Notas Soltas -- Junho/2018
Itália – A posse
do primeiro-ministro de compromisso, inexperiente e com referências académicas
falsas, entregou o poder aos dois vice-presidentes, um do partido populista,
outro de extrema-direita. Talvez o poder impeça o pior, de que ambos são
capazes.
Espanha – Pedro
Sánchez tornou-se PM, numa cerimónia presidida pelo rei Felipe VI, e dispensou
a Bíblia e o crucifixo, gesto inédito em 40 anos de Estado laico. Foi um ato de
respeito pela laicidade, símbolo republicano e democrático.
Brasil – A
paralisação do país com veículos pesados, injustamente designada por greve dos
camionistas, foi uma provocação dos proprietários que, com descarado impudor,
apelaram à restauração da ditadura militar.
Ucrânia – O
Estado simula o assassinato de um espião e acusa o suspeito do costume, a
Rússia. Esta desmente, a UE solidariza-se contra a Rússia, e o presidente
declara que foi genial o embuste. O PR aldrabão é perdoado e a UE engole a
humilhação.
Marques Mendes –
O Conselheiro de Estado, comentador avençado, faz a síntese entre os interesses
do PSD e a vontade de Belém, num equilíbrio difícil em que o adversário, além
do Governo, é Rui Rio, detestado por Passos Coelho e sem a simpatia de Marcelo.
Comunicação Social
– A comparação do Governo de Espanha com o português, sendo o PSOE muito mais
frágil do que o PS, é a esperança da direita portuguesa para, após a eventual
queda, se for rápida, criar o alento que lhe falta.
Cimeira de G7 – O
homem capaz de destruir o mundo com o dedo no botão nuclear, e não é único,
conseguiu arruinar a confiança entre os Estados Unidos e a Europa, quando
removeu, com um tweet, o apoio ao acordo final da cimeira de G7, no Canadá.
Paulo Pedroso – O
ex-governante e deputado, preso com a TV a filmar a afronta à AR, não foi
julgado. Não havia provas. O Tribunal Europeu (TEDH) criticou a decisão do juiz
e condenou o Estado Português, mas não há reparação possível para a humilhação.
Lula da Silva – O
candidato brasileiro, preso por um juiz militante partidário, impedido de
vencer as eleições presidenciais, viu a Justiça
vetar-lhe a visita do assessor do Papa, um choque para os defensores dos
direitos humanos e religiosos.
EUA – Enganam-se
os que pensam que Trump, por insuficiência ética e política, estará condenado a
fracassar. Enquanto dominar o meio de pagamento internacional, o US$, e
dispuser de hegemonia militar, o mais imbecil PR os EUA, tem as vitórias
asseguradas.
União Europeia –
A ausência da integração económica, social e política, conduziu-a à
irrelevância e abriu caminho ao despertar da extrema-direita, enquanto a tenaz
Rússia / EUA a coloca à mercê de forças que querem redesenhar fronteiras e
arruinar o euro.
Argentina – O
Parlamento aprovou finalmente, por parca maioria, a IVG, depois de as ruas lhe
terem conferido ampla aceitação. Falta agora a confirmação do Senado no país
que impedia a autodeterminação sexual da mulher e o seu direito à saúde
reprodutiva.
Cimeira de Singapura
– A reunião de dois líderes que desprezam os direitos humanos, foi um
espetáculo sem conteúdo, com Trump a encenar a vitória, a desnuclearização da
península coreana a manter-se improvável e a China, ausente, a aguardar
dividendos.
Donald Trump – A
sedução por Kim é coerente com a que nutre por Putin, Erdogan, Viktor Orbán ou
Duterte, e à simpatia revelada por Le Pen e todos os racistas europeus,
enquanto hostiliza as democracias da UE e do vizinho Canadá, velhos e fiáveis
aliados.
Espanha_2 – O
novo governo, com um elenco de maioria feminina e assaz competente, montou a
maior operação humanitária de sempre para acolher refugiados rejeitados, e
trasladará os ossos de Franco para converter o Vale dos Caídos em museu da memória.
Turquia – O
Governo usa as prerrogativas do estado de emergência para encarcerar os
opositores, encerrar associações e silenciar a imprensa, na crescente deriva
autoritária onde bastam denúncias de vizinhos para conduzir à prisão os
adversários de Erdogan.
Imigração – O
exemplo mais indigno vem do presidente dos EUA, inculto e amoral, ao separar
crianças dos pais, muitas já sem paradeiro conhecido, transformando os
infelizes em órfãos da Casa Branca. A vileza e a insensibilidade estão à altura
do autor.
Hungria – A
criminalização de qualquer ajuda a imigrantes ou refugiados foi a última medida
de um governo de extrema-direita, que punirá com prisão a mais leve ajuda de
natureza humanista, numa provocação à cultura e civilização europeias.
PSD – O grupo
parlamentar, de Relvas, Marco António e Passos Coelho, é oposição ao Governo a
reboque do CDS, e a Rui Rio, eleito pelos militantes, por vontade própria. O
líder, insuspeito de corrupção, é a ameaça que muitos temem.
Arábia Saudita –
A autorização às mulheres para conduzirem automóveis e acederem a estádios de
futebol representa um perigo para o Islão. Qualquer dia é interdito lapidá-las
ou, simplesmente, chicoteá-las, e os homens serão impedidos de as comprar aos
pais.
Javier Solana – O
distinto diplomata e político, ex-secretário-geral da Nato (1995/99) e Alto
Representante da Política Externa e Segurança da UE (1999/2009) foi impedido de
entrar nos EUA, por causa das novas regras de imigração da administração Trump.
Santana Lopes – O
ex-PM, que Passos Coelho quis ver na liderança do PSD, pretende fundar um novo
partido. O Governo sentirá a falta deles para manter a coesão do apoio
parlamentar que o sustenta, de que qualquer deles era uma sólida garantia.
Comentários
A crise migratória terá atingido em Junho, no espaço europeu, o pico da atualidade política.
As 'plataformas' no Norte de África ou até as internas (nacionais) propostas no último Conselho Europeu - muito próximas dos 'campos de concentração' de má memória - revelam que o Velho Continente ainda não digeriu - ou está a fazê-lo mal - o período 'pós-colonial'.
Quando se procura por onde passam as linhas de fissura presentes e se compara essas fraturas com a história das velhas potências ( imperiais, coloniais ou ambas) começamos a entender o percurso presente com base no roteiro passado e as opções que informam uma Europa historicamente diversa.
Entre uma Europa do Sul essencialmente tributária do 'arco mercantil Mediterrânico' e maioritariamente 'colonialista' e uma Europa do Norte enfeudada ao desenvolvimento industrial está uma Europa Central vitima predileta (ensanduichada) das (pelas) hegemonias imperiais (ou sacro-imperiais).
Esta diversidade está a acentuar-se, a escavar o terreno e a fomentar profundas dissensões no espaço europeu.
No passado estas questões acabaram resolvidas por 'manu militari'.
Esperemos que, no presente, surjam outras soluções (...mais pacíficas).