Associação Ateísta - COMUNICADO OE_2011

COMUNICADO - Benefícios fiscais à ICAR

A Associação Ateísta Portuguesa (AAP), na sequência da separação constitucional do Estado e das Igrejas e na defesa da laicidade daí decorrente, nunca se conformou com os benefícios fiscais concedi-dos em 1990 à Igreja católica e a sua extensão em 2001 às instituições religiosas não católicas e às instituições particulares de solidariedade social (IPSS), instrumentos de poder e de financiamento habi-tualmente ao serviço das diversas confissões religiosas.

Perante a crise em curso, a proposta de Orçamento do Estado (OE) de 2011 pretende retirar – e bem – os benefícios fiscais, que jamais deviam ter sido concedidos, às instituições religiosas não católicas. O que deixa a AAP perplexa e indignada é que se mantenham ainda os benefícios fiscais que privilegiam a Igreja católica.

Mantendo esta situação injusta e injustificável, o Governo acrescenta à deplorável genuflexão perante a Igreja Católica a discriminação para com todas as outras confissões religiosas. A injustiça ganha agora geometria variável, com o Estado laico a usar poder discricionário a favor de uma das confissões que disputam o mercado da fé, sem respeitar dois princípios constitucionais: o da igualdade e o da separação entre o Estado e as Igrejas.

A AAP acompanha no espanto e indignação todas as confissões religiosas não católicas e comunidades religiosas radicadas no país, bem como os institutos de vida consagrada e outros institutos que a pre-vista revogação dos artigos 65º da Lei de Liberdade Religiosa e 2º do Decreto-Lei n.º 20/90 remete para uma situação de desigualdade. É inadmissível que a proposta do OE 2011, pedindo tantos sacrifí-cios a todos os portugueses, ainda assim mantenha o Estado obrigado «à restituição do imposto sobre o valor acrescentado correspondente às aquisições e importações efectuadas por instituições da Igreja Católica», para fins religiosos, ao abrigo do Artigo 1º do Decreto-Lei n.º 20/90, cirurgicamente pre-servado nesta proposta.

Assim, a AAP reivindica a revogação do Decreto-Lei nº 20/90, pondo fim aos benefícios fiscais con-cedidos à Igreja Católica e repondo a igualdade não só entre as confissões religiosas mas também a igualdade entre todos os cidadãos, sejam leigos ou padres, deixando aos crentes o ónus da sustentação do culto sem o fazer recair sobre todos os que não se revêem nessa religião: ateus, agnósticos, cépticos e crentes de outras religiões a quem não cabe custear o proselitismo da religião que se reclama dominante.

Associação Ateísta Portuguesa – Odivelas, 25 de Outubro de 2010

Comentários

e-pá! disse…
De facto, é intolerável como o Estado a partir de uma tomada de posição em que reafirma a sua postura laica enverede para uma atitude discriminatória, ao arrepio do cumprimento estrito dos preceitos constitucionais, a que está obrigado.

Na verdade, parece ter-se instalado uma perniciosa confusão [de princípios] entre o exercício do poder e a arbitariedade de concessão de benesses e benefícios [que não se restringem à esfera religiosa...], o que é fatal para a credibilidade do regime democrático, já que, essas atitudes políticas, ferem profundamente o conceito de Justiça e maltratam o princípio da igualdade entre os cidadãos.

Se o período de austeridade que estamos a viver, no terreno orçamental estimula a arrecadação de receitas, então deve determinar o fim de injustificáveis isenções [privilégios] de indole fiscal atribuídas a associações religiosas, que atentavam - há muito tempo - contra a regra da separação entre a Igreja e o Estado, no respeito pela Lei de Liberdade Religiosa.
A excepção da aplicação desses princípios à ICAR , torna-se, se for levada por diante, numa grave injúria ao Estado democrático.

Na realidade, o Poder necessitando de exigir e movimentar-se - perante TODOS os portugueses - na salvaguarda da equidade, justiça e universalidade no campo fiscal , não pode, por motivos de contabilidade politico-eleitoral, isentar quaisquer associações, instituições, fundações ou quejandos, por maior influência política que detenham.
As isenções poderão [e deverão] existir no campo da solidariedade e da justiça social [no Estado Social], e estão definidas, à minima, no regime contributivo em vigor e nas leis que regulam a segurança social.

A medida inscrita no OE/2011 visando "excepcionar" a ICAR não trilha o caminho da dignidade política. É um piedoso e caritativo arremedo que fere profundamente a noção de cidadania.
Mais, são meras presunções tácticas, que nada têm a ver com a coisa pública e os cidadãos devem tratar os seus promotores como oportunistas políticos, despidos de qualquer tipo de ética republicana.

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