G-20 / HAMBURGO 2017
A cimeira dos 20 países mais ricos do Mundo tem suscitado violentas reações populares, diversificadas e simultaneamente congregantes de amplos espectros da Esquerda europeia, mas o denominador comum ‘antiglobalização’ que colocou Hamburgo a ferro e fogo tem um longo caminho para fazer.
Não existe uma ‘estratégia mundial para o desenvolvimento’ que ultrapasse as quezílias de uma competitividade manhosa à custa de uma produtividade escabrosa. Estes encontros são acima de tudo fóruns de relacionamento internacional onde aqueles que detêm poder - oriundo das suas condições e particularidades económicas e financeiras – posam para o retrato oficial, trocam apertos de mãos e ensaiam novas estratégias para consolidar as suas hegemónicas posições.
Apesar de uma diversificada participação que congrega diferentes tipos de regimes não existe coesão nem qualquer critério seletivo para além da capacidade económica e financeira.
Assim, vemos sentados à mesma mesa representantes de uma monarquia confessional e medieval (Arábia Saudita), um neocalifado (Turquia), de federações liberais (EUA) à mistura com outras autocráticas (Rússia) e até de um regime oficialmente comunista (China). Pior, existem vários gradientes e níveis de participação e podemos ver uma representação (federal?) da UE, secundada pela da Alemanha, França, Itália e Reino Unido (de saída da UE).
Difícil é alijar toda esta variedade participativa do ‘colete-de-forças neoliberal’ onde pontificam questões como: desenvolver ‘livremente’ a circulação dos capitais; promover um mercado de trabalho ‘flexível’; ‘cartelizar’ políticas energéticas, manobrar o mercado das commodities; ‘glorificar’ as privatizações; ‘domesticar’ e ‘recanalizar’ os investimentos; promover a ‘desregulação’ dos mercados financeiros e o incensar global livre comércio (malgré Trump).
Claro que todo este amplo encadeado de vetores e fatores necessita de ajustes periódicos. Mas essa tarefa não está nas mãos nem nas cabeças dos líderes mundiais. Quando muito será um trabalho diplomático e técnico das delegações.
Para os líderes políticos as cimeiras do G-20 servem – entre outras coisas - para promover contactos bilaterais. As sessões fotográficas dos apertos de mãos nos bastidores ilustram isso mesmo.
Questões pertinentes e urgentes como a da Coreia do Norte, o problema da guerra civil síria, a galopada terrorista, as migrações massivas, etc. são tratadas à parte do concerto das nações.
Entre as 'outras coisas' que acima alvitramos estas cimeiras servem também para promover negócios (públicos e privados) e a recente participação de Trump terá reforçado esta componente.
Nestes encontros evidencia-se uma situação de redundância. Existe, desde o final da II Guerra Mundial, um fórum próprio, mais universalizante, logo mais participativo para tratar muitos dos problemas que foram alocados ao G-20. É a ONU mas a prática (reiterada) manifesta-se absolutamente pela inversa e determina deslocalizações geo-políticas e decisórias rotativas ao sabor de uma agenda desconhecida.
E o Mundo assiste à aflição do Secretário-Geral da ONU ao necessitar de ir ao encontro do G-20, tentando não perder o comboio.
Verifica-se que as cimeiras dos G-20 tendem a substituir o Conselho de Segurança da ONU por um ‘coletivo mundial’, fora de qualquer escrutínio organizativo e cidadão.
Os 'sentimentos antiglobalização’ crescem dia a dia e, ao contrário do seria esperado, não provêm dos países mais ‘sacrificados’ (por exemplo Grécia, Portugal, estados africanos e asiáticos, etc.) que não estão aí representados e observam esta ‘paisagem’ de longe. A ‘onda antiglobalização’ cresce porque a economia global não está em sintonia com um ‘desenvolvimento global’.
E de concreto a cimeira do G – 20 acabou por reconhecer a incapacidade de elaborar um comunicado final consensual já que as lideranças publicam um documento incidindo sobre as alterações climáticas, definidas no acordo de Paris, mas são obrigados a sublinhar a opinião contrária da Administração Trump. É quase a transposição do ‘direito de veto’ para este contestado fórum.
Pior: o comunicado final ignora as ‘questões do protecionismo’ alavancadas pela eleição de Donald Trump que perturbam assustadoramente o ambiente político internacional e que se acumulam com questões matriciais (do capitalismo) como seja o crescente e progressivo aumento do fosso entre países ricos e pobres, a selvática dominância política dos consórcios económico-financeiros multinacionais, a progressão de um saque descontrolado às riquezas naturais e a compressão progressiva dos direitos humanos.
Hamburgo 2017 faz lembrar o quartel-general em Abrantes onde, perante a ameaça dos invasores, tudo deveria continuar como dantes…
Comentários