XXI!.

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